Ceará prepara plano de retomada da economia pós-Covid, diz Maia Júnior; confira entrevista
Titular da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Estado fala sobre planos para alavancar a economia Ceará, destacando a importância de melhorar ambiência de negócios e de reter capital humano
Enquanto o cenário macroeconômico ainda está no olho do furacão provocado pela pandemia de Covid-19, o Governo do Estado está finalizando os últimos detalhes de um plano para alavancar a economia do Ceará. O projeto vai se somar às medidas já em vigor de apoio ao setor produtivo, que inclui parcelamento de dívidas, isenções de taxas e outras facilidades para os segmentos mais afetados
Segundo o titular da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Estado do Ceará (Sedet), Francisco Maia Júnior, entrevistado desta semana do Diálogo Econômico, além do plano de retomada, o governo negocia a formação de um quinto e até um sexto hub no Ceará, além dos quatro já anunciados (aéreo, portuário, de telecomunicações e, mais recentemente, de hidrogênio)
Com todas essas inciativas implementadas, a ideia é que o Produto Interno Bruto (PIB) cearense cresça ao ritmo de 4% e 5% ao ano, o que promoveria uma mudança econômica robusta no Estado. "Quero ver um Ceará mais rico, mais justo e que dê oportunidade a todos", diz Maia Júnior.
Com esse objetivo em mente, a pasta de Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Estado passa por intenso processo de modernização e foca em melhorar a ambiência de negócios e a infraestrutura da região. Outro ponto que Maia destaca ser essencial é a retenção de talentos para atuar em uma série de cadeias econômicas a serem desenvolvidas no Ceará, que exigem alto nível de qualificação.
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Confira a entrevista completa:
O Governo do Ceará vinha apostando no turismo para o desenvolvimento socioeconômico do Estado. Quais devem ser os efeitos da pandemia sobre essa estratégia?
Bem, em primeiro lugar é importante colocar que o turismo e sua cadeia foram duramente impactados pela pandemia em função de um ponto que é fundamental no processo de gerenciamento dessa crise. Tratam-se de áreas com um potencial de aglomeração muito grande. É uma área em que nós vínhamos com um bom desempenho.
É um setor que, retomando a normalidade, e logo que o grupo gerenciado pelo governador faça a liberação dessas atividades, os secretários da área, no caso o do Turismo, Arialdo Pinho, têm uma programação de retomada. O secretário do Turismo é quem vai coordenar esse plano de retomada do setor, assim como será na área de Educação, que é um tema que tem também uma participação importante na economia do Ceará.
Foi feita uma avaliação com o grupo técnico do Estado, por determinação do governador, e nós preparamos um plano de retomada pós-Covid. Esse plano se somará a esse processo de gestão do governador para a retomada econômica e se às medidas já adotadas na área econômica de apoio ao funcionamento e normalidade das empresas.
Bem, além disso, nós fizemos planos. A Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará) também se planejou para que a gente pudesse, dando continuidade aos planos de governo do Ceará Veloz, fazer uma completa reestruturação da Sedet (Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho) e de suas atividades para implementar uma política econômica de maior vigor e crescimento. Nós já ajustamos isso.
Essa proposta foi entregue ao governador em julho do ano passado, foi aprimorada e aprovada pelo governador em dezembro para que a economia do Ceará possa retomar com mais força após controlada a pandemia - porque eu não acredito particularmente no fim da pandemia durante muitos anos. Nós teremos algum controle com a vacina, mas encerrar esse processo vai depender muito da ciência nos trazer outras soluções.
Esse plano está pronto. Nós estamos agora dependendo da devolutiva da Fiec. Em janeiro, estivemos com o presidente da Fiec (Ricardo Cavalcante), fizemos uma apresentação e já colocamos para as entidades produtivas. Eu estou coordenando a parte que se refere ao empreendedorismo e às políticas de trabalho e à área de inovação, que trabalhamos com o secretário Inácio Arruda.
Temos nesse plano a área tributária e fiscal, que contará também com umas mudanças de caminho e alguns ajustes para que a gente possa retomar com uma economia mais robusta. Dentro do nosso planejamento, identificamos onze clusters econômicos como prioritários. E recentemente o governador incluiu mais um, que foi o hub de hidrogênio verde.
Haverá o anúncio do plano após fecharmos um consenso entre aquilo que é comum para as entidades produtivas e a nossa obrigação comum para desenvolver o Estado. Assim que chegarmos a esse consenso, a ideia é lançarmos esse trabalho através do governador e dos presidentes das entidades.
O senhor mencionou que esse plano traz uma espécie de mudança em alguns caminhos para termos essa retomada. Quais são essas mudanças? Tem algum projeto que vinha sendo desenvolvido e que passou a receber mais ou menos atenção diante dos impactos da pandemia?
Uma das principais mudanças dessa proposta para desenvolver o Ceará melhor e mais rapidamente são primeiramente oriundas das recomendações de alguns trabalhos que foram realizados no Estado.
É o caso do Rotas Estratégicas, da Fiec, do Ceará 2050, que é um planejamento para os próximos 30 anos, e de um trabalho que nós contratamos na Sedet com uma consultoria internacional de Portugal, operação esta que deu origem ao Plano de Governo Ceará Veloz, que ainda estamos ajustando.
Então todo o plano do Ceará Veloz continua e vai ser incrementado. Por exemplo, nós redesenhamos as políticas de incentivos fiscais do Estado. Deve sair um novo decreto para ajustar essa política de incentivo.
O outro ponto é que os clusters econômicos foram mantidos. O Ceará vai trabalhar 11 cadeias econômicas para o seu desenvolvimento econômico. Algumas você até já falou, como é o caso do turismo, que a gente precisa aprimorar ainda mais, retomar as atividades depois da pandemia.
Em algumas cadeias, como é o caso de calçados, couro, têxtil e confecções, nós também estamos propondo uma reprogramação para que se tornem mais competitivas. Mas temos áreas novas como saúde, logística, temos os três hubs; tecnológico, portuário e aeroportuário, incluímos o décimo segundo cluster, que é o hub de hidrogênio, temos a cadeia de recursos hídricos, a área de telecomunicações e Tecnologia da Informação, para elencar aí algumas áreas importantes.
Temos também o olhar para a ambiência de negócios e tem várias intervenções como a desburocratização e simplificação de processos para facilitar o ambiente. Nós estamos digitalizando toda essa plataforma e modernizando, não só secretarias e vinculadas, mas todos que fazem parte do desenvolvimento.
Um eixo importante é a infraestrutura do Ceará, que ainda possui um grande desafio no saneamento básico, e cuidar da garantia de recursos hídricos, porque tanto a água é fundamental garantir, como a energia. Não se faz desenvolvimento sem que tenhamos uma boa oferta de energia com garantia de segurança hídrica.
A infraestrutura é um segundo capítulo, depois da ambiência, e é um tema que está sendo muito trabalhado para que o Ceará tenha realmente um ambiente atraente para os negócios.
Outro ponto é a nossa rede de educação, tanto do ensino básico, como do ensino profissionalizante e a pesquisa nas universidades. A pesquisa é um ponto importante para fortalecer a nossa economia, por meio do capital humano. É importante formar gente para atrair e reter os nossos talentos, melhorando a nossa competitividade. Estamos trabalhando muito fortemente nisso.
Não vai haver desenvolvimento sem uma boa ambiência, com transparência, governabilidade, com uma boa gestão econômica. Não vai haver desenvolvimento sem infraestrutura, como também não vai haver sem capital humano. E, por fim, é preciso toda essa rede de inovação e tecnologia. Isso compõe toda uma nova estruturação para que o Ceará possa realmente consagrar um desenvolvimento econômico mais rigoroso.
Outro ponto importante, que está praticamente pronto, foi toda a modernização conceitual e de programas do governo do ponto de vista de montar uma estrutura de secretarias capaz de, não só implementar, mas ser instrumento facilitador de promoção e atração de novas empresas que vão fortalecer o desenvolvimento do Estado.
Nós teremos uma mudança do ponto de vista físico. Ficaremos no mesmo ambiente da Secretaria do Turismo, com uma mudança para o Centro de Convenções. E aí será uma plataforma física única na qual o empresário que precisar tratar com a Secretaria e suas vinculadas o fará de uma única forma, que será nessas novas instalações. Além da estrutura toda da Secretaria, vai estruturar no mesmo ambiente as seis empresas vinculadas que compõem o sistema: Adagri, Adece, Jucec, ZPE e Cipp, com um escritório, e o IDT, também com um escritório.
Isso está previsto até julho, assim como estamos trabalhando fortemente na completa revitalização da secretaria e de suas vinculadas, talvez a mais importante dos últimos 30 anos. Crescemos bem nos últimos 30 anos, como preconiza o Programa Ceará 2050, então nós queremos ter a continuidade dessas políticas e de outras para que o Ceará realmente possa ter 30 anos novos bastante virtuosos. Esse é o foco.
A Adece agora possui esse perfil mais voltado para a base da pirâmide, um olhar para os micros e pequenos empreendedores e informais. Como o senhor avalia o impacto dessa mudança da Adece e qual é a importância disso diante do contexto pandêmico?
Com essa nova Adece, nós vamos também olhar para as empresas menores. E vamos olhar fortemente, até porque no Ceará são em torno de 2 mil médias e grandes empresas e 598 mil são registradas como pequena e microempresa ou como Microempreendedor Individual. O microcrédito vai atender a esse público: MEIs formais ou não-formais, desalentados. É atuar nos mais pobres. Levar recursos, crédito, que a Adece por lei não tinha nem como fazer isso, já que ela não era uma agência de fomento.
A Adece anterior tinha uma sombra muito grande do Codece, que foi desincorporado. Nós limpamos isso, agora é cada macaco no seu galho. Cada um tem decidido agora o seu papel e ninguém faz o papel um do outro. A Adece incorporou completamente o Codece e, com isso, ela neutraliza alguém do governo fazendo o mesmo trabalho dela.
A agência vai agora fomentar as atividades econômicas nesses três níveis da pirâmide, como também em todos os segmentos de atividades. E a secretaria é a regente das políticas públicas. É quem direciona. É quem recomenda à equipe para onde tem que ir o desenvolvimento econômico do Estado.
Nesse redesenho, esse é o papel da secretaria: formular projetos, fazer junto às empresas a atração e promoção de investimentos e auxiliar o crédito além das instituições bancárias através da Adece, que também vai buscar parceria para operar programas do BNB, do BNDES e dos bancos como Caixa Econômica. E de quem queira trabalhar fomentando a economia.
A Adece ganhou uma diretoria de fomento para o micro e o pequeno empresário, o médio e o grande empresário, e uma de Economia Popular, que aí vai operar o Ceará Credi. É uma inversão enorme, porque a secretaria vai olhar outras atividades e outros setores econômicos importantes e que precisam de apoio do Estado para se desenvolverem e gerarem emprego.
Para concluir esse trabalho de redesenho falta lançar apenas os ajustes a esses planos e o novo decreto de financiamento às médias e grandes empresas, dos incentivos fiscais no Ceará. Essa ação também traz, e isso está na Fiec, o trabalho que fizemos com o BNDES para garantir financiamentos auxiliares para o desenvolvimento econômico público e privado, para financiar projetos importantes.
A ideia é lançar esse novo plano conjuntamente com o novo decreto que aí vai contemplar as médias e grandes empresas. Ainda precisamos entrar em consenso com a Fiec e também nós vamos sentar com o BNDES como um instrumento importante na vida do cearense.
A gente pretende, com isso, ter uma injeção de recursos de crédito aos empreendedores para que eles possam empreender no Estado. Estamos concluindo esse entendimento com a Fiec para concluir toda essa nova arquitetura.
E aí nós vamos avaliar o desenvolvimento dessas mudanças, que vão atrair bons investimentos para o Ceará e vão ser boas para que o empreendedor venha para o Estado como prioridade. Nós já temos algumas boas respostas. A atração de investimentos vai indo muito bem, sinal que as medidas que estamos tomando e o Ceará estão sendo bem percebidos pelo mercado como opção adequada para seus negócios.
Nós estamos melhorando. E vemos isso pelo próprio desempenho da economia, com a movimentação portuária e geração de empregos. Isso é sinal de que as propostas estão respondendo positivamente. A própria evolução do PIB mesmo ante a pandemia mostra isso. Caímos bem abaixo do previsto. O Ipece (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará) sinaliza um crescimento de 3,5% para o ano de 2021.
O Ceará tem um antigo sonho de sair do patamar de 2% do PIB nacional. O senhor avalia mesmo que este ano já será possível atingir isso?
Eu particularmente acredito ser possível. Logicamente, não sabemos ainda dos efeitos negativos da segunda onda no PIB deste ano. A previsão é de crescimento de 3,5% para o Estado. Se for, é uma boa recuperação, mas nós trabalhamos concluindo a implementação de todos esses planos e dando resultado, com um crescimento bem acima de 4%, 5% ao ano, que é o que nós precisamos para os próximos anos.
Nós tivemos, nos últimos 30 anos, uma média de crescimento melhor do que o Nordeste e o Brasil, mas sempre oscilando ali entre 2% e 3%. Isso não é suficiente para fazer uma transformação da economia. Nós temos como meta na Sedet ampliar a participação do PIB cearense dentro do PIB nacional nos próximos 30 anos, de 2,25% para 4,35%.
Por que 4,35%? Porque esse é o tamanho da nossa população em participação na demografia nacional. Ora, se eu passar a ter um PIB de 4,35%, equivalente ao tamanho da população, da participação dela nacionalmente, significa dobrar a renda per capita. Se o PIB cresce a essa taxa, significa que vamos diminuir o desemprego.
E se analisarmos os clusters econômicos, nós estamos introduzindo clusters de melhor valor agregado de salário. Não só para melhorar a renda, mas o poder de consumo. O salário médio do emprego formal no Ceará é de R$ 1.732, muito baixo. Nós estamos procurando economias que aumentem esse salário médio. É o nosso desafio.
O senhor falou do Ceará 2050 e eu queria saber se o coronavírus joga muito para depois os projetos que haviam sido traçados no Ceará 2050. Em quantos anos ele pode ser atrasado em decorrência da pandemia? Ou não haverá esse atraso?
Nós já estudamos os impactos do coronavírus e estamos com essa proposta sobre a qual falei em negociação com a Fiec. Em relação ao Ceará 2050, é a mesma recomendação que o governador fez à Secretaria do Desenvolvimento Econômico. Temos que ficar atentos, pensando de forma integrada para aperfeiçoar a convivência e a saída desses efeitos da pandemia mais na frente.
É fazer esse trabalho que relatei, de aperfeiçoar o Ceará Veloz. Está ocorrendo essa negociação com as entidades produtivas. Esse mesmo dever de casa foi recomendado à Secretaria de Planejamento e às equipes do 2050 para que o Ceará 2050 também se ajustasse. O governador tem duas ações importantes nesse momento em que a pandemia toma conta e impacta muito na economia.
Houve um forte impacto na gestão fiscal do Estado e há um forte impacto na saúde, na vida humana, nas famílias. Esses auxílios emergenciais que estão sendo colocados pelo Estado e pelo Governo Federal para atenuar a questão da pobreza, diminuindo o risco de extremos, também são muito importantes nesse sentido.
O Ceará 2050 eu acredito que já tenha feito esses ajustes, mas não posso responder porque aí é uma consulta que tem que ser feita ao secretário Mauro Benevides Filho (Planejamento e Gestão).
Eu acredito que estamos finalmente concluindo a análise da proposta do Estado para sentarmos em uma mesa, chegarmos a um consenso, porque há muito em comum entre o trabalho que a Fiec anunciou em novembro, da plataforma de desenvolvimento da Fiec. E aí eu acredito que o governador espera, concluindo isso, a possibilidade de fazer esse anúncio. É uma medida econômica importantíssima nesse processo exatamente considerando os efeitos da pandemia.
Sobre a relação entre o executivo estadual e o Governo Federal em prol do desenvolvimento econômico do Estado do Ceará, sobretudo diante desse contexto, o senhor avalia que esse relacionamento poderia ser mais afinado?
Essa questão política liderada pelo presidente da República e o governador do Estado não cabe a mim. O que eu posso dizer é que o meu canal de relacionamento em Brasília é com o Ministério da Economia, o Ministério da Agricultura (Mapa) e temos algumas interfaces, em função da cadeia de energia, com o Ministério de Minas e Energia (MME). Itataia, por exemplo, é um projeto de origem do Ministério de Minas e Energia que nós estamos apoiando e a nossa relação é boa.
Tratamos muito com o secretário Carlos da Costa (secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade) e sua equipe. Empreendedorismo eu trato com ele, política de desenvolvimento do trabalho eu trato com ele, indústria é com ele, comércio e serviços também é com ele.
O relacionamento entre as equipes e eu e o Carlos da Costa é o melhor possível. Assim como é também em outros órgãos federais com quem eu tenho me relacionado, como Banco do Nordeste (BNB) e BNDES.
Nós estávamos falando sobre o hidrogênio verde, que é um dos grandes projetos anunciados para o Ceará. Existe alguma outra linha de atuação do Estado na pretensão de novos hubs para cá além dos que nós já conhecemos?
Nós temos quatro hubs anunciados pelo governador: o portuário, o aeroportuário, temos esse hub de tecnologia e mais recentemente o de hidrogênio. O hub de hidrogênio já é uma consequência da cadeia econômica de energia e gás, que vai de vento em popa no Ceará. São duas economias eu diria até já consolidadas, apenas em crescimento e em processo de atração de outros atores.
Não se trata de um hub, mas tem um anúncio aí que o governador está finalizando para fazer também na área de energia. Em breve será anunciada uma grande empresa que vem somar à cadeia de energia e gás. É uma coisa nova, que nem o Ceará, nem a Região Nordeste possuem.
Tem um outro hub, que seria o quinto, que nós já finalizamos as negociações e que o governador também deve anunciar em breve. Agora está dependendo apenas do agendamento para ele próprio, o governador, fazer o anúncio. Esse seria o quinto. E nós ainda estamos negociando, mas com um bom avanço na semana passada, algo que seria um sexto hub.
Com isso, do ponto de vista estratégico, nós estamos concluindo aquilo do que precisaria o Ceará para ser um Estado estruturado, preenchendo algumas lacunas de desenvolvimento.
Ainda falando de hidrogênio verde, que se apresentou como esse grande projeto, uma das avaliações para que se obtenha esse sucesso é que a produção desse hidrogênio deve ocorrer de forma competitiva. Como o Governo do Ceará pode contribuir para essa competitividade, para que o Ceará se destaque ante outras nações?
O Ceará é um dos mais competitivos do mundo, porque ele tem todos os insumos adequados. Possui um porto altamente competitivo, sem a necessidade de ser construído outro. Provavelmente pode, dependendo do tamanho desse volume exportado futuramente, passar por alguma ampliação.
Em segundo lugar, tem garantia hídrica no Ceará, principalmente após implantar o processo de dessalinização e também com a chegada do São Francisco no Açude Castanhão, além da possibilidade que temos de tratar todo o esgotamento sanitário de Fortaleza, que se chama reúso. Já existe a tubulação para levar essa água tratada de reúso para o Pecém, então temos garantia de segurança hídrica para o processo, porque precisa de água.
O terceiro ponto é que temos energia abundante. Já temos hoje exportadores de energia. Nos nossos projetos, estamos ampliando essa produção de energia e o projeto de hidrogênio verde vai ampliar muito a produção de energia solar e eólica on shore e off shore do Ceará.
Somos o único estado do Brasil que possui uma zona livre com área suficiente. Na ZPE, não se paga imposto para o que se produz lá e exporta. Isso nenhum estado brasileiro tem. E, por fim, temos como fazer o transporte por meio os navios que vão levar esse gás produzido no Ceará para o mercado consumidor da Europa e Ásia. Esse navio já existe e foi desenvolvido pelo Japão.
Isso está começando agora no mundo e vai se desenvolver muito daqui para frente. Muito. A demanda do mercado por hidrogênio verde vai provocar uma melhoria na tecnologia, o que baixa o custo. Vão aparecer fabricantes desse produto, dessa base de produção da cadeia de hidrogênio e isso também vai baratear pela escala.
Outro ponto importante aí é a capacitação dos nossos recursos humanos. E nisso eu também não vejo problema. O mundo vai capacitar a gente, como capacitou com o petróleo, para que a gente possa trabalhar nessa nova cadeia de combustível limpo. O custo vai esperar um pouco de tempo, tanto no Ceará como no Brasil e até na Europa - não pense que eles não possuem os mesmos desafios que nós. Nós temos mais capacidade de produzir do que eles.
Em quanto tempo o senhor avalia que o hub de hidrogênio verde vai gerar um impacto significativo no PIB do Estado?
O prazo é longo. Não se trata de uma coisa imediata ou de curto prazo. É de longo prazo, como foi também a cadeia do petróleo no início. A cadeia do petróleo no Brasil já tem mais de 70 anos e hoje é uma economia forte. Com o hidrogênio verde no Ceará não vai ser diferente, porque depende dessa transição do uso de combustíveis fósseis.
Outros países estão aí regulamentando, a Alemanha passou na frente, Reino Unido, Japão. Eu não vejo um horizonte menor do que 10 anos para isso começar a repercutir na economia do Ceará e estimo que a consolidação dessa proposta de o Estado ser um dos grandes produtores e exportadores do mundo de hidrogênio verde seja algo de 30 anos para frente.
E não estamos falando só de hidrogênio verde para a indústria e para a geração de energia como também para os transportes. Outro trabalho que estamos desenvolvendo em parceria é para, em uma segunda etapa, transformarmos esse hidrogênio verde em hidrocarboneto verde. No caso, é o querosene de aviação.
Sabemos que o senhor ainda tem um grande trabalho pela frente, principalmente considerando todas essas pretensões e projetos mencionados, mas qual deve ser o seu maior legado à frente de pastas tão importantes?
Quanto ao meu trabalho, eu gostaria que fosse lembrado como um marco de inversão, um marco de mudança, assim como o que eu fiz na Seplan (Secretaria do Planejamento, na gestão de Lúcio Alcântara) e na Seplag (Secretaria de Planejamento e Gestão), no governo Camilo. Acredito que já deixei um grande legado para o Ceará, não só pelas reformas de transformações, mas pelas obras implantadas. Ou em lei, ou em decreto, foram muitas coisas implementadas.
Na Sedet, o espírito é o mesmo. O legado é essa profunda reestruturação na política de desenvolvimento econômico do Ceará e no aparato institucional. É um legado de modernização da Sedet e isso nós já estamos construindo, fazendo uma reestruturação para gerar um novo crescimento para o Estado. Com essas mudanças, queremos atrair negócios de maior volume para o Estado e em setores estratégicos que o Ceará não vinha trabalhando.
Você já imaginou encontrar comigo daqui a 10 anos e pensarmos: que jogada aquela de atuar com o microcrédito para os mais pobres. Quantas pessoas melhoraram de vida! O mundo inteiro se desenvolve trabalhando pequenas e microempresas e o Ceará não vinha fazendo isso. E nem o Brasil está fazendo isso.
Outro ponto importante do meu legado é direcionar a formação de talentos no Ceará junto com a Seduc e com as nossas universidades. Melhorar o perfil de formação profissional, que depende também de outros secretários, mas eu estou estimulando para que eles entendam que precisamos formar gente para a gente e não para ir para fora. Como eu vou preparar um profissional para ele ir para outro lugar? Precisamos qualificar o nosso capital humano e criar oportunidades. E temos que ser um estado que acredita em inovação.
O meu sonho é me aposentar vendo o Ceará crescer e dar oportunidade a todos, melhores do que as de hoje. E foi por esse sonho que eu aceitei a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho. O outro desejo, a nossa joia da coroa, é poder pegar o maior engarrafamento de caminhões saindo do Pecém com produtos para outros mercados, ver uma fila de navios aportando no Porto para levar nossas mercadorias.
Quero ver um Ceará mais rico, mais justo e que dê oportunidade a todos e que essa riqueza ajude a eliminar essas desigualdades, incluindo famílias que estão distantes das oportunidades. É o legado que eu quero deixar.