Com queda de 47%, Fortaleza perde R$ 11 milhões de recursos destinados à habitação social

Redução analisada entre 2019 e 2021 prejudica construção de casas e urbanização para comunidades em vulnerabilidade social

Escrito por Lucas Falconery , lucas.falconery@svm.com.br
Moradias
Legenda: Falta de moradias é problema anterior à pandemia, mas agravado com o impacto social e econômico do período
Foto: Fabiane de Paula

Ter uma moradia adequada ainda não faz parte do cotidiano de centenas de fortalezenses. Na pandemia, mesmo com a ampliação da pobreza, essa ausência pode ser maior: o recurso do Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social de Fortaleza caiu 46,8% nos últimos três anos.

Isso porque os investimentos anuais passaram de 23,9 milhões, em 2019, para 12,7 milhões em 2021. As informações são do Portal da Transparência da Prefeitura, analisadas pelo Diário do Nordeste.

A Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor) informou à reportagem que o Fundo Municipal recebe recursos do Governo Federal.

“Que varia de acordo com o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), ou seja, depende de investimentos diretos da União para a aplicação das políticas habitacionais”, como explicou em nota.

Esse contexto impacta diretamente a construção de moradias, regularização fundiária - conhecida como papel da casa -, melhorias habitacionais e a urbanização de assentamentos precários. A assistência acontece para pessoas de baixa renda.

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Só em 2019, 130 mil famílias viviam sem lar ou em condições precárias na Capital, conforme a Defensoria Pública do Ceará e a Habitafor.

E as ações habitacionais não conseguem atender à demanda, como analisa a advogada Mayara Justa, da equipe do Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar (EFTA).

“O risco com esse corte orçamentário é basicamente penalizar ainda mais às populações vulneráveis, que atualmente se forem procurar algum programa habitacional não vão ter essa possibilidade”, frisa.

Esse orçamento para habitação vem diminuindo progressivamente e além do valor previsto, o valor executado também está diminuindo. Praticamente, só é direcionado para folha de pagamento e manter a estrutura da secretaria
Mayara Justa
Advogada

No entanto, em 2020 e 2021 não houve recurso previsto no orçamento do Governo Federal para habitação de interesse social. Em 2019, o valor aplicado foi R$ 18 milhões, mas para pagamentos de contratos anteriores, como revela o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Embora a Habitafor informe que o Fundo receba recursos do Governo Federal, o Ministério do Desenvolvimento Regional afirmou que não realiza repasses ao Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social de Fortaleza.

O MDR destacou a entrega de 9.538 unidades habitacionais nos programas Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e Programa Casa Verde e Amarela (PCVA) entre 2019 e 2022.

Estrutura
Legenda: Falta de estrutura adequada para habitação é realidade compartilhada por centenas de fortalezenses
Foto: Fabiane de Paula

Valéria Pinheiro, pesquisadora do Laboratório de Estudos da Habitação (Lehab) da Universidade Federal do Ceará (UFC), ressalta o impacto da falta de investimento para abrigar a população sem moradia.

"É muita gente e com certeza esse número aumentou enormemente com as dificuldades impostas pela pandemia. O que a gente tem visto nos últimos anos, é desconsideração da habitação como prioridade nas políticas públicas", avalia.

Famílias sem ter onde morar

O déficit habitacional, a falta de moradias para atender a população mais vulnerável, pode ter sido agravada na pandemia com o aumento do desemprego e da pobreza. Sem ganhar dinheiro, essas pessoas tiveram de deixar suas casas.

“Isso porque essas famílias, muitas vezes, pagavam aluguel em locações informais na comunidade, de R$ 300 a R$ 400, porque conseguiam renda que cobria esse valor”, observa Mayara Justa.

Um caminho comum para quem está nessa realidade é buscar ocupações pela cidade.

Muitas vezes, o despejo. "Tem aumentado o número de ameaças de remoções, apesar das decisões em termos de Justiça de tentar evitar despejos durante a pandemia", acrescenta Valéria Pinheiro.

Com isso, também são negados direitos como saúde e segurança. "Agora com as chuvas em Fortaleza a gente viu voltando com força a questão das áreas de risco que, por algum tempo, foi amenizada", pondera a pesquisadora.

Ações em Fortaleza

A Habitafor listou ações habitações realizadas mesmo com as dificuldades com a entrega dos empreendimentos residencial Maria Alves Carioca, na Granja Lisboa, e o residencial dos Servidores II, no Itaperi, em 2021, além de títulos de propriedade e melhorias habitacionais.

"O Município acompanha ainda obras, como as dos residenciais dos Servidores I, no Passaré, e da Lagoa do Papicu 2, realiza processos de regularização fundiária em mais de 30 núcleos urbanos informais, desenvolve ações de melhorias habitacionais", acrescentou em nota.

A Secretaria também informou manter diálogo com "a Secretaria Nacional de Habitação e com os agentes financeiros, sobretudo a Caixa Econômica Federal, para a execução de novos projetos habitacionais na Cidade".

Programa Casa Verde e Amarela

O MDR ressalta o Programa Casa Verde e Amarela com ações como regularização fundiária e melhoria habitacional em parcerias com estados e municípios para reduzir o valor de entrada das famílias no financiamento.

"Na parte de financiamentos habitacionais, o Programa inovou ao lançar a menor taxa de juro do FGTS da história.  E menor ainda no Norte e Nordeste (regiões que apresentam maior déficit e tinham menos contratações anuais - até 4,25% a.a para Norte e Nordeste e até 4,5% para as demais regiões", destacou o Ministério.

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