Ceará quase triplica população indígena e chega a 56 mil pessoas, diz Censo 2022

Pesquisa aumentou alcance em localidades com presença de etnias no Estado

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Nos últimos 50 anos, o autorreconhecimento dessa população foi ganhando força no Estado
Foto: Kid Jr.

Uma nova divulgação do Censo Demográfico 2022, nesta segunda-feira (7), revela que o Ceará quase triplicou a população indígena residente no Estado em comparação com o Censo de 2010. Atualmente, há 56.353 pessoas com essa autodeclaração, o que representa 0,64% dos 8,7 milhões de habitantes. O dado coloca o Ceará como o 4º Estado do Nordeste e o 9º do Brasil com mais indígenas.

Em 2010, foram contabilizadas 20.697 pessoas dessa população, o equivalente a apenas 0,24% do total, à época. A contagem é realizada e analisada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que ressalta cautela na comparação dos resultados.

Segundo o órgão, há diferenças entre as metodologias empregadas nos dois levantamentos:

  • No Censo 2010, definiu-se como “indígena” a pessoa residente em terras indígenas que se declarou indígena pelo quesito de cor ou raça ou pelo quesito “se considera indígena”; ou a pessoa residente fora das terras indígenas que se declarou indígena.
  • No Censo 2022, foram considerados os residentes em “localidades indígenas” ou fora delas que se declararam indígenas pelos mesmos quesitos.

O IBGE explica que a abrangência se tornou maior porque, há 12 anos, o conjunto de terras indígenas era formado por aquelas que estavam na situação fundiária de declarada, homologada, regularizada ou em processo de aquisição como reserva indígena.

Já em 2022, foram consideradas "localidades indígenas" aquelas que compõem o conjunto das Terras Indígenas, dos agrupamentos indígenas e das demais áreas de conhecida ou potencial ocupação indígena.

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O geógrafo Fernando Damasco, gerente de Territórios Tradicionais e Áreas Protegidas do IBGE, detalha que os indígenas se organizam em diferentes configurações territoriais, logo o mapeamento “se compromete não só com a constatação de indígenas, mas se há sinal de presença indígena no local” - e não apenas aquelas delimitadas e identificadas formalmente pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Segundo o gerente, houve a criação de uma cartografia censitária colaborativa com lideranças e entidades de defesa indígena, logo se consideraram concentrações de indivíduos indígenas vinculados por laços familiares ou comunitários, independente de estarem ou não em aldeias.

Juliana Alves, secretária dos Povos Indígenas do Ceará (Sepin), ressalta que o balanço é "muito positivo" porque a nova metodologia ampliou a catalogação das aldeias cearenses, que "antes era muito superficial".

Hoje, percebemos nossa crescente visibilidade. Se tem município em que uma pessoa se autodeclarou indígena, ela com certeza conhece sua história, sua trajetória, a história dos seus antepassados. Pra gente, enquanto líder de movimento, é de extrema importância saber que hoje os povos indígenas se sentem seguros em dizer qual é o seu povo.
Cacika Irê
Secretária dos Povos Indígenas do Ceará

Recuperação étnica

Ao todo, o IBGE contabilizou no Ceará 24.192 domicílios particulares permanentes ocupados com pelo menos um morador indígena, numa média de 4 moradores por residência.

O levantamento confirma uma tendência de maior autorreconhecimento das comunidades indígenas cearenses, cujo processo de recuperação foi iniciado na década de 1970. Elas foram consideradas “extintas” por mais de 100 anos da história oficial do Ceará, precisando se esconder para não sofrerem massacres.

Durante a colonização do Estado, os indígenas foram empurrados do litoral para o interior do Estado, criando diferentes fluxos migratórios. Em 1863, o então presidente da Província do Ceará, José Bento da Cunha Figueiredo, declarou à Assembleia Legislativa que a população indígena cearense estava extinta. 

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Só nos anos 1970, a mobilização social no Ceará tirou os indígenas da invisibilidade e passou a exigir a efetivação de seus direitos, iniciada pelos povos Tapeba, Tremembé, Pitaguary e Jenipapo-Kanindé. Essa movimentação foi tema da série “Originários”, do Diário do Nordeste, publicada em fevereiro deste ano.

Nos últimos 50 anos, o autorreconhecimento foi ganhando força. O Censo de 2000 indicava uma população de 12.198 indígenas no Estado. No levantamento seguinte, em 2010, o número cresceu para 20.697. Em 2015, estimativa do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) já dava conta de 29.211 pessoas.

Legenda: Ao todo, presença de ao menos um indígena foi confirmada em 172 das 184 cidades do Estado
Foto: Thiago Gadelha

Aumento nacional

Em todo o Brasil, o IBGE encontrou uma população indígena residente de 1.693.535 pessoas, correspondendo a 0,83% da população total. O número é 88% maior do que o de 2010, quando foram contadas 896.917 pessoas indígenas.

Dos 5.568 municípios, 4.832 municípios com população indígena. Em 2010, eram 4.480. Em 3.229 cidades, também houve aumento absoluto de indígenas.

A Região Norte concentra 44,48% da população indígena do País, com 753,3 mil pessoas indígenas. Em seguida, vem o Nordeste, com 31,22% da população. A Região Sul é a que tem menor participação, com apenas 5,20% 

De acordo com Marta de Oliveira Antunes, antropóloga e responsável pelo Projeto de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE, a mobilização envolveu as comunidades, respeitando a diversidade a nível local com o auxílio de lideranças, guias e intérpretes.

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