Legislativo Judiciário Executivo

Qual a situação das CPIs abertas no Congresso Nacional em 2023?

Até o momento, os colegiados tomaram depoimentos de testemunhas e de investigados nos casos, além de terem solicitado informações para embasar os trabalhos às autoridades competentes

Escrito por Ingrid Campos , ingrid.campos@svm.com.br
CPMI 8 de janeiro, Congresso Nacional, andamento, recesso parlamentar
Legenda: Talvez a principal comissão de investigação instalada no Legislativo Nacional neste ano, a CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro tem funcionado sob embates entre base e oposição desde antes da sua instalação, em maio.
Foto: Agência Senado

Com retorno programado para esta semana, as atividades legislativas em Brasília devem ser preenchidas, em boa parte, pelas investigações abertas no primeiro semestre. Há cinco Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) e outra mista (CPMI), reunindo deputados e senadores.

A Câmara vai retomar os trabalhos nas CPIs do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), das Lojas Americanas, das Apostas Esportivas e das Pirâmides Financeiras. Já o Senado vai se debruçar sobre a apuração relativa à atuação de ONGs na Amazônia.

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As duas Casas seguem, ainda, as investigações sobre os atos golpistas de 8 de janeiro, tendo como alvo empresários, funcionários e aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). 

A derrota nas últimas eleições gerais teria causado uma série de ações no seu entorno que levaram à insurgência observada naquela data, quando as sedes dos Três Poderes em Brasília foram atacadas por terroristas. 

Até o momento, os colegiados tomaram depoimentos de testemunhas e de investigados nos seis casos, além de terem solicitado informações para embasar os trabalhos às autoridades competentes.

Confira a seguir o que já foi feito no âmbito das comissões de inquérito:

CPI do MST

A comissão que promete investigar a atuação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), “o seu real propósito, assim como dos seus financiadores” foi instalada na Câmara em maio, simultaneamente a outras duas: das Lojas Americanas e das Apostas Esportivas.

Presidido pelo deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS) e relatado por Ricardo Salles (PL-SP), o colegiado é composto majoritariamente por nomes de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Esse cenário se reflete no perfil dos requerimentos aprovados até aqui: apesar de Salles ter garantido que trabalharia "com máximo de abertura para o diálogo", ainda no início dos trabalhos, apenas 9 dos 21 pedidos aceitos foram de partidos diretamente aliados ao governo até o fim de junho.

Os dados foram retirados de levantamento realizado pelo g1. Os deputados do PL são os principais atendidos nesse sentido. 

No último dia 12, a comissão analisou outra leva de requerimentos e aprovou a convocação do auditor da Controladoria-Geral da União (CGU) João Henrique Wetter Bernardes; do integrante do MST Marco Antônio Baratto Ribeiro da Silva e dos ex-dirigentes da Cooperativa de Crédito Rural Horizontes Novos, de Novo Sarandi (RS). Novamente, pedidos por deputados mais alinhados à direita. 

Com a retomada dos trabalhos em agosto, a CPI receberá novos depoimentos de convocados e convidados. “Entre eles, o líder do movimento, José Rainha; o ex-ministro Gonçalves Dias [ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional], o ministro Paulo Teixeira [Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar]”, informou o relator.

CPI das Lojas Americanas

A comissão que vai apurar possível fraude contábil de cerca de R$ 20 bilhões na Americanas, por sua vez, já ouviu:

  • O presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), João Pedro Barroso do Nascimento; 
  • O chefe do Departamento de Monitoramento do Sistema Financeiro (Desig) do Banco Central (BC), Gilneu Francisco Astolfi Vivan; 
  • O CEO da Americanas S.A, Leonardo Coelho Pereira;
  • Os presidentes dos conselhos de contabilidade federal, Aécio Prado Dantas Jr, e regional do Rio de Janeiro, Samir Nehme.

Na Câmara, o diretor-presidente das Americanas afirmou que vai compartilhar o relatório contábil da empresa com autoridades envolvidas nas investigações, entre elas a CPI, o Ministério Público, Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Polícia Federal.

A tomada de depoimentos de Miguel Gutierrez, ex-diretor executivo da Americanas, e de Fábio da Silva Abrate, ex-diretor financeiro e de relações com investidores da Americanas, ocorreria no último dia 4, mas a reunião foi cancelada. Eles devem ser recebidos pelos deputados em outro momento.

Com a previsão de retomada dos trabalhos em agosto, Abrate garantiu o direito de ficar em silêncio quando for participar das oitivas. A garantia foi dada no início deste mês pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O ex-diretor financeiro da empresa tinha pedido a dispensa de depor à comissão, o que foi rejeitado por Luis Roberto Barroso, à época em regime de plantão. 

“O Supremo Tribunal Federal tem uma orientação consolidada no sentido de que o privilégio contra a autoincriminação é plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito”, entendeu o ministro.

Todos os pedidos de informação e de depoimentos são feitos por meio de requerimentos, e o Ceará foi o Estado que mais apresentou pedidos até aqui. Foram 26 de Júnior Mano (PL) e 14 de Domingos Neto (PSD).

A comissão é presidida pelo deputado Gustinho Ribeiro (Republicanos-SE) e relatada pelo deputado Carlos Chiodini (MDB-SC).

CPI das Apostas Esportivas

Os trabalhos na CPI que vai investigar a manipulação de resultados de partidas de futebol são guiados pelo presidente Julio Arcoverde (PP-PI) e pelo relator Felipe Carreras (PSB-PE). O cearense André Figueiredo (PDT) é o 1º vice-presidente.

De maio até o recesso parlamentar, o colegiado aprovou uma série de requerimentos. Destacam-se um de Figueiredo que convida Khalid Ali, CEO da IBIA (sigla de The International Betting Integrity Association, organização que reúne 120 casas de apostas esportivas, movimentando centenas de bilhões de dólares), para depoimento.

Já Danilo Forte (União) conseguiu aprovar a convocação dos jogadores Vinícius Goes Barbosa de Souza (Vina), Richard Coelho e Severino de Ramos Clementino da Silva (Nino Paraíba) para oitivas no colegiado. O ex-técnico do Alvinegro, Tiago Nunes, também foi convidado.

Os atletas compuseram o elenco do Ceará até o ano passado, quando o time deu adeus à série A. Os dois últimos foram citados em investigação do Ministério Público de Goiás (MPGO) sobre o tema, na Operação Penalidade Máxima.

O colegiado também recebeu duas audiências públicas para debater a Operação Penalidade Máxima do MPGO. A primeira contou com a presença de representantes do próprio órgão ministerial e do presidente do Vila Nova Futebol Clube, Hugo Jorge Bravo.

A segunda, ainda na finalidade de apurar o aliciamento de jogadores para fraudar o resultado de partidas de campeonatos estaduais e do Campeonato Brasileiro, teve como convidados:

  • O presidente da Federação Goiana de Futebol, Ronei Ferreira de Freitas,
  • O presidente do Sindicato dos Árbitros de Futebol de Goiás, Paulo César Ferreira de Almeida;
  • O ex-presidente do Sindicato dos Árbitros de Futebol de Goiás Cleyton Pereira dos Anjos;
  • O presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de Goiás, Júlio Cesar Garcias.

Os deputados também ouviram o ex-jogador do Vila Nova (GO) Marcos Vinicius Alves Barreira (Romário); o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto; o Secretário Nacional do Consumidor, Wadih Damous; e o Secretário Especial do Ministério da Fazenda, José Francisco Manssur. 

A iniciativa para criar a CPI partiu de investigações feitas pelo Ministério Público de Goiás que levantaram suspeitas de manipulação no resultado de quatro jogos da série B. Os parlamentares acreditam que as irregularidades também tenham sido cometidas em partidas de outras séries, atendendo a todo um organismo de apostas esportivas.

CPI das Pirâmides Financeiras

Instalada na Câmara em junho, a CPI das Pirâmides Financeiras já ouviu Glaidson Acácio, o “Faraó dos Bitcoins”, suspeito de cometer crimes contra o sistema financeiro e preso há quase dois anos por isso. Ele e a esposa, Mirelis Yoseline Diaz Zerpa (atualmente foragida), devem ser alvos, ainda, de pedidos de quebra dos sigilos fiscal, bancário e de dados.

“Para conhecermos todos os dados que o depoente não pode expor. Diversos dados já estão disponíveis nas investigações da Polícia Federal [PF], à qual pediremos o compartilhamento de provas com a CPI”, disse o presidente da CPI, Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ).

O colegiado investiga esquemas de pirâmides financeiras com uso de criptomoedas, como os organizados por 11 empresas, segundo a Comissão de Valores Mobiliários, do Ministério da Fazenda.

Essas instituições teriam divulgado informações falsas sobre os projetos e prometido alta ou garantida rentabilidade nas transações, o que não se confirmou no fim para as vítimas. 

Também serão convocados o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e os donos da empresa Braiscompany (acusada de fraude), Antônio Neto Ais e Fabrícia Campos, ambos foragidos.

O primeiro deve falar sobre a regulação do uso de criptomoedas no País, enquanto os outros dois devem participar na condição de investigados. Esse é um pedido do cearense Júnior Mano (PL) e do próprio presidente do colegiado. 

Ao fim dos trabalhos, o relatório do deputado Ricardo Silva (PSD-SP) deve ser encaminhado às autoridades competentes.

CPI das ONGs

Iniciativa do Senado, esta CPI investiga a atuação de organizações não-governamentais financiadas com dinheiro público na região da Amazônia. Desde sua instalação, em junho, foram realizadas quatro reuniões, sendo três de oitivas. 

Até julho, os senadores receberam depoimentos do ex-ministro Aldo Rebelo, de Marcelo Norkey Duarte Pereira, de Miguel dos Santos Correa, de Luciene Kujãesage Kayabi, de Alberto Brazão Góes, de Adriel Kokama e de Valdeci Baniwa.

Algumas das lideranças indígenas convidadas já enviaram denúncias, como apontam os requerimentos, sobre a atuação de ONGs nos territórios originários. 

No geral, entre outras denúncias, foram relatadas a falta de transparência no trabalho das ONGs e a exploração produtos naturais para a indústria de cosméticos. 

No retorno do recesso parlamentar, a expectativa é receber representantes dessas ONGs, antropólogos, pesquisadores, representantes do governo e ex-ministros. Entre eles, a presidente do Conselho Diretor da ONG Instituto Socioambiental, Déborah de Magalhães Lins, e o presidente da Natura, João Paulo Brotto Gonçalves Pereira. 

Já em 1º de agosto está prevista uma inquirição com a deputada federal Sílvia Waiapi (PL-AP), nome indígena elevado à Câmara com o apoio do eleitorado bolsonarista. No mesmo dia, o autor do livro “Máfia Verde: o Ambientalismo a Serviço do Governo Mundial”, Lorenzo Carrasco, também deve prestar depoimento.

CPMI do 8 de janeiro

Talvez a principal comissão de investigação instalada no Legislativo Nacional neste ano, a CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro tem funcionado sob embates entre base e oposição desde antes da sua instalação, em maio. 

Como o próprio nome já diz, o colegiado é misto, acomodando deputados federais e senadores. Quatro cearenses estão entre os componentes, incluindo André Fernandes (PL), alvo de inquérito do STF por suspeita de incentivar o ato.

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Os outros são os senadores Cid Gomes (PDT), Eduardo Girão (Novo) e Augusta Brito (PT).

Até o momento, os congressistas já ouviram figuras diretamente ligadas ao episódio (ou a atos que o antecederam), sejam investigados, sejam envolvidos na investigação. São eles:

  • Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF);
  • George Washington de Oliveira Sousa, cearense preso por tentar explodir uma bomba perto do aeroporto de Brasília;
  • Leonardo de Castro, diretor de Combate à Corrupção e Crime Organizado da Polícia Civil do Distrito Federal;
  • Renato Martins Carrijo, perito da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) responsável pelo laudo sobre o local onde foi encontrado o artefato explosivo e pela sua neutralização;
  • Valdir Pires Dantas Filho, também perito da PCDF responsável pelo laudo sobre o explosivo;
  • Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar do Distrito Federal;
  • Jean Lawand Junior, coronel do Exército suspeito de organizar atos golpistas no ano passado com o tenente-coronel Mauro Cid;
  • Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.

Preso desde maio, Mauro Cid, inclusive, ficou em silêncio durante toda a oitiva, amparado por decisões do STF que lhe garantiam não responder a perguntas que pudessem incriminá-lo.

A comissão também aprovou pedido da relatora Eliziane Gama (PSD-MA) pela quebra de sigilos telemáticos de toda a equipe de Cid no gabinete de Bolsonaro na Presidência da República. 

A partir de segunda (1º), os congressistas receberão figuras como o ex-diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Saulo Moura da Cunha, que comandava o órgão em 8 de janeiro.

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