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O que está em jogo na eleição municipal de Caucaia após a desistência de Vitor Valim

O Município é estratégico no equilíbrio de forças estadual e figura como o segundo maior colégio eleitoral do Ceará, ficando atrás apenas de Fortaleza

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Vitor Valim anunciou que não irá disputar a reeleição em Caucaia
Legenda: Vitor Valim anunciou que não irá disputar a reeleição em Caucaia
Foto: Fabiane de Paula

A desistência do atual prefeito de Caucaia, Vitor Valim (PSB), de disputar a reeleição para o cargo em 2024 embaralhou ainda mais o cenário político no município da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). A cidade, que é o segundo maior colégio eleitoral do Ceará — e assim como a Capital pode levar a disputa para o segundo turno —, é estratégica para quem comanda o grupo governista no Estado e também para aqueles que tentam tomar esse posto.

Agora, com a saída de Valim do rol de pré-candidatos e sem um nome favorito para sucedê-lo, a lista de aliados cotados para a vaga só aumenta e inclui secretários municipais, estaduais e federais, além de parlamentares.

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Para Emanuel Freitas, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), as múltiplas forças que disputam o comando da cidade dão a dimensão da importância política do local.

“Caucaia é importante do ponto de vista da densidade eleitoral, da economia, do turismo, mas, em especial, porque as três últimas eleições foram vencidas por sujeitos que não são filhos da terra, que é o Vitor Valim (natural de Fortaleza) e o Naumi Amorim (natural de Tauá). Tem essa tradição aí na cidade que (...) passa por tensões de grupos políticos que tentam reproduzir lá uma certa polarização que vinga aqui no Estado”, avalia.

Outro elemento importante no Município, segundo o analista político, foi a aproximação da gestão, sob comando de Valim, do Governo do Estado ao longo desses quatro anos. 

“Na última disputa (2020), quem venceu foi um opositor do Governo do Estado, alguém que era alinhado, no plano nacional, ao bolsonarismo e, no plano estadual, à oposição, que era o Vitor Valim. Em 2020, Caucaia foi contabilizada como um importante polo de reação, opositor ao Governo — junto com Juazeiro do Norte e Maracanaú. Durante a gestão do Vitor, isso acabou se desfazendo porque ele virou governista”
Emanuel Freitas
Professor de Teoria Política da Uece

“Obviamente, é importante para a oposição reconquistar com outro nome aquela cidade e, para o Governo, vir de fato a conquistar, porque havia perdido em 2020”, conclui.

Valim anuncia que não tentará reeleição

Anunciada na noite de segunda-feira (8), a decisão do prefeito pegou muitos aliados de surpresa. 

“Este projeto de governo comandado pelo nosso líder político aqui no Estado, o senador e ministro Camilo Santana, e pelo nosso governador Elmano de Freitas aqui em Caucaia, junto à minha base política de vereadores e secretários, vai ter um novo nome com muito vigor e energia que possa comandar essa cidade pelos próximos quatro anos", disse o gestor durante live nas redes sociais, sem justificar a decisão.

Recentemente, em movimento estratégico que parecia de olho nas eleições deste ano, Valim se filiou ao PSB, sigla atualmente comandada por Eudoro Santana (PSB), pai do ministro da Educação.

A filiação coroou a guinada à esquerda do prefeito, que foi eleito em 2020 como um dos principais aliados do ex-deputado Capitão Wagner (União Brasil), líder da oposição no Estado. Contudo, já na Prefeitura, Valim foi dando passos rumo ao Palácio da Abolição, chegando ao ponto de fazer campanha para os candidatos petistas no pleito de 2022.

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Segundo o prefeito e seus aliados, caberá a dois petistas definir o candidato a suceder o mandatário municipal: Camilo e Elmano.

Para o cientista político Cleyton Monte, que também é professor universitário e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC), a decisão do prefeito “acaba paralisando a oposição”.

“A oposição ia em cima do Valim e, agora, que não tem um nome consolidado, acaba paralisada. Essa decisão joga uma responsabilidade na coligação do Vitor Valim porque estamos vendo nomes sendo especulados e é preciso ter essa definição logo de qual deles vai ser colocado lá no Município para iniciar a campanha”, afirma.

De olho na sucessão

A preço de hoje, a lista de pré-candidatos que Camilo e Elmano irão se deparar é extensa. Entre os cotados, aparecem os secretários municipais Silvio Nascimento (Patriota), de Patrimônio e Transporte; e Natécia Campos, de Desenvolvimento Social. Da Câmara Municipal, surgem Vanderlan Alves (União), líder do governo no Legislativo, e Dr. Tanilo (PDT), presidente da Casa.

Mas a lista não para por aí. Também são cotados nos bastidores o secretário do Desenvolvimento Social do Ceará, Salmito Filho (PDT); a secretária da Proteção Social e ex-primeira-dama do Ceará, Onélia Santana; a deputada estadual Lia Gomes (PDT); e a secretária executiva do Ministério da Educação, Izolda Cela (sem partido). 

O que dizem os nomes cotados

Desde que Valim anunciou a decisão de abdicar da disputa pela reeleição, alguns desses nomes publicaram mensagens de apoio nas redes sociais. Lia Gomes, por exemplo, disse que "o atual prefeito é o melhor nome para continuar o trabalho que vem realizando à frente da Prefeitura de Caucaia".

Salmito também usou as redes sociais para exaltar o trabalho do prefeito. “Respeito a sua decisão, admiro o seu desapego ao poder, agradeço o apoio para deputado estadual na eleição de 2022 e honrado em ser parceiro de um projeto que prioriza a querida população de Caucaia”, disse. 

Os secretários e vereadores seguiram a mesma linha. Em entrevista ao Diário do Nordeste, Vanderlan disse que o aliado tomou a decisão pensando na população de Caucaia. 

“Vendo que o Município precisa mais ainda do Estado e do Governo Federal, ele procurou o Camilo e o Elmano e pediu para que o Governo lance um nome para concorrer a eleição no Município atrelado a trazer ajuda para Caucaia. Ele fez isso pensando no Município, a vinda de um candidato é mais investimento para Caucaia, ele reconheceu que precisa de ajuda, aplaudo isso de pé”, afirmou.

O político, inclusive, tem uma carta na manga para tentar se cacifar na disputa. Ele foi o deputado federal mais bem votado no Município em 2022, obtendo 28,3 mil votos, superando inclusive o ex-prefeito Naumi Amorim (PSD), com 20,7 mil votos, que deve disputar o pleito em uma chapa oposicionista no Município.

Entre os outros nomes cotados, Natécia Campos reforçou o “apoio e compreensão” pela decisão do prefeito. Já Silvio Nascimento reafirmou o “compromisso de permanecer no grupo liderado por Vitor Valim”. “Fica o meu apoio incondicional ao projeto que está por vir, com a certeza de que serão tomadas as melhores decisões para o desenvolvimento da nossa Caucaia”, disse Dr. Taniel.

O fator PT

Além da extensa lista com nomes de siglas como PDT e União Brasil — que devem aproveitar a janela partidária para mudar de legenda —, há uma disputa interna entre petistas sobre a postura do partido no pleito. O PT Caucaia já defendeu por meio de uma resolução o lançamento de uma candidatura própria à Prefeitura. No entanto, o PT Ceará defendia o apoio à reeleição de Valim. Contudo, com a decisão do mandatário, o cenário que caminhava para um acordo volta a ficar indefinido.

O diagnóstico foi dado pelo próprio presidente estadual da sigla, Antônio Filho, o Conin. Em conversa com o Diário do Nordeste, ele reforçou as palavras de Valim de que a decisão caberá a Camilo e Elmano.

“Nossa pretensão era apoiar o Vitor, abrimos essa discussão, agora temos que ver com ele. Ele próprio disse que vai ouvir o Camilo e o Elmano, que respeita a decisão, então essa será a construção, vamos estar juntos”, disse. O dirigente ainda evitou comentar sobre uma possível candidatura petista no Município. “Não vamos antecipar, vamos ouvi-lo”, concluiu.

Nomes da oposição

Enquanto os nomes da base governista se multiplicam, as pré-candidaturas oposicionistas intensificam as críticas à gestão municipal. Um dos pré-candidatos saiu da própria Prefeitura: o vice-prefeito Deuzinho Filho (União). Rompido com o chefe do Executivo, ele era tido como o principal nome conservador da disputa após a guinada de Valim à esquerda.

No entanto, Deuzinho teve um revés na pré-candidatura após o PL, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro, anunciar coronel Aginaldo Oliveira, ex-chefe da Força Nacional de Segurança (FNS), como postulante ao cargo de prefeito. O político tenta atrair o eleitorado mais bolsonarista do Município, até então alinhado a Deuzinho.

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Outro nome posto é o da tucana Emília Pessoa (PSDB), ex-aliada de Valim. Em 2020, concorreu à Prefeitura, mas ficou em terceiro lugar. No pleito de 2022, a tucana foi a candidata à deputada estadual mais votada no Município. 

Também na oposição municipal está Naumi Amorim, prefeito derrotado no pleito de 2020. À época, ele recebeu apoio do então governador Camilo Santana. Atualmente, o político tem intensificado a pré-campanha nas redes lembrando as entregas quando estava à frente do Município e apontando problemas na gestão de Valim.

Disputa acirrada

Para Cleyton Monte, a disputa em Caucaia é naturalmente “complexa”. 

“É um cenário muito crítico, uma construção complexa e, por mais que o Valim tenha conseguido apoio do Estado para alguns projetos interessantes, se ele não conseguiu melhorar a popularidade, a desistência pode ser uma forma de viabilizar um outro nome, mas que seja de continuidade”, aponta.

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O cientista político relembra a dificuldade encontrada por gestões de grupos políticos anteriores, como a Família Arruda, representada pelos ex-prefeitos Zé Gerardo Arruda e, sua esposa, Inês Arruda, e a Família Amorim, que teve como prefeito o antecessor de Valim, Naumi Amorim.

“Eles ganharam dentro de um movimento de oposição, mas foram se desgastando na gestão porque lá tem essa dificuldade de montar arranjos, a relação com a Câmara Municipal também é muito difícil”
Cleyton Monte
Professor e pesquisador do Lepem/UFC

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