Alimentos, roupas e serviços: como setores vão se beneficiar com redução do ICMS? Entenda

Segmentos em que o consumo de energia é parcela importante do orçamento estavam com dificuldades em passar aumento de custos para o consumidor

Escrito por Heloisa Vasconcelos , heloisa.vasconcelos@svm.com.br
Legenda: O setor de alimentos tinha repassado altas decorrente do aumento nas contas de energia
Foto: Helene Santos

A queda de até 10% na conta de energia com a redução da alíquota do ICMS é uma notícia positiva para setores que têm esse custo como parcela importante do orçamento. O alívio deve vir para repor margens de lucro e não necessariamente representa uma redução de custos para o consumidor final

O aumento de em média 24% na conta de energia, estabelecido pela Enel em abril, vinha apertando o orçamento sobretudo da indústria, que precisa do insumo para manter a operação, em alguns casos, 24 horas por dia. 

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Segmentos do setor de serviços, como bares, restaurantes e salões de beleza, também tiveram um aumento substancial nos custos e tinham dificuldade em repassar tudo para o consumidor diante da inflação generalizada. 

Setores impactados pela conta alta 

O economista do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon) Ricardo Coimbra explica que bens industriais costumam ser mais afetados por alterações no preço da tarifa de energia por precisarem substancialmente desse insumo para a produção.  

É interessante a gente observar que o setor industrial é o que mais sofre impacto com o aumento da energia, principalmente aqueles que tem uma intensidade maior da energia. Têxtil, alimentos, todos os processos produtivos necessitam de uma carga de energia bastante elevada. Se você pegar setor têxtil e confecção, tem todo aquele processo da produção do fio, tecido, peças, tudo isso você precisa de energia. Tem uma participação significativa e acaba por repassar
Ricardo Coimbra
economista do Corecon

O segmento de alimentos, tanto na indústria como no comércio, também é afetado devido à necessidade de câmaras de refrigeração para manter a qualidade dos insumos, o que aumenta o consumo mensal. 

Também do Corecon, o economista Ricardo Eleutério destaca que o repasse dos custos mais altos é gradual e depende de cada setor.  

“Nos setores onde há mais concorrência, a dificuldade se torna maior de repassar todo o aumento de custos para preços finais, o repasse é parcial ou menor. Mas quando tem setores que poucas e grandes empresas dominam, a concorrência é pequena, as empresas fazem um acordo de preços e o repasse é dado de forma integral e até de mais que foi o aumento de custos. Se transforma em uma inflação de lucro”, percebe.  

Segundo Coimbra, o impacto na conta dos estabelecimentos é repassado para a economia como um todo. Ele analisa que a inflação em Fortaleza se mostrou acima da nacional no último mês justamente por causa do reajuste da Enel. 

Ele destaca que a redução do ICMS pode chegar na ponta, à medida que os custos de produção diminuam. 

“Pode gerar impacto na redução do custo de operação, que pode reduzir o custo de produção e, isso acontecendo, pode ou elevar a margem de lucratividade do setor produtivo ou redução dos preços de alguns produtos, principalmente aqueles que tem a energia como principal elo de produção. Pode ter sim um repasse para industrializados e serviços, principalmente serviços que utilizam mais energia, como salões de beleza e telecomunicações”, elenca.  

Por mais que a redução do ICMS traga um alívio nas contas, o economista da FGV André Braz considera que uma estabilização das contas depende de outros fatores, principalmente com o acréscimo na tarifa das bandeiras tarifárias, que ainda não foram acionadas. 

Os aumentos vão ocorrer enquanto os preços não estabilizarem. A gente precisa de estabilidade cambial, volume de chuvas regulares a ponto de poder gerar energia hidrelétrica e ter uma estabilidade maior dentro do país, para diminuir incertezas
André Braz
economista da FGV

Indústria 

O presidente do Sindicato das Indústrias da Alimentação e Rações Balanceadas do Estado do Ceará (Sindialimentos), Isaac Matos, explica que a energia tem um peso importante para o segmento, podendo ser maior ou menor a depender do nível de automação da indústria. 

Ele afirma que o segmento sentiu o aumento da conta de energia e que os custos foram, na medida do possível, repassados para o consumidor.  

“Temos estratégias de redução de custos para que possa repassar o mínimo possível para o consumidor. É difícil não repassar porque a indústria trabalha com uma margem baixa, de 5 a 7% e às vezes até menos. É complicado quando tem aumentos generalizados para não passar para o consumidor”, diz. 

A redução do ICMS, segundo ele, era esperada pelo setor.

A gente está aguardando há bastante tempo a redução dos custos, então tudo que traz uma redução vem para acalmar um pouco, para tranquilizar e dar margem para a indústria
Isaac Matos
presidente do Sindialimentos

O Diário do Nordeste também entrou em contato com o Sindicato da Indústria de Fiação e Tecelagem em Geral no Estado do Ceará (Sinditêxtil), outro segmento que tem a energia como insumo importante. O presidente do sindicato preferiu não comentar. 

Legenda: O setor têxtil tem a energia como importante insumo nos custos
Foto: Rayane Oliveira/Fiec

Bares e restaurantes 

Um dos setores mais afetados pela crise, os bares e restaurantes também sentiram a alta da energia tanto pelo aumento residual nos produtos como pelos custos de abertura dos estabelecimentos.  

De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Ceará (Abrasel), Taiene Righetto, o custo de energia costumava representar entre 2% e 3% do custo dos estabelecimentos. Essa porcentagem está hoje passando dos 5%. 

“O impacto de bares e restaurantes é muito alto, mas o mais importante frisar é que na escala de custos passa de 5%, é algo bastante elevado principalmente para pequenos estabelecimentos. Se você vender ou não vender o custo está lá, acaba sendo não variável, existe independente de qualquer coisa. É um peso alto e impossível de substituição”, ressalta. 

Ele acrescenta que o setor tem dificuldade de repassar os custos ao consumidor sob risco de perder clientela e sair no prejuízo. Neste ano, não houve ainda um reajuste coletivo no setor.  

A expectativa é que a redução do ICMS consiga aliviar as contas e desafogar as margens de lucro dos estabelecimentos. 

Não sabemos de valores exatos e nem quando efetivamente isso vai refletir na conta de energia dos estabelecimentos, mas a expectativa é de que traga algum alívio nas contas dos bares e restaurantes que estão bem apertadas. Importante frisar que isso também só será possível se o governo não aumentar outros impostos pra compensar perda de arrecadação. Se isso acontecer alivia de um lado, mas aperta de outro
Taiene Righetto
presidente da Abrasel-CE

Salões de beleza 

Dependentes da energia para prestar serviços por meio de secadores, chapinhas e outros equipamentos, os salões de beleza viram a conta de energia tomar uma proporção cada vez maior no orçamento. 

De acordo com o diretor financeiro do Sindicato dos Salões de Barbeiros e de Cabeleireiros Institutos de Beleza e Similares de Fortaleza (Sindibel), Valdiro Bezerra, o custo tem superado o aluguel. 

“Antigamente, o aluguel correspondia entre 8 a 10% do faturamento e a energia era equiparada, de 6% a 8% há uns 6 anos. Na pandemia, [a energia] aumentou e ficou de 8% a 12%. Hoje já está extrapolando entre 15% e 16%. O aluguel estacionou mais, estão pagando mais de energia que de aluguel”, coloca. 

Esse aumento nos custos se refletiu em uma alta de até 10% nos preços cobrados pelos serviços. Bezerra destaca que nem todos os salões realizaram o aumento e os que já aumentaram não devem baixar novamente os preços agora com a redução do ICMS

“Culturalmente, quando o brasileiro aumenta, é muito difícil baixar os valores, principalmente no setor de serviços. Como a energia é fundamental para o nosso serviço, vamos esperar qual impacto que vai dar”, diz. 

 

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