Cozinheira deportada diz que passou 44 dias detida antes de chegar a Fortaleza: ‘fui em busca de uma vida melhor’
O esposo dela também foi repatriado e chegou ao Brasil no voo do dia 7 de fevereiro
Após 44 dias detida nos Estados Unidos, uma cozinheira de 41 anos chegou ao Brasil no voo que trouxe 94 repatriados e pousou em Fortaleza nesta sexta-feira (21). Ela contou, em entrevista ao Diário do Nordeste, que estava “em busca de uma vida melhor”, mas não conseguiu entrar no país. Ela trabalhava em uma escola, em Redenção, no Pará, e vai seguir para a cidade de ônibus. O esposo dela também foi repatriado e chegou ao Brasil no voo do dia 7 de fevereiro.
“Eu estava tentando entrar, mas não consegui. Foi bem perrengue, muito sofrimento. Eu fui em busca de uma vida melhor com meu esposo. (Ele) foi deportado no outro voo do dia 7, e eu vim nesse voo agora. Passei 44 dias detida lá”, conta. O sentimento, para ela, é de tristeza. “Mas é erguer a cabeça e seguir em frente.” De acordo com ela, as mulheres não vieram algemadas durante o voo e ao chegar em Fortaleza os repatriados foram "muito bem recebidos".
Dos 94 brasileiros deportados, 13 ficaram em Fortaleza, e a maioria deve seguir para outros destinos. Os demais seguiram para Belo Horizonte em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), segundo a secretária executiva do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), Janine Mello. De acordo com ela 75% dos passageiros são homens. No voo, vieram 9 crianças e dois idosos.
A secretária destaca que é importante não generalizar a situação das pessoas que chegam nesses voos e que o acolhimento realizado em parceria entre os governos federal, estadual e municipal tem a intenção de entender as necessidades específicas de cada uma. “São casos muito heterogêneos, muito diversos, e a gente precisa ter cuidado em relação a como a gente identifica o perfil geral dessas famílias”, afirma.
No voo, uma das passageiras era uma criança nascida em solo norte-ameircano, filha de pais brasileiros. Segundo o defensor regional de direitos humanos da Defensoria Pública da União (DPU) no Ceará, Edilson Santana Filho, ela não tem documentação brasileira e acabou ingressando com visto de turista.
“Isso quer dizer que os Estados Unidos deportaram uma americana para o nosso País”, afirmou. Essa questão, segundo ele, preocupa sob o ponto de vista jurídico e tem que ser resolvida pela diplomacia entre os países.
Além dessa situação, foi informado que dois brasileiros deportados tinham mandados de prisão e foram presos em chegar em Fortaleza. Segundo a Polícia Federal, eles integravam a “Lista Vermelha da Interpol” e foram presos ao desembarcarem no território cearense.
Conforme a PF, os mandados contra estes presos foram expedidos pela Justiça Federal do Paraná e Minas Gerais. Os nomes dos suspeitos não foram divulgados e os dois não saíram algemados. Um tinha mandado de prisão em aberto por roubo e o outro por arregimentar brasileiros e levá-los a outros países.
ACOLHIMENTO AOS REPATRIADOS
Uma das famílias que estavam no voo é cearense, mas decidiu seguir até o aeroporto de Confins, uma vez que eles vão morar em São Paulo, segundo a titular dos Direitos Humanos do Ceará, Socorro França.
A secretária executiva do MDHC, Janine Mello, coordenou a equipe de acolhimento que atendeu os repatriados em Fortaleza, no Posto Avançado de Atendimento Humanizado ao Migrante, equipamento estadual instalado no aeroporto.
Ao chegarem na capital cearense, os brasileiros foram atendidos por equipes de saúde — com psiquiatra, enfermeiro e materiais para primeiros socorros —, além da assistência social, da Polícia Federal e da Defensoria Pública da União. Eles recebem kits de alimentação, com sanduíche natural, bolo, frutas e suco, além de produtos de higiene
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Os governos Federal e do Ceará e a Prefeitura de Fortaleza atuam para identificar, por exemplo, famílias em situação de vulnerabilidade e que necessitem de alguma demanda específica, como abrigamento. A articulação busca “garantir que as diferentes necessidades das pessoas sejam atendidas” e que os repatriados sejam encaminhados adequadamente, segundo Janine Mello.
“Também temos um técnico do Poder Judiciário, porque virão crianças também, para para examinar a documentação, se tem ligação com aquela família. Enfim, estamos preparados para recebê-los com dignidade, isso é que nos importa”, afirmou Socorro França.
Com a chegada dos repatriados, a Defensoria Pública da União atua na prestação de assistência jurídica emergencial, por exemplo, em casos como caso a pessoa não tenha documentos, segundo Edilson Santana Filho, defensor regional de direitos humanos no Ceará. A instituição também fica à disposição para a orientação das pessoas em seus destinos finais.
“Há uma preocupação especial da Defensoria Pública da União com relação a crianças também que chegam com seus pais. Alguns dos pais estavam presos antes de serem deportados, então há uma preocupação com a situação dessas crianças, as condições em que estavam, as condições em que chegaram”, afirma.
DEPORTAÇÃO DE BRASILEIROS
O primeiro voo com deportados trouxe 88 brasileiros no dia 25 de janeiro e tinha Belo Horizonte como destino final. Porém, a aeronave pousou em Manaus para passar por manutenção. Nele, os passageiros vieram algemados e relataram agressões físicas e verbais.
O Aeroporto Internacional de Fortaleza foi escolhido como destino a partir do segundo voo porque a Capital devido a questões estratégicas e baseadas no Direito Internacional. Como a capital cearense é a cidade litorânea mais próxima dos Estados Unidos, isso garante que os passageiros fiquem o menor tempo possível com as algemas em território nacional.
A chegada do segundo voo ocorreu em Fortaleza no dia 7 de fevereiro e trouxe 111 brasileiros, incluindo 8 crianças de até 10 anos e mais 11 crianças e jovens até 20 anos. Com exceção das crianças e de seus acompanhantes, os passageiros vieram algemados e, segundo a secretária Socorro França, muitos estavam “machucados emocionalmente”.
As operações de deportação em massa começaram poucos dias após a posse de Donald Trump como presente dos Estados Unidos. Ao longo da campanha presidencial, ele prometeu conter a imigração ilegal nos EUA e logo no primeiro dia de governo assinou ordens para impedir a entrada de imigrantes ilegais.
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*Estagiário sob supervisão da jornalista Dahiana Araújo