Com média de 3,6 mil casos de tuberculose anualmente, Ceará teve o maior número de mortes em 13 anos
Em 6º lugar entre os estados que mais notificam casos de tuberculose, o Estado registrou 3.982 casos novos da doença em 2023
Diretamente relacionada com a pobreza e a exclusão social, a tuberculose acometeu, em média, 3,6 mil pessoas por ano no Ceará entre 2010 e 2023. Em 6º lugar entre os estados que mais notificam casos dea doença, o Estado registrou 3.982 casos novos da doença no ano passado e incidência de 42,2 casos por 100 mil habitantes — dado ainda parcial e sujeito a revisão.
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As informações foram apresentadas pelo secretário executivo de vigilância em saúde da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), Antônio Lima Neto — conhecido como Tanta —, na mesa redonda “Enfrentamento das doenças negligenciadas”, parte da programação do 7º Seminário Estadual de Vigilância em Saúde do Ceará, na terça-feira (27). Na ocasião, o gestor pontuou que o Estado tem um “desafio grande” para atingir a meta determinada pelo Ministério da Saúde.
Além disso, houve 236 mortes causadas pela doença, segundo levantamento do Diário do Nordeste feito a partir do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). Esse é o maior número de óbitos dos últimos 13 anos, quando a mesma quantidade de pessoas morreu devido à doença, em 2011. No ano anterior, em 2010, foram 240. O ano de 2018 também teve registro próximo: foram 232 óbitos.
Em abril de 2023, foi instituído o Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDS). Um dos objetivos é reduzir a incidência da tuberculose para menos de 10 casos por 100 mil habitantes e o número de mortes para menos de 230 óbitos por ano. Essa é uma das metas operacionais de redução e controle propostas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) até 2030.
“Ter metas ambiciosas é bom, mas temos que partir de um momento, e o nosso momento é de transmissão elevada da tuberculose, sobretudo nos grandes centros urbanos brasileiros”, afirma Tanta. No Ceará, a transmissão é mais frequente em Fortaleza e na região metropolitana, além de grandes municípios como Sobral e no triângulo “Crajubar” — Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha.
O secretário explica que a tuberculose é “fundamentalmente uma endemia urbana” e que determinado número de casos é esperado a cada ano, podendo estar “em um limite superior ou em um limite inferior”. Quando se está nesse limite superior, dá-se o nome de hiperendemia — cenário no qual o Ceará se encontra.
Porém, o gestor aponta que “estamos na ressaca pós-pandêmica”. Em 2020 e 2021, os números de novos casos diagnosticados tiveram redução em relação aos anos anteriores. “A pandemia diminuiu porque você passou a não fazer diagnóstico. Então, é um pouco um cenário de que você retornou e agora você está fazendo um diagnóstico que você não faria em um momento mais oportuno”, explicou.
Em entrevista ao Diário do Nordeste, o secretário listou algumas questões que devem ser trabalhadas em relação à tuberculose:
- Detectar o caso precocemente
- Tratá-lo adequadamente
- Fazer a vigilância dos contatos do paciente
- Ter retaguarda assistencial para casos com multirresistência ou de manejo mais difícil
- Realizar o tratamento diretamente observado (TDO) de casos sem complicação na Atenção Básica
TRANSMISSÃO E TRATAMENTO DA TUBERCULOSE
Doença infecciosa causada pelo Mycobacterium tuberculosis — ou bacilo de Koch —, a tuberculose afeta prioritariamente os pulmões, apesar de poder acometer outros órgãos, como rins, ossos, olhos, pleura e meninges. Ela é transmitida por via aérea, por meio da eliminação de aerossóis produzidos pela tosse, fala ou espirro de pessoas com tuberculose ativa (pulmonar ou laríngea) sem tratamento. Não há transmissão por objetos compartilhados, como talheres e copos.
A transmissão da tuberculose é mais lenta do que a de doenças causadas por vírus, como a Covid-19 ou a dengue, e requer um contato longo com a pessoa infectada. Com isso, Tanta destaca que a transmissão normalmente ocorre em casa e que é necessário aumentar o controle dos contatos dos pacientes — ferramenta importante para prevenir o adoecimento e diagnosticar precocemente casos de doença ativa.
A tuberculose tem cura, e o risco de transmissão reduz quando o tratamento é iniciado nos primeiros meses de sintomas. Gratuito e disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), o tratamento dura no mínimo seis meses. Um desafio, porém, é a adesão. Entre os motivos para o tratamento ser interrompido está a melhora dos sintomas, como a enfermeira Argina Maria Bandeira Gondim, fundadora da Associação de Amparo aos Pacientes com Tuberculose (APTU), exemplificou durante o evento da Sesa.
“No primeiro mês, o paciente já não sente mais, já vão desaparecendo os sintomas. Ele já vai ganhando peso, faz a baciloscopia e dá negativo. Então, ele acha que está curado. Por que ele vai passar mais cinco meses tomando um remédio que lhe dá coceira, que lhe dá náusea, que a urina fica vermelha, que tem mil e um problemas se não está sentindo mais nada?”, questiona.
Ela explicou, então, os benefícios do tratamento diretamente observado (TDO). Essa é uma estratégia para a adesão ao tratamento que consiste na observação da ingestão dos medicamentos. Segundo a enfermeira, a convivência com o paciente permite que os profissionais de saúde ofereçam outros serviços necessários — como encaminhamento para prevenção de câncer ou para realizar testes de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) — e facilita o controle dos contatos.
À medida que você vai conversando com ele, todo dia fazendo aquelas rodas de conversa, fazendo terapia de grupo, vai criando uma relação de confiança e o paciente dificilmente interrompe o tratamento. Você orientou que ele precisa tomar um medicamento, senão vai ficar resistente e, ao invés de ser seis meses, o tratamento passa a ser de um ano e seis meses, dois anos, dependendo da resistência que ele adquirir. Quando ele toma essa consciência, e a família também, fica tudo mais fácil para você conseguir eliminar a tuberculose.
Outra dificuldade citada pelo secretário é a repercussão assistencial nos casos mais graves da doença. Isso porque, no caso de paciente bacilífero (que elimina muitos bacilos pela tosse, pelo espirro, pela fala) é preciso fazer um isolamento respiratório.
“Não é simples, não é tão trivial. Imagina uma rede assistencial que já é estrangulada, que já tem vários problemas, porque tem doenças que se sobrepõem. Você tem as agudas, as crônicas, tem os eventos cardiovasculares, os cânceres. Você tem uma série de doenças crônicas que estão incidindo — (com) a população envelhecendo — e, ao mesmo tempo, tem a coexistência com padrões agudos, como essa doença transmissível”, explica.
SINTOMAS DE TUBERCULOSE
- Tosse por três semanas ou mais
- Produção de catarro
- Febre (mais comum ao entardecer)
- Sudorese
- Cansaço
- Dor no peito
- Falta de apetite
- Emagrecimento
PREVENÇÃO DA TUBERCULOSE
O Ministério da Saúde lista três formas de prevenção da tuberculose: a vacinação com BCG, To tatamento da Infecção Latente pelo Mycobacterium tuberculosis (ILTB) e o controle de infecção.
- Vacinação com BCG: Ofertada no SUS, a BCG (bacilo Calmette-Guérin) protege a criança das formas mais graves da tuberculose, como a tuberculose miliar e a tuberculose meníngea. Ela deve ser dada às crianças ao nascer, ou, no máximo, até os quatro anos, 11 meses e 29 dias.
- Tratamento da Infecção Latente pelo Mycobacterium tuberculosis: É uma importante estratégia para evitar o desenvolvimento da tuberculose ativa, especialmente nos contatos domiciliares, nas crianças e nos indivíduos com imunossupressão pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), comorbidades associadas ou uso de alguns medicamentos, entre outras condições.
- Controle de infecção: Adotar medidas como manter ambientes bem ventilados e com entrada de luz solar, proteger a boca com o antebraço ou com um lenço ao tossir e espirrar (higiene da tosse) e evitar aglomerações.
DOENÇAS SOCIALMENTE DETERMINADAS
Doenças socialmente determinadas acometem de forma mais intensa populações em situação de maior vulnerabilidade social. O Governo Federal lançou uma política para eliminar ou reduzir, como problemas de saúde pública, 14 doenças e infecções desse tipo. O Comitê Interministerial para a Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente identificou, ao todo, 175 cidades consideradas prioritárias por possuírem altas cargas de duas ou mais dessas doenças. No Ceará, são quatro municípios: Caucaia, Maracanaú, Sobral e Fortaleza.
“Algumas doenças têm forte vinculação com a moradia. Você tem moradia muito precária, um número muito grande de pessoas por cômodo, dificuldade de acesso às necessidades mais básicas, ao saneamento, à água potável de qualidade, a uma coleta de lixo sistemática, a uma pavimentação adequada. Isso tudo facilita a gênese, a ocorrência de algumas doenças”, explica o secretário executivo de vigilância em saúde da Secretaria da Saúde do Ceará, Antônio Lima Neto.
O programa Brasil Saudável reúne o Ministério da Saúde e outros 13 ministérios para atuar em diversas frentes, com foco em: enfrentamento à fome e à pobreza; ampliação dos direitos humanos e proteção social para populações e territórios prioritários; qualificação de trabalhadores, movimentos sociais e sociedade civil; incentivo à inovação científica e tecnológica para diagnóstico e tratamento e ampliação das ações de infraestrutura e de saneamento básico e ambiental.
Doenças a eliminar enquanto problema de saúde pública
- Doença de Chagas
- Esquistossomose
- Filariose Linfática (Elefantíase)
- Geo-Helmintíase
- Malária
- Oncocercose
- Tracoma
Doenças de transmissão vertical a eliminar enquanto problema de saúde pública
- HIV
- Doença de Chagas
- Hepatite B
- HTLV
- Sífilis
Metas propostas pela OMS e Saúde
- Tuberculose: Reduzir a incidência para menos de 10 casos por 100 mil habitantes e o número de mortes para menos de 230 óbitos por ano.
- Hanseníase: Reduzir a prevalência para menos de 1 caso/10 mil habitantes.
- Hepatites: Diagnosticar 90% das pessoas, tratar 80% das pessoas diagnosticadas, reduzir em 90% as novas infecções e reduzir em 65% a mortalidade.
- Aids: Ter 95% das pessoas vivendo com HIV diagnosticadas, destas 95% em tratamento e das em tratamento 95% com carga viral controlada.