Aniversário de Fortaleza: com 'várias origens', cidade tem as áreas mais antigas que os 297 anos
Espaços da capital cearense tiveram movimentos importantes há mais de 400 anos
Quando nasce uma cidade? Fortaleza tem origem incerta, mas o marco histórico de quando o território foi elevado de povoado à vila, em 13 de abril de 1726, é o fator que define o dia do aniversário, comemorado nesta quinta-feira. Mas, os registros historiográficos da cidade, quanto ao seu próprio “nascimento”, guardam muitas outras perspectivas. Nelas, a existência de áreas como o atual Mucuripe e a Barra do Ceará são concebidos como anteriores ao início “oficial” pelo Centro da cidade.
Considerando a data em que foi elevada à vila, Fortaleza chega aos 297 anos. Mas, a definição se esse marco é o mais legítimo para representar o aniversário da cidade não é um consenso. No decorrer dos anos, tem sido motivo de contestações oficiais, pesquisas, disputas e distintas teses.
A oficialização da data do aniversário é, inclusive, recente: foi estabelecida pela Lei Municipal 7.535, em junho de 1994, ainda na administração do prefeito Antônio Cambraia.
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Quando Fortaleza se tornou vila, em 1976, a vila de Aquiraz (atual cidade da Região Metropolitana) já existia desde 1699. A segunda vila da Capitania do Siará Grande foi criada por ordem por ordem do rei de Portugal. D. Manuel, com o nome de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, pelo capitão-mor Manuel Francês.
Nascimento pelo Mucuripe
Dentre as teses do “nascimento” de Fortaleza, há uma que aponta para o início pela Ponta do Mucuripe. Segundo essa versão, ainda em janeiro de 1500 o espanhol Vicente Yáñez Pinzón navegou pelo litoral brasileiro e atingiu o que seria o atual Mucuripe.
Essa concepção alternativa à oficial, defendida por alguns historiadores, contesta inclusive a narrativa do início do processo de colonização brasileira pelo sul da Bahia, com a chegada em 22 de abril de 1500, das caravelas portuguesas sob o comando de Pedro Álvares Cabral.
O historiador e diplomata brasileiro Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878) foi um dos defensores dessa perspectiva. Na obra “A história geral do Brasil”, de 1854, há referência à Ponta do Mucuripe.
Nessa compreensão, há historiadores que defendem que o ponto de chegada no litoral do Nordeste brasileiro, batizado por Pinzón como Cabo da Santa Maria de La Consolación, ao invés de tratar-se do Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, pode ser, na verdade, a Ponta do Mucuripe, em Fortaleza.
A tese sobre essa chegada de Pinzón ao Mucuripe é defendida no livro “Vicente Pinzón e a Descoberta do Brasil”, do jornalista Rodolfo Espínola. O navegador espanhol dá nome a um dos bairros da capital, situado no lado leste da cidade.
Início pela Barra do Ceará
Outro registro da história da cidade de Fortaleza é a chegada, a partir de 1603, de colonizadores portugueses como Pero Coelho, Padre Francisco Pinto, Luís Figueira e Martim Soares Moreno no território que atualmente é a Barra do Ceará.
Pesquisas sobre esse fato indicam tentativas de ocupar o espaço por onde passa o Rio Ceará e a construção dos fortes de São Tiago e São Sebastião.
Mas, em outro processo de tentativa de adentrar o território brasileiro, os holandeses conquistaram o forte de São Sebastião entre 1637 e 1644 até serem surpreendidos por uma reação indígena. Na época, os povos tradicionais do Ceará, em revide à invação, destruíram o forte e assassinaram os estrangeiros. O histórico está registrado no Acervo Digital de Fortaleza.
“Teve uma década de ocupação dos portugueses e holandeses na Barra, mas depois ninguém mais, porque os indígenas botaram os colonizadores para correr”, explica o professor de História, Mariano Júnior.
Não se chegou a um consenso entre a classe política se a cidade teve origem na Barra do Ceará, com o forte de São Sebastião, ou na Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção. Então, o 13 de abril é o dia em que o povoado de Fortaleza foi oficialmente transformado em vila
Começo pelo Centro
Outra perspectiva é a estruturação do núcleo central de Fortaleza, nas proximidades do Riacho Pajeú, com a construção do Forte Schoonenborch (no atual espaço em que fica a 10ª Região Militar), que começou a ser erguido pelos holandeses, comandados por Matias Beck, em 1649.
Cerca de 5 anos depois, com a derrota em Pernambuco, os holandeses saem do Ceará e os portugueses retomam o processo de colonização no território. O Forte Schoonenborch tem o nome mudado para Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção.
“Na prática, não foi desse jeito: construíram os fortes, mas isso não gerou povoamento. Eram soldados de passagem e a origem mesmo foi o Forte Schoonenborch. Dentro do que hoje chamamos Fortaleza, não tem nenhuma ocupação anterior a essa”, professor de História, Mariano Júnior.
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Dessa forma, o núcleo populacional de Fortaleza cresceu ao redor desse forte e a elevação da vila à cidade ocorreu apenas no dia 17 de março de 1823, por ordem de D. Pedro I.
Como era Fortaleza?
Por vários fatores, a capitania do Siará Grande foi menosprezada. Dentre eles, às secas e correntes marítimas que dificultavam a vinda dos europeus, bem como uma certa resistência indígena ao processo de invasão. O posicionamento estratégico para ocupação de outros espaços que trouxe os colonizadores.
“Por exemplo, quando Pero Coelho de Souza e Martins Soares Moreno passaram por essas terras, estavam indo atacar os franceses. Da Região da Ibiapaba queriam ir ao Maranhão para expulsá-los”, detalha o professor.
Mariano contextualiza que não havia atrativos como cana de açúcar, ouro ou prata. Além disso, o contato com povos tradicionais não foi fácil.
“Conflito com os indígenas, principalmente, na Barra do Ceará que fizeram até alguns contatos amistosos, mas depois isso desandou porque os portugueses, holandeses e franceses queriam explorar a mão de obra dos indígenas”, completa.
As cidades do interior, aliás, tiveram um avanço na ocupação mais intenso devido à criação de animais e plantação de algodão. Com o crescimento do comércio, no entanto, Fortaleza alcançou um protagonismo com a maioridade.
Fortaleza e o Ceará começaram a ganhar corpo econômico, intelectual, de desenvolvimento e de ser referência apenas no século XIX, porque éramos um povoado muito pobre
“Fortaleza superou Aracati, Sobral, Camocim e Icó – o sertão era mais rico por causa da pecuária e do algodão – através do comércio local, de importação e exportação, do Porto do Mucuripe”, conclui.