Protecionismo, exportações e alta no dólar: como a vitória de Trump afeta a economia do Ceará

Estados Unidos, maior parceiro comercial do Ceará, deve ter política favorável ao mercado interno

Escrito por Mariana Lemos , mariana.lemos@svm.com.br
foto do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump
Legenda: Donald Trump, de 78 anos, terá o segundo mandato não consecutivo de um presidente dos Estados Unidos desde 1893
Foto: Jim WATSON / AFP

Com a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, a maior economia mundial terá uma mudança de gestão a partir de 2025. A volta do republicano à Casa Branca tem reflexos na economia em diferentes níveis, impactando o Ceará.

Um possível impacto pode ser a diminuição das exportações cearenses para os EUA, explica o economista Ricardo Eleutério Rocha, membro do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).

Donald Trump é defensor de uma política econômica protecionista, em que são criadas barreiras às importações de outros países para valorizar a indústria nacional. Entre as medidas, está redução de impostos para a empresas locais. 

“Trump sempre rebateu, questionou e criou entraves para o desenvolvimento do livre comércio através dos blocos econômicos. Também questionou a Organização Mundial do Comércio (OMC), que procura estimular o comércio internacional”, comenta o economista. 

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Os Estados Unidos são o país que mais consome a produção cearense. As exportações acumuladas para os EUA em 2024 representam US$ 571 milhões, mais de 48% do total exportado pelo Estado, segundo estudo do Centro Internacional de Negócios do Ceará.

As exportações para o México, o segundo país que mais importa do Ceará, totalizaram US$ 54 milhões, menos de 10% do valor total das exportações aos EUA. 

Os principais produtos cearenses comprados pelos Estados Unidos são ferro e aço, seguido por peixes, crustáceos e calçados. No setor siderúrgico, por exemplo, a produção enviada aos EUA foi avaliada em US$ 420 milhões. 

Ricardo Eleutério explica que, considerando as ações adotadas por Trump em seu mandato anterior, há um clima de preocupação para o setor de ferro e aço. 

“Vale lembrar que o governo Trump criou barreiras para proteger a indústria, com barreiras à entrada de aço proveniente de diversos países. Talvez seja um pouco cedo, mas há uma agenda pré-anunciada da política econômica republicada”, comenta. 

AUMENTO DOS IMPOSTOS DE IMPORTAÇÃO

A Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) projeta que as tarifas de importação nos Estados Unidos deve aumentar entre 10% e 20%, segundo Karina Frota, presidente do Conselho de Relações Internacionais da federação. Na prática, os consumidores estadunidenses terão que pagar mais imposto para importar um produto de outro país.

Esta medida tem como objetivo visível 'proteger' os Estados Unidos principalmente dos produtos procedentes da China, cuja alíquota de importação pode chegar até 60%. Para Donald Trump, as tarifas de importação são usadas como ferramenta política"
Karina Frota
Presidente do Conselho de Relações Internacionais da Fiec

Karina Frota aponta que no primeiro mandato de Trump, as exportações cearenses tiveram um efeito negativo devido à sobretaxa do ferro e do aço. Para esta nova gestão, a política externa do republicano ainda é vista como 'imprevisível'.

Ela ressalta que os Estados Unidos seguem como o principal parceiro comercial do Ceará. “Produtos siderúrgicos, calçados, peixes, frutas e a nossa tradicional cera de carnaúba são alguns dos produtos cearenses que conquistaram o mercado norte-americano”, aponta. 

Já a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio-CE) projeta que a nova gestão republicana deve continuar com uma boa relação econômica com o Brasil. 

“Trump é um liberal por natureza, e eu não acredito que vá ter nenhuma perda de relacionamento e o Brasil vai continuar com uma boa relação com os Estados Unidos”, afirma Luiz Gastão, presidente da Fecomércio do Ceará. 

ALTA DO DÓLAR

Outro efeito econômico que o Brasil deve enfrentar com a nova gestão de Donald Trump é a cotação do dólar em patamares mais altos. Essa é avaliação de Joseph David Barroso Vasconcelos, doutor em Economia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). 

O economista explica que a política protecionista deve diminuir a venda de produtos brasileiros aos EUA, limitando a oferta interna de dólares, que provoca uma pressão interna para elevação do seu valor. 

A moeda estrangeira também deve encarecer devido à promessa do presidente eleito de controle rigoroso da inflação dos Estados Unidos. 

“Essa medida pode levar o governo Trump a pressionar o banco central dos EUA a praticar uma política de juros altos, o que atrairia os dólares que estão em mercados emergentes de volta ao mercado financeiro norte-americano, provocando alta na cotação da moeda em diversos países”, aponta. 

Em uma economia 'dolarizada', a alta na moeda encarece diversos produtos básicos, como trigo, combustível refinado e fertilizantes. Joseph David aponta que a alta de preço nos produtos importados também pode mexer com a taxa de inflação do Brasil.

“O mercado já passou a elevar as suas expectativas de inflação futura, o que pode fazer o Banco Central Brasileiro a reagir com aumento das taxas de juros nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom)”, projeta o economista. 

A vitória de Trump já teve um efeito imediato nas taxas de câmbio. O dólar disparou globalmente, ainda que tenha apresentado queda no Brasil ao fim do dia, e o bitcoin bateu recorde nesta quarta-feira (6). 

A alta imediata é consequência de uma especulação sobre a moeda americana, com base em expectativas do que poderá acontecer quando o republicano tomar posse, segundo Joseph David Barroso Vasconcelos.

"No Brasil, há também um componente interno para a escalada da moeda. O mercado tem colocado em dúvida o sucesso do arcabouço fiscal de equilíbrio das contas públicas prometido pelo ministro da fazenda Fernando Haddad", explica. 

 

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