Lei de proteção aos entregadores representa vínculo empregatício? Entenda
Sancionada no início de janeiro, a Lei nº 14.297 estabelece algumas condições mínimas de trabalho para entregadores de delivery durante a pandemia
Os entregadores de aplicativos de delivery passaram a ter algumas garantias de trabalho garantidas por lei no início deste ano. Sancionada no dia 6 de janeiro, a Lei nº 14.297 prevê medidas de proteção para a classe durante a pandemia.
Uma das medidas mais importantes é a obrigatoriedade que plataformas de delivery como Ifood, Uber Eats e Rappi contratem seguro de vida para os entregadores. Por mais que a mudança estabeleça uma responsabilização da empresa pelo trabalhador, a lei não estabelece um vínculo empregatício entre a plataforma e o entregador.
Veja também
Antes da legislação, não havia qualquer segurança estabelecida por lei definida para os entregadores de aplicativo. As medidas determinadas são válidas apenas durante o período de pandemia determinado pelo Ministério da Saúde.
Vínculo de trabalho
Para o professor e juiz do trabalho Otávio Calvet, a lei dá um passo importante para que os trabalhadores de aplicativo tenham uma proteção mínima para trabalhar. A legislação cria uma solução própria, sem vincular os entregadores à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Agora tem um panorama que reconhece que as empresas de aplicativos são responsáveis pelo entregador. Ela coloca o entregador como sendo um trabalhador dela. A lei não reconhece vínculo de emprego, coloca como sendo um prestador de serviços utilizando a tecnologia
Apesar de ser um avanço, na visão de Calvet, a lei peca ao vincular os direitos dos entregadores ao período de crise sanitária. “Essa lei não dá indicação de que o próximo passo é reconhecer vínculo de emprego. Ela tem um artigo que diz claramente que a disposição dessa lei não segue para nenhum tipo de interpretação de natureza jurídica”, afirma.
Outra crítica é em relação à demora para que a lei tenha sido sancionada, já passados praticamente dois anos desde o início da pandemia no Brasil. O chefe de fiscalização do trabalho no Ceará, Daniel Arêa Leão Barreto, conta que o projeto existe desde 2020.
Quando teve o lockdown os entregadores que faziam esse fornecimento de produtos, eles ajudavam estabelecimentos comerciais se manterem. Foi uma categoria que foi negligenciada por um longo período
Proteção aos entregadores
A lei traz obrigações tanto para as plataformas de delivery como para os restaurantes usuários. Para os restaurantes, passa a ser obrigatório disponibilizar aos entregadores água potável e permitir o uso de instalações sanitárias durante o serviço.
“Não havia nenhuma obrigatoriedade de garantir nenhuma segurança mínima aos entregadores. Se agora está na lei, é porque tinha muitas empresas negando esse direito básico”, chama atenção Daniel Arêa.
As plataformas passam a ter algumas obrigações para com os entregadores no período da pandemia:
- Contratar seguro de vida sem carência para cobrir o entregador no caso de acidentes durante o trabalho. Caso o entregador trabalhe para mais de um aplicativo, quem realiza a cobertura é a empresa para o qual ele estava trabalhando no momento do acidente.
- Oferecer assistência financeira durante 15 dias para entregadores que contraírem Covid-19, podendo o tempo ser estendido por mais dois períodos de 15 dias. O valor a ser pago deve ser uma média do apurado pelo trabalhador nos últimos três meses antes de contrair a doença. Para conseguir a assistência, o entregador deve entregar laudo médico.
- Fornecer máscaras e álcool em gel para os entregadores ou possibilitar reembolso caso o trabalhador compre por conta própria.
- Avisar com antecedência de 3 dias uma possível exclusão do colaborador da plataforma. Também é necessária uma justificativa para quebrar esse vínculo.
A lei não estabelece um prazo de adaptação às novas normas. O não seguimento do estabelecido implica em advertência e multa de R$ 5.000 por infração no caso de reincidência.
Conforme Daniel Arêa, o entregador pode denunciar por meio da Superintendência Regional do Trabalho, seja de forma presencial ou por meio do Whatsapp (85)3878-3217 ou no e-mail fiscalizacao.ce@tem.gov.br.
Empresas
Em nota, o Rappi apoiou a medida que traz melhor condições de trabalho para os entregadores parceiros. Segundo a empresa, todas as determinações da lei já eram cumpridas pela Rappi antes mesmo de ela ser estabelecida.
“A empresa é compromissada com o contínuo cuidado com os entregadores parceiros, e continuará aperfeiçoando sua operação em benefício deles”, afirma.
O Ifood informou em nota que as garantias apresentadas pela lei “são conquistas dos entregadores e também estão em linha com o empenho e a dedicação do iFood anos para garantir melhores condições de trabalho e oportunidades de ganhos para os entregadores parceiros da plataforma”
A empresa reforçou que a necessidade de uma regulação que ampare novos modelos de trabalho e assegure direitos aos profissionais, tais como a seguridade social.
“É importante lembrar que o contexto da nova economia presume maior flexibilidade para os entregadores atuarem em diferentes plataformas e com agenda própria de trabalho, escolhendo os dias e horários em que desejam trabalhar. Nesse contexto, a Lei 14.297/2022 (antigo PL 1665/20) é um excelente primeiro passo”, destaca.
A nota acrescenta que os entregadores do Ifood contam desde 2019 com seguro de acidente e seguro de vida no caso de infecção por Covid-19.