Empresas do Ceará incorporam práticas ESG com uso de energia solar, cursos e lixo reciclado

Práticas transformam negócios do litoral cearense e atraem públicos interessados em turismo sustentável

Escrito por Luciano Rodrigues , luciano.rodrigues@svm.com.br
Foto que contém Jaguaribe Lodge & Kite
Legenda: Pequenas e médias empresas no litoral do Ceará adotam ESG como cartilha de desenvolvimento
Foto: Ismael Soares


A paisagem nas praias do Ceará apresenta muitas diferenças nos últimos anos. As mudanças em barracas de praia e hotéis buscam maior sustentabilidade em consonância com as práticas ESG (traduzido para Ambiental, Social e Governamental) que regem as políticas comerciais e empresariais de hoje.

Na quarta reportagem do especial “Economia do Mar”, o destaque fica pelas boas práticas ambientais e sociais de pequenas e médias empresas no Ceará no relacionamento com o mar, alicerçados pelas mudanças nos negócios para a manutenção do meio ambiente.

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O especial multimídia integra o projeto Praia é Vida, promovido pelo Sistema Verdes Mares com foco na valorização e na sustentabilidade desse meio indispensável para múltiplas formas de vida.

Diferentemente de grandes empresas, cujo setor de ESG é um departamento estabelecido e delimitado, no caso da maioria das pequenas e médias empresas, isso não acontece. As ações que permeiam a sigla são dissolvidas na própria cultura dos empreendimentos, em todos os segmentos.

Desde 2004, quando foi cunhado pela primeira vez, o termo ESG veio ganhando terreno, se consolidando principalmente no lugar do desenvolvimento sustentável. Para negócios menores, essas ações já fazem parte do dia a dia desde a fundação.

BARRACAS DE PRAIA ENTRAM NA ONDA

Esqueça as tradicionais cadeiras de plástico, garrafas e canudos do mesmo material. Na Praia do Futuro, em Fortaleza, apesar de esses produtos ainda dominarem a paisagem, um novo formato vem ganhando terreno no tradicional bairro turístico: os chamados beach clubs, que mostram um olhar ainda mais voltado para a sustentabilidade.

Inaugurado em 2021, o Orla Praia Club é um dos empreendimentos a adotar o novo conceito. Além da mudança do perfil dos frequentadores, todo o negócio é pensado com as bases do ESG, potencializando o turismo ecologicamente correto.

Foto que contém Thiago Miranda
Legenda: Thiago Miranda, sócio do Orla Praia Club
Foto: Thiago Gadelha

Nasci e me criei na Praia do Futuro. A gente sempre teve essa relação de cuidado, a praia acaba se tornando o quintal de casa, então isso vai se colocando para o dia a dia das nossas empresas, dentro do nosso círculo de amizade. Se você for olhar a estrutura do Orla, você vê poucas edificações dentro do conceito que se tem hoje de estruturas e empreendimentos na praia. A gente usou muita madeira, bambu, são coisas móveis para que a gente tenha esse equilíbrio entre estrutura e aquela leveza de praia. 
Thiago Miranda
Sócio do Orla Praia Club

Além de ser um dos sócios do beach club, Thiago Miranda é ainda surfista na Praia do Futuro. O negócio, que anteriormente era uma barraca de praia da família do empreendedor, acabou adotando o novo conceito, com as práticas ESG em todas as áreas.

“O Orla está trazendo muito conceito ESG. Dentro do quesito ambiental, a gente está com o projeto de Orla rumo ao lixo zero. Hoje a gente consegue reciclar 85% do nosso resíduo gerado, não vai para o aterro sanitário, vai para um destino onde ele é reciclado. Se você for olhar, nos guarda-sóis da praia do Orla, todos têm uma lixeirinha, facilitando com que naquele momento você vá almoçar e abra o guardanapo, que ele não voe, vá para o mar, chegue na barriga de um peixe, a gente come e está aí o ciclo do plástico se fazendo a cada dia”, reflete.

Foto que contém Orla Praia Club
Legenda: Guarda-sóis do Orla Praia Club contêm lixeiras para evitar que o lixo se espalhe pelas areias da praia
Foto: Thiago Gadelha

O ciclo da sustentabilidade também vai direto ao encontro da economia. Com o lixo produzido em maior escala pelas empresas, Thiago Miranda pondera que os resíduos estão muito longe de serem apenas materiais descartáveis, e sim uma oportunidade para um novo negócio.

“A gente sempre entendeu que o nosso resíduo era um lixo, na verdade ele nem é um resíduo e nem um lixo, mas sim um recurso. Então a gente vai fomentar a economia, porque aquilo dali é mais um produto que está entrando na economia A gente está vendo empresas hoje gigantescas, que trabalham hoje com os recursos jogados fora de outras empresas. Desses 85% (que são reciclados), de 30% a 35% são cocos. Eu não tenho essa empresa atuante ainda próximo, a logística para fazer com que vire um produto ainda é alta, mas tenho certeza que daqui a um tempo ela vai ser bem baixa porque vai se instalar uma empresa aqui e começar a reciclar o coco”, diz.

85%
De todo o lixo produzido no Orla Praia Club é reciclado, segundo o sócio do empreendimento

PARA ALÉM DO AMBIENTAL

Não são somente as questões voltadas à sustentabilidade que chamam à atenção dos sócios do Orla Praia Club. Através da Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPF), Thiago Miranda enumera que “diversos cursos de capacitação, desde bases de cozinha, lideranças de equipe, gestão de bares e restaurantes, eficiência e limpeza” são realizados com moradores do entorno do bairro.

“Isso está proporcionando que a gente construa cada vez mais uma carreira para essas pessoas que estão aqui na praia, que fazem parte dessa economia e que começam a ter uma visão de crescimento. A gente hoje consegue perceber que o garçom que vem trabalhar hoje num empreendimento na praia consegue enxergar que ele pode evoluir e pode crescer através dos conhecimentos que a gente consegue abrir portas”, enfatiza.

Foto que contém Orla Praia Club
Legenda: Materiais sustentáveis fazem parte da construção do Orla Praia Club
Foto: Thiago Gadelha

Thiago Miranda completa pontuando que é preciso estender para além da diretoria dos pequenos e médios negócios as práticas ESG.

"Hoje as empresas têm colaboradores, porque uma empresa não anda mais só. Todo mundo tem que entender que o movimento que o meu atendente fez aqui vai mexer lá no financeiro ou no RH da minha empresa, que pode gerar no setor de compras e por aí vai.”

No quesito governamental, o sócio do Orla Praia Club ressalta a atuação da Agência de Desenvolvimento da Economia do Mar de Fortaleza (Ademfor), órgão da Prefeitura da capital criado em junho deste ano que prevê uma atuação conjunta em busca do ordenamento urbano de toda a faixa de praia da cidade.

“A praia é uma extensão da casa do surfista, então quando a gente está na nossa adolescência, a gente tinha um pouco mais de tempo, eram quatro, cinco horas diretas dentro do mar. Você acaba querendo cuidar daquilo ali, você acaba tendo um relacionamento com o ambiente e você vai buscando coisas que agregam valor no sentido de melhoria da praia”, analisa o sócio do beach club.

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PARAÍSO SUSPENSO

A 140 km de Fortaleza, a agitação da capital dá lugar à calmaria da foz do Rio Jaguaribe. O curso fluvial encontra o mar em Pontal de Maceió, em Fortim, no litoral leste do Estado, em paisagem que mistura natureza praticamente intocada e empreendimentos sustentáveis.

Na margem esquerda da foz do rio, está instalado o Jaguaribe Lodge & Kite. Inaugurado em 2017, foi o segundo hotel do Grupo JMC, que ainda conta com o Vila Selvagem, aberto em 2009, e o Jaguaríndia Village, de 2021.

Foto que contém Jaguaribe Lodge & Kite
Legenda: Estadia no Jaguaribe Lodge & Kite ocorre dentro de bangalôs à beira-mar
Foto: Ismael Soares

Diferentemente dos outros dois empreendimentos hoteleiros do mesmo grupo no Pontal de Maceió, o Jaguaribe Lodge & Kite se destaca pelo cuidado ainda maior com as práticas de ESG.

Pela localização do hotel, antes da construção, havia dunas e vegetação costeira e nativa, que foram fielmente mantidas, como explica Celian Chaufour, sócio do local.

"A gente não tem mais nenhum plástico, nem canudo, nem garrafa, começamos a colocar painéis solares. Quando falamos de ESG, para a gente, é muito importante. 100% dos nossos funcionários são de Pontal, foram formados. É um orgulho que nós temos. Não somente os funcionários, mas todos os produtos que usamos na nossa culinária são de fornecedores locais.", aponta.

Tentamos preservar ao máximo o meio ambiente. Quando fizemos esses bangalôs em palafitas, a gente tentou ter um ar ambiente abundante, fazendo todas as construções adequadas para receber o vento dentro do quarto para não necessitar de ar-condicionado. A gente continuou nessa linha e fez passarelas para não andar nas dunas para chegar nos bangalôs, para preservar dunas, vegetações e ninhos de pássaros. 
Celian Chaufour
Sócio do Jaguaribe Lodge & Kite

Foto que contém Celian Chaufour
Legenda: Celian Chaufour, sócio do Jaguaribe Lodge & Kite
Foto: Ismael Soares

INTEGRAÇÃO COM O AMBIENTE

Nascido em Paris, na França, Celian chegou a Fortim em 2008 e conta que se estabeleceu em Pontal de Maceió pela tranquilidade do local, entrecortado pelos rios Jaguaribe e Pirangi, com menor trânsito de carros e turistas.

"Depois do sucesso do Vila Selvagem, a gente pensou em ter uma outra orientação de hotelaria e tentar atingir um outro tipo de cliente. O fato é que o mundo inteiro está focalizado na preservação, foi esse um dos fatores para a gente focalizar em hotel sustentável", avalia o empresário francês.

A estrutura do Jaguaribe Lodge & Kite conta com 23 bangalôs, todos suspensos por palafitas, com abundância no uso de madeira de reflorestamento e de palha de carnaúba, vegetação nativa.

Com exceção da cozinha exclusiva do hotel e de um cômodo da administração, todo o empreendimento é feito utilizando materiais sustentáveis, incluindo a energia elétrica. Cerca de 90% de toda a eletricidade consumida no local vem de painéis fotovoltaicos, instalados acima do estacionamento do local.

Foto que contém o estacionamento Jaguaribe Lodge & Kite
Legenda: Estacionamento do Jaguaribe Lodge & Kite tem painéis solares como principal gerador de eletricidade para o hotel
Foto: Ismael Soares

"A duna fica viva, circula embaixo dessas palafitas, embaixo dessas passarelas e tudo não impede também a vegetação de crescer. Quando a gente fez com palafitas, fez para não atrapalhar o meio ambiente", destaca Celian Chaufour.

90%
Da energia consumida no Jaguaribe Lodge & Kite vem de painéis fotovoltaicos

O empreendimento aproveita ainda os fortes ventos do litoral leste para potencializar o kitesurfe, atualmente um dos principais esportes praticados em águas cearenses. Além do hotel, há ainda uma escola da modalidade para hóspedes e público em geral.

"Você vai viver uma experiência perto da natureza. Tudo isso, para mim, faz o meio ambiente no centro de tudo, vai fazer você voltar. Uma vida é uma experiência nova. Você acorda com o barulho do mar, dorme com o pôr do Sol no mar, veleja em direção ao mar, enfim, toda essa natureza e energia que o mar nos traz", finaliza o empresário.

Foto que contém a vista do Jaguaribe Lodge & Kite
Legenda: Jaguaribe Lodge & Kite fica instalado na foz do Rio Jaguaribe em Pontal de Maceió, Fortim

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