Como o aumento das importações de calçados no Brasil pode afetar o mercado no Ceará?

Situação no mercado nacional pode reverberar no Estado, a depender das medidas para contornar a crise

Escrito por Bruna Damasceno , bruna.damasceno@svm.com.br
fábrica de calçados da grendene
Legenda: Parque calçadista cearense teve a competitividade abalada, em períodos recentes
Foto: Rayane Oliveira/Fiec

O fechamento das fábricas da Paquetá, no Ceará, expõe a perda da competitividade da indústria calçadista nacional. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), um fator que tem gerado ainda mais preocupação para o setor é o aumento das importações no comércio asiático, impactando o mercado local. 

Conforme dados da entidade, em novembro, as compras de calçados do Vietnã, Indonésia e China tiveram incremento de 38% em receita e de 10% em volume, alcançando US$ 29,43 milhões e 1,44 milhão de pares. Já no acumulado do ano, essa importações cresceram 26,6% e 11,5%, respectivamente, somando US$ 327 milhões e 22 milhões de pares. 

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Diferentemente desse cenário nacional, no Ceará, a situação ainda não é preocupante, mas demanda alerta. De janeiro a novembro deste ano, o Estado importou US$ 6,6 milhões em calçados, polainas, artefatos semelhantes e suas partes. Desse total, a maior fatia veio da China (US$ 4 milhões) e do Vietnã (US$ 3,6 milhões).

Por outro lado, no mesmo período, o Ceará exportou US$ 249 milhões, conforme estatística do Comex Stat, plataforma do Ministério da Indústria, Comércio e Relações Exteriores.

Conforme o economista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ricardo Coimbra, a competitividade no segmento está intensa, “tanto que o setor vem solicitando ao governo federal mecanismos de proteção” por meio do aumento da tributação. 

Para o consumidor final, é interessante essa competição para conseguir comprar os produtos mais baratos, mas, para o setor produtivo, muitas vezes, gera uma potencialidade de redução significativa da lucratividade dos parques produtivos”, avalia. 
Ricardo Coimbra
Economista e professor da Unifor

“Em alguns momentos, isso acaba gerando prejuízo e fazendo algumas dessas plantas produtivas se tornarem inviáveis, como o caso recente da Paquetá”, diz, enfatizando que o governo deve observar essas movimentações e avaliar a necessidade de proteger o segmento. Para o economista, algumas medidas podem reduzir o impacto no setor. 

Como fica o Ceará nesse contexto?

Conforme o economista, o parque calçadista cearense teve a competitividade abalada, em períodos recentes, devido à fabricação de itens de baixo valor agregado. “Esses produtos têm um custo de produção menor e uma possibilidade de competição com as indústrias do mercado asiático, influenciando sobre essa capacidade competitiva dessas empresas”, aponta. 

Para Coimbra, esse quadro pode se reverter, considerando que hoje o volume de exportação é muito mais significativo. No entanto, ao longo do tempo, os efeitos podem ser maiores.

O impacto seria na geração de emprego e renda de movimentação das cadeias produtivas econômicas no estado”, frisa. 
Ricardo Coimbra
Economista e professor da Unifor

“Isso já está impactando o setor industrial, então, se há o fechamento de empresas, já é um alerta. Isso serve de observação e de acompanhamento para tentar identificar como evitar o impacto em outras empresas e qual o mecanismo para fazer essa unidade produtiva que foi fechada reabrir com mais competitividade, se isso é possível ainda”, completa.

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A gerente do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Estado (Fiec), Karina Frota, relembra que, em alguns momentos, na série histórica, o Ceará já chegou a ocupar a primeira posição, principalmente no número de pares exportados.

“No ranking das exportações do Estado, o setor ocupa a segunda posição, atrás apenas dos produtos siderúrgicos. Os principais mercados de destino são Argentina e Estados Unidos. A queda nas exportações resulta de fatores macroeconômicos”, analisa. 

“Lembro que, no ano passado, tivemos um resultado excelente, com incremento de quase 30%. Em 2023, a China retornou ao mercado e a normalização dos preços dos fretes. Na contramão do Brasil, as importações de partes de calçados do Ceará apresentaram queda. Os principais mercados de origem dessas importações são países asiáticos”, pondera.

Em 2022, de janeiro a novembro, as importações somaram US$ 8,5 milhões, enquanto, no mesmo período deste ano, as compras totalizaram US$ 6,6 milhões, segundo a Comex Stat

Karina ressalta, no entanto, que um ponto de atenção são as importações brasileiras, pois a isenção de impostos para as remessas de plataformas cross border (transporte de itens de outros países, como Shein e Shoppe) em produtos até US$ 50 fez essa importação aumentar. “A projeção para 2023 é termos uma exportação um pouco inferior ao ano anterior”, projeta Karina.

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Segundo a Abicalçados, se o benefício fiscal for mantido, o setor deve perder 30 mil empregos nos próximos anos. O presidente-executivo da entidade, Haroldo Ferreira, destaca que somente as importações provenientes de Vietnã, Indonésia e China, as três principais origens do calçado comprado pelo Brasil, representam mais de 80% do total importado, em receita.

"A indústria calçadista brasileira emprega, aproximadamente, 300 mil pessoas de forma direta. Se somarmos a cadeia produtiva como um todo, de forma direta e indireta, esse número ultrapassa 1 milhão de empregos. O impacto da concorrência desleal das importações já vem sendo sentido pela indústria nacional e vai causar uma onda de desemprego no País", afirma.

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