Com quase 50% das despesas com servidor, desafio do CE é controlar gasto em ano de reajuste salarial
Monitor fiscal do Tribunal de Contas do Ceará (TCE) aponta quais as perspectivas para 2022 com despesas e receitas
Quase metade das despesas (46%) do governo estadual foi de gasto com pessoal em 2021, totalizando R$ 10,878 bilhões até outubro daquele ano. Apesar desta fatia robusta do orçamento, o Ceará conseguiu respeitar as metas fiscais estabelecidas pela legislação. No entanto, esse será o desafio para 2022.
O levantamento foi elaborado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) a partir de dados do Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) e divulgado com exclusividade ao Diário do Nordeste. O período abrange somente o apurado até o quinto bimestre de 2021.
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A estimativa é que, ao longo de 2021, o valor geral tenha sido de R$ 13,348 bilhões. Se confirmado, apesar da contratação de profissionais para atuar na linha de frente de combate à pandemia, houve sutil elevação (0,73%) com gastos de pessoal ante 2020, quando a folha de pagamento dos servidores estaduais ficou em R$ 13,250 bilhões.
Para a pesquisadora do Projeto Monitor Fiscal e docente do Instituto Federal do Ceará (IFCE), Sarah Mesquita, os resultados evidenciam que a atualização das tabelas remuneratórias e subsídios dos funcionários públicos estaduais não comprometem o atendimento aos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e pela Emenda Constitucional 109 (EC 109).
A LRF estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. Já a EC 109, criada em 2021, impôs medidas de controle do crescimento das despesas obrigatórias permanentes.
“É importante destacar que as análises não consideraram novas contratações e/ou progressões em carreiras”, pondera Sarah. Neste ano, foi regulamentado o reajuste de 10,74% a todos os servidores estaduais, sendo metade pago em janeiro e o restante a partir de maio.
Reajuste acima da inflação
O percentual considerou a reposição inflacionária. E, embora tenha sido um pouco superior à inflação do ano anterior (10,06%), deve-se considerar que a remuneração de servidores estava congelada em razão da Covid-19, conforme determinava a Lei Complementar nº 173, do Governo Federal.
A presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), Silvana Parente, pondera que o reajuste apenas acompanha e atualiza o poder de compra, devido à alta da inflação, e não deve afetar o equilíbrio fiscal do estado.
Só acompanhou o poder de compra perdido nos últimos anos, é uma decisão que não afeta em nada no nosso equilíbrio fiscal. O Ceará controla e tem um bom funcionamento. Ao final do ano, o esperado é que voltemos aos patamares normais, não tem nenhum alarde, pelo contrário, o reajuste é fruto desse equilíbrio fiscal do Estado".
O professor do Departamento de Contabilidade da Universidade Federal do Ceará (UFC), Roberto Sérgio do Nascimento, acrescenta que o impacto do reajuste será praticamente nulo. "As variações são bem pequenas, essa correção que foi dada, eu como gestor daria tranquilamente".
Receita x Despesa
Na carta de conjuntura macrofiscal elaborada pela TCE, pesquisadores avaliam que os reajustes dos salários e subsídios dos servidores podem aumentar o comprometimento da Receita Corrente (recursos arrecadados) com Despesa Corrente (gastos de manutenção e funcionamento dos serviços públicos).
Nesse contexto, há uma previsão de que o Ceará extrapole o limite de 95%, previsto para despesa com pessoal e encargos sociais, atingindo o patamar de 97,86% no 5º bimestre deste ano. Um fator que poderá contribuir é o pagamento de 13º salário ao funcionalismo público.
Por isso, o professor da UFC acrescenta que, nesta circunstância, o Estado terá de ter cautela, já que a arrecadação prevista pode não se concretizar com a nova onda de Covid-19, podendo afetar tanto as receitas quanto as despesas.
"Se amanhã a arrecadação aumentar e toda a despesa diminuir, toda essa projeção cai por terra, porque teríamos uma situação confortável".
Segundo Nascimento, nesta ponderação, são considerados todos os gastos (despesas com segurança, materiais, terceirizados) e todas as receitas.
Se todos esses outros insumos tiverem alguma variação, eles que vão pressionar o orçamento, não a despesa com o pessoal. O que o gestor pode fazer é aumentar a receita ou diminuir a despesa, mas, no atual cenário, as duas possibilidades são difíceis".
Essa elevação, contudo, poderá ser amainada nos dois meses seguintes diante da recuperação da arrecadação tributária.
Com isso, conforme a presidente do Corecon-CE, se a arrecadação não se concretizar será necessário reduzir despesas correntes, mas não necessariamente as de pessoal. "Esse reajuste não afeta em nada o equilíbrio fiscal do estado, muito pelo contrário. O Ceará tem folga tanto pra investir quanto pra se endividar", diz.
Monitoramento é crucial
Salienta-se a importância do constante monitoramento das contas governamentais, que é o objetivo principal do Projeto Monitor Fiscal, desenvolvido por diversos especialistas de diferentes áreas do conhecimento em parceria com o Núcleo de Pesquisa do TCE-CE e com financiamento da Funcap, por meio do programa Cientista Chefe”.
O Diário do Nordeste procurou a Secretaria do Planejamento e Gestão (Seplag) para saber quais medidas foram adotadas para cumprir as metas estabelecidas pela LRF neste ano, mas não obteve respostas até a publicação desta matéria.