Anatel alega riscos e firma posição contra construção da usina de dessalinização na Praia do Futuro
Conforme a agência, a usina pode por em risco a operação e a expansão de sistemas de cabos submarinos no local, o que afetaria a Internet no País
Após impasse com as empresas do setor, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) emitiu, nessa sexta-feira (15), novo parecer contrário à instalação da usina de dessalinização na Praia do Futuro, em Fortaleza.
O parecer da agência é resultado de uma nova análise feita após a Companhia de Água e Esgoto (Cagece) reformular o projeto, afastando a Dessal cerca de 500 metros do previsto anteriormente.
No documento, a Anatel "decide por reiterar a oposição à obra de construção da usina nos termos do atual projeto, e a recomendação de alteração de projeto de construção para outro local dentre aquelas opções avaliadas como possíveis à época do Edital".
Conforme o órgão, a usina pode por em risco a operação e a expansão de sistemas de cabos submarinos no local.
Apesar da análise da Anatel, recentemente, o presidente da Cagece, Neuri Freitas, informou aguardar apenas o aval do Superintendência do Patrimônio da União (SPU) para iniciar as obras do equipamento no 1º trimestre de 2024.
Com o custo adicional de cerca de R$ 40 milhões ao plano original, o projeto já havia sido alterado para pôr fim ao imbróglio, ampliando a distância da fiação, que antes era de 50 metros.
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Em nota, a Cagece afirmou a manutenção do projeto e disse que sempre conduziu o processo de forma responsável, com total compromisso com a transparência e ampla divulgação de todas as etapas nos meios de comunicação oficiais, imprensa e demais instrumentos de participação democrática.
“As empresas de internet nunca manifestaram interesse em participar das consultas e audiências públicas realizadas. Além disso, cabe ressaltar que esse processo sempre levou em consideração toda a legislação pertinente, buscando sempre as orientações e deliberações emitidas por órgãos competentes", comunicou.
Teles alegam risco para o funcionamento da Internet
O impasse ocorre porque empresas de telecomunicações afirmam haver chances de impactos no hub de cabos de fibra óptica, cujo funcionamento leva conectividade para a África, Europa, América do Norte, América Central e América do Sul.
A alegação é de que, uma vez em funcionamento, a Dessal possa por em risco o funcionamento da Internet no País.
No relatório, no entanto, a Anatel diz que “a distância de 500 metros está associada a área que abrange os 16 cabos, mas não é, sem análises complementares, suficiente para afastar os riscos de erosão e perturbação da sedimentação do fundo do mar que podem ser causados pela implantação das tubulações do emissário e captação”.
“Resta evidente ainda estar pendente a realização de estudos de mecânica dos fluídos na região, como solicitado pelo setor de telecomunicações há mais de um ano e meio”, diz o informe.
Usina deve ser instalada em novo local, afirma Anatel
No documento, o órgão que representa as teles reitera a recomendação de um novo local para a usina operar. Contudo, anteriormente, Neuri já destacado sobre a inviabilidade econômica desse mudança.
Conforme a Cagece, se o equipamento fosse para o Cumbuco, o valor subiria para R$ 720,1 milhões, enquanto na Sabiaguaba ficaria em R$ 656 milhões.
O Diário do Nordeste questionou, por e-mail, se a Anatel buscou diálogo com a Cagece após a recomendação e aguarda retorno das duas instituições. Quando as repostas forem enviadas, essa matéria será atualiza.
Em reposta, Cagece afirma que o projeto não mudará de lugar
Em resposta à nota da Anatel, a Cagece informou que o cronograma de construção da planta de dessalinização permanece inalterado. “O início das obras ocorrerá após a emissão da licença de instalação da mesma e está previsto para julho de 2024”, projetou.
A companhia destacou, ainda, que o encerramento do grupo de trabalho, criado para a busca de uma solução consensual sobre a obra, bem como o parecer contrário à construção do equipamento, “demonstram, mais uma vez, o desinteresse das empresas de telefonia pela segurança hídrica da população do Ceará”.
Segundo a Cagece, a instituição foi comunicada sobre o encerramento das atividades do grupo pela Anatel. “O encerramento foi motivado pela falta de interesse das empresas de telefonia na continuidade dos trabalhos, se recusando a entrar em consenso com a Cagece”.
Cagece reafirma não haver risco para a internet
Para a Cagece, as infraestruturas da Dessal do Ceará não apresentam nenhum risco para o funcionamento dos cabos submarinos de internet que operam na orla da Praia do Futuro. “Essa afirmação está embasada e demonstrada tecnicamente em estudos divulgados amplamente pela Cagece durante todo o processo de discussão desse projeto, que teve início em 2017”, destacou.
A instituição explica que a estrutura de captação de água-marinha encontra-se a 567 metros de distância dos cabos submarinos, distância maior que a recomendação do Internacional Cable Protection Committee (ICPC), órgão que atua na proteção de cabos submarinos e de infraestruturas subaquáticas no mundo todo.
“Essa distância não é respeitada nem mesmo pelas próprias empresas de telefonia e internet que possuem cabos submarinos na orla de Fortaleza. Inclusive, hoje existe cruzamento entre cabos submarinos dessas próprias empresas”, afirma a Cagece.
Em relação à parte terrestre, conforme o órgão, atualmente diversas outras estruturas, de diferentes serviços, já cruzam as redes das empresas de telefonia e internet. Hoje, na área terrestre de Fortaleza, existem 1.204 pontos de cruzamento entre redes da Cagece e das empresas de internet.
“Além disso, 285 pontos de cruzamento entre redes de gás e internet e outros 85 pontos de cruzamento com redes de drenagem da Prefeitura de Fortaleza, sem nunca ter havido nenhuma interferência ao funcionamento dos serviços das telefônicas. Atualmente, todas coexistem e funcionam normalmente”, informou. Por fim, o órgão frisou a importância do equipamento diante da ameça de seca no Estado.
“Para a Cagece, o cenário construído por meio de um discurso que não possui sustentação técnica, exige também uma reflexão crítica sobre os reais interesses dessas empresas. Ao que parece, elas querem privatizar a Praia do Futuro, formando uma reserva de mercado, em nome de um lucro futuro, com pouca preocupação com o social. Por fim, nunca é demais lembrar que os interesses privados jamais poderão estar acima dos interesses públicos, ainda mais quando se trata de acesso à água em um estado Semiárido e diante de mais um ciclo crítico de escassez hídrica que se anuncia", disse.