Aliada a microcrédito, agroindústria impulsiona o desenvolvimento de pequenas empresas no Ceará

Especialistas ressaltam que setor primário propicia o desenvolvimento dos demais setores produtivos da economia

Escrito por Carolina Mesquita , carolina.mesquita@svm.com.br
Legenda: Produção de leite e derivados movimenta cadeia com centenas de beneficiados nos municípios que compõe a bacia leiteira do Estado.
Foto: Fabiane de Paula

O agronegócio é setor produtivo importante para o desenvolvimento do Ceará e de todo o Brasil. Entre julho e agosto de 2021, dado mais recente disponível, o Estado tinha 332 mil pessoas atuando na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).  

Para além dos empregos diretos gerados, o segmento também produz desenvolvimento de forma indireta, impulsionando fornecedores das mais diversas naturezas e alimentando atividades industriais e de serviços que dependem do agro.

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Produzindo demanda, a agroindústria do Ceará, aliada ao microcrédito, vem se demonstrando como fonte importante de desenvolvimento local, especialmente para os pequenos negócios. O secretário executivo do Agronegócio do Ceará, Silvio Carlos, ressalta que o agronegócio vai muito além da fazenda em si. 

"Quando a gente fala em agronegócio, só pensamos na fazenda, mas ele vai desde antes da fazenda, com a cadeia de insumos, fertilizantes, infraestrutura, mecanização, fornecedores em geral. E depois da fazenda tem a agroindústria", afirma. 

Carlos ressalta que qualquer ação sofrida pelo agro reverbera em todos os elos da economia, chegando, inclusive, ao consumidor e no custo de vida das famílias. A importância é vigente mesmo no Ceará, onde o setor representa apenas 1% da produção agrícola brasileira, e especialmente no Interior, onde os demais setores produtivos costumam ser pouco desenvolvidos. 

O agro no Ceará tem grande importância, porque ele possibilita o desenvolvimento dos municípios no meio rural. Quando o município tem pouca agricultura e pecuária, a população fica sempre em dificuldade e vive da prefeitura, do funcionamento público. Então, tem esse valor social que é fundamental pro desenvolvimento do Interior de cada estado. O agro funciona como fonte de desenvolvimento regional"
Silvio Carlos
Secretário executivo do Agronegócio do Ceará
 

O secretário lembra que em países da Europa, por exemplo, os governos estimulam a produção no campo e que mais pessoas se instalem no meio rural, promovendo um desenvolvimento que permite uma qualidade de vida satisfatória mesmo distante dos grandes centros.

A invasão da tecnologia na produção agropecuária tem facilitado esse movimento, já que os filhos dos agricultores, que antes mudavam para os grandes centros urbanos sempre que tinham oportunidade, agora estão preferindo ficar no campo, onde dão continuidade ao trabalho dos pais, com uma gestão mais eficiente e com o uso de tecnologias diversas. 

"Da mesma fora, a gente vê o campo mais desenvolvido indo pra cidade. Em fazendas urbanas, verticais, várias empresas produzem vegetais, hortaliças em ambientes fechados com alta tecnologia e sustentabilidade", pontua.

Legenda: Agroindústria necessita de acesso a crédito para se desenvolver.
Foto: Fabiane de Paula

Acesso a crédito

Para que esse desenvolvimento aconteça, no entanto, em especial entre os pequenos negócios, o acesso a crédito é fundamental. Carlos ressalta a evolução da disponibilização de recursos para o campo ao longo dos últimos anos, sobretudo pelas instituições financeiras públicas, como o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco do Brasil (BB). 

O primeiro, por exemplo, destinou mais de R$ 8 bilhões do Fundo Constitucional de Financiamento (FNE) à agricultura em 2022, sendo a segunda atividade a receber mais recursos, atrás somente da infraestrutura (R$ 11 bilhões). 

Apesar dos avanços, o secretário indica que ainda há espaço para que o mercado financeiro atenda melhor as necessidades do agro. Segundo ele, o advento de culturas agropecuárias não tradicionais e com particularidades está deixando uma parcela de produtores desassistidos. 

Outro gargalo seria o tempo de avaliação das propostas. Carlos alerta ser insustentável o agronegócio, que muitas vezes possui janelas sazonais para agir, ficar esperando durante meses pela liberação dos recursos necessários. 

O professor do programa de pós-graduação em Economia Rural da Universidade Federal do Ceará, Francisco José Tabosa, reitera que o agronegócio movimenta uma cadeia gigantesca e envolve atividades até mesmo desconhecidas. Ele ainda reforça a necessidade do crédito para o desenvolvimento e a adaptação das linhas de financiamento existentes para uma maior eficiência. 

"A oferta de crédito tem crescido muito nos últimos 15 anos, mas vai de acordo com aquecimento da economia, ela meio que acompanha o crescimento econômico do País ou região. O que temos analisado é que políticas de microcrédito, embora muito importantes, têm disponibilizado valores que ficam muito aquém do que os produtores procuram", avalia. 

Ele pontua que algumas máquinas agrícolas, como colheitadeiras para quem produz milho, podem ultrapassar a cifra de R$ 1 milhão, acima dos R$ 80 mil disponibilizados pelo Agroamigo, linha de microcrédito rural do BNB, por exemplo. 

Tabosa sugere que, além da revisão dos tetos desses financiamentos, que as instituições financeiras pulverizem a oferta para cada segmento e conforme a destinação. 

A agricultura de subsistência tem uma necessidade, a agroindústria, outra. Se o objetivo é pagar fornecedores, é uma coisa; para produção, outra; para abertura do negócio, outra; para expansão, outra. São categorias que não deveriam ter a mesma taxa de juros e o mesmo montante disponibilizado”
Francisco José Tabosa
Professor do programa de pós-graduação em Economia Rural da UFC
 

Classe média rural

O desenvolvimento de novos e pequenos negócios no campo favorece a consolidação de uma classe média rural. O fortalecimento desse grupo de famílias é exatamente um dos desafios e objetivos da Federação da Agricultura e Pecuária do Ceará (Faec), conforme Amilcar Silveira, presidente da instituição. Ele esclarece que, no campo, é comum observar grandes produtores e produtores de agricultura de subsistência. 

O que nós estamos fazendo é uma nova classe média rural. Alguns setores têm conseguido isso, como a carcinicultura. Hoje, nós temos 1.786 produtores de camarão no Estado, que concentram 43% do camarão do Brasil. O que precisamos fazer é nova classe média rural, fomentar nesses setores novas atividades" 
Amilcar Silveira
Presidente da Faec

Silveira também ressalta o papel de indutor do desenvolvimento local. "O setor primário é o grande indutor de desenvolvimento da economia geral. Quando temos um setor primário forte, todas as outras cadeias vão ser impulsionadas. Por exemplo, a cadeia de massas, pães, biscoitos, etc., gera milhares de empregos, mas ela precisa do trigo", argumenta. 

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