Além da conta de luz, reajuste da bandeira vermelha deve encarecer produtos em geral
Indústria e comércio estudam repassar do aumento dos custos para o consumidor final
O reajuste de 52% no valor da bandeira vermelha 2 da energia elétrica deve ter um forte impacto para consumidores e setor produtivo cearense. Além de encarecer a própria conta de energia, produtos em geral também devem ter aumento de preços devido ao custo mais elevado para a indústria e comércio.
O coordenador do núcleo de energia da Federação das Indústrias do Ceará (Fiec), Joaquim Rolim, aponta que parte do consumo do setor é referente à chamada demanda contratada, quando uma indústria assina contrato com a concessionária para garantir o fornecimento ininterrupto de determinado volume energético, modalidade que não sofre com a atualização dos valores.
No entanto, o aumento de 52% ainda preocupa. "Com a tarifa a R$ 9,49 a cada 100 kilowatts hora, temos um custo de R$ 94,9 por MWH. Esse valor sozinho é superior ao preço de aquisição dos últimos leilões de energia eólica e solar, que são limpas e renováveis", destaca.
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Ele ainda estima que, com o valor antigo da bandeira, que cobrava R$ 6,24 a mais por 100 KWH consumidos, o usuário residencial já sofria um impacto de cerca de 7% no valor da conta de energia.
"É uma notícia preocupante, porque os custos de produção industrial são muito impactados pela energia elétrica", reforça Rolim.
Comércio
Assim como a indústria, embora em uma escala menor, o comércio também deve sofrer com o reajuste, fator que deve deteriorar parte do otimismo esperado para os próximos meses, conforme o presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado do Ceará (FCDL-CE), Freitas Cordeiro.
"É ducha de água fria no entusiamos da gente. Todo mundo estava esperando sair o reajuste e o Governo surpreendeu com esse aumento muito alto. O comércio sofre menos que a indústria, mas ainda paga caro por isso, especialmente os estabelecimentos que precisam de câmaras frigoríficas, por exemplo", revela.
Cordeiro ainda critica a falta de maiores incentivos a geração de energia solar fotovoltaica, opção renovável e que poderia amenizar momentos de crise da matriz hidrelétrica, como o de agora.
"Essa energia é tributada como se já estivesse consolidada. Há muito tempo poderíamos estar com um parque solar instalado para esses momentos, mas não há interesse. Parece que querem blindar as fontes que estão ganhando, e muito", dispara.
Aumento geral de preços
Por conta da elevação dos custos, os produtos em geral produzidos e vendidos no Ceará devem sofrer reajustes por parte da indústria e do comércio.
Rolim e Cordeiro apontam que os empresários sempre buscam reduzir o impacto na ponta, de forma a gerar maiores prejuízos às empresas com uma possível redução nas vendas. Ainda assim, ainda não se sabe se todo o reajuste será absorvido pela cadeia.
Reajuste abusivo
O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Usuários do Serviço Público da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), Flávio Aragão, avalia que, em um primeiro momento, o reajuste de 52% na bandeira tarifária é considerado abusivo e não condizente com o atual cenário de pandemia.
Para aprofundar o assunto, a comissão fará uma reunião extraordinária nesta sexta-feira (2). Segundo ele, caso o grupo chegue a conclusão que é necessário, a instituição poderá entrar com medida judicial para suspender a correção.
"Essa valoração de mais de 50% que incide em cima da bandeira vermelha, a nosso juízo, a primeiro momento, é abusiva para a realidade que vivenciamos. É inadmissível que qualquer política pública que diz respeito à matriz energética possa vir a conceder aumento dessa magnitude", destaca.
Aragão argumenta que a bandeira vermelha sem o reajuste já dificulta o consumo mínimo da população, que terá de arcar com mais essa elevação.
Por outro lado, o presidente do Conselho de Consumidores da Enel Distribuição Ceará, Erildo Pontes, justifica que as bandeiras tarifárias são uma "forma inteligente de se tratar a energia elétrica quando as reservas hídricas estão baixas".
"É uma medida necessária porque estamos com déficit de energia das hidrelétricas, o que aciona as termelétricas. Não há outra forma de continuar se as pessoas não reduzirem o consumo. Todo mundo tem que dar sua contribuição para vencermos essa crise"
Ele orienta que os consumidores atentem para as medidas de economia de energia, como verificar a borracha da geladeira, reduzir o uso do ar condicionado e passar o máximo de roupas possível de uma só vez, para reduzir o consumo e, consequentemente, o valor da conta.
"Em 2001, tivemos uma situação em que dependíamos ainda mais das hidrelétricas. Naquela época, todo mundo, de forma compulsória, tinha que economizar 20%, sob pena de multa. Por enquanto, a economia não é obrigatória, mas já se estuda", indica Pontes.