Sem recursos, alunos da rede municipal de Fortaleza podem não ir à final da Olimpíada de História

Como não conseguiram recursos da Prefeitura de Fortaleza, estudantes e professores fazem vaquinha para tentar custear viagem a SP

Escrito por Marcos Moreira , marcos.moreira@svm.com.br
Leticia, professora Amanda, Pedro Henrique e Maria Beatriz formam uma das equipes finalistas da rede municipal que tentam reunir recursos
Legenda: Leticia, professora Amanda, Pedro Henrique e Maria Beatriz formam uma das equipes finalistas da rede municipal que tentam reunir recursos
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

Os estudantes Leticia da Silva, de 14 anos, Pedro Henrique e Maria Beatriz, ambos de 15 anos, estão na final da 16ª edição da Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB). Sem apoio financeiro, eles formam uma das quatro equipes da rede municipal de Fortaleza que não sabem se conseguirão viajar a Campinas, em São Paulo, onde acontece a última etapa do certame, nos dias 24 e 25 de agosto. 

Nomeados de ‘Sábios historiadores viajantes', os três alunos são da Escola Municipal Marieta Guedes Martins, do bairro Novo Mondubim, sob orientação da professora Amanda Duarte. Ela estima que será preciso de R$ 10 a R$ 11 mil para levar cada equipe – todas são formadas por três estudantes e um docente orientador – para a final na cidade paulista.

Escolas da Prefeitura de Fortaleza tiveram 15 alunos finalistas na Olimpíada, mas apenas três, que formam a equipe com a maior nota, terão as despesas custeadas pelo Município, segundo informou a Secretaria Municipal de Educação (SME) na tarde de hoje. Os demais estão organizando vaquinhas a fim de conseguirem dinheiro para pagar as despesas relacionadas à ida para realização da prova. Além disso, quatro professores que integram os grupos também estão ajudando na busca por recursos.   

Conforme o Executivo, a equipe custeada será a 'Historiadores J.A.', da Escola Municipal José de Alencar, no bairro Jardim Iracema, já que teve o melhor desempenho entre as finalistas da rede municipal. 

VEJA EQUIPES FINALISTAS DA REDE MUNICIPAL DE FORTALEZA:

  1. Historiadores J.A - Escola Municipal José de Alencar, no Jardim Iracema
  2. Três espiãs demais 3.0 - Escola Ismael Pordeus, no Jardim das Oliveiras
  3. Sábios historiadores viajantes - Escola Marieta Guedes Martins, no Novo Mondubim 
  4. Hello Kittys Soviéticas - Escola Municipal Professora Maria José Macário Coelho, no Passaré
  5. Womens Team - EMTI Alberto Gomes de Queiroz, no Cais do Porto 

Amanda Duarte explica que, por não ter recurso, o grupo iniciou um protocolo junto à Prefeitura de Fortaleza em 5 de julho, mas não havia recebido resposta oficial até esta terça-feira (16). Desse modo, a equipe precisou confirmar presença na final antes do dia 12 deste mês – prazo estabelecido pela organização nacional – mesmo sem saber se contará com as condições necessárias para custear a viagem.  

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A docente aponta que, dos cinco grupos oriundos de escolas da rede municipal de Fortaleza que estão na final da ONHB, apenas uma delas deve receber recursos da organização do evento para as passagens aéreas, por conta do desempenho nas fases anteriores. O mesmo grupo seria o único também a ganhar valores da Prefeitura de Fortaleza, segundo ela. Os outros 12 alunos finalistas, então, ficariam sem apoio financeiro e correndo o risco de não conseguirem participar da etapa decisiva. 

“A única informação obtida foi que a Prefeitura, seguindo um decreto e lei, iria garantir [recurso] de uma das equipes finalistas – a que tivesse obtido a maior nota –, as demais ficariam então desassistidas. Ainda não recebemos nenhuma resposta se fomos ou não contemplados. Iniciamos uma campanha virtual de arrecadação e estamos planejando algumas ações para conseguir adquirir o recurso. Se não conseguirmos alcançar pelo menos o valor das passagens e hospedagem, dificilmente iremos”
Amanda Duarte
Professora da Escola Municipal Marieta Guedes Martins

POSICIONAMENTO DA PREFEITURA

A legislação citada por Amanda Duarte é a Lei nº 11.320/2022, regulamentada pelo decreto nº 15.578/2023, que dispõe sobre o custeio de despesas para participação em eventos científicos, artísticos, culturais e desportivos de alunos da rede pública municipal de ensino. Pelo texto, o orçamento destinado para essas ações não deve ultrapassar R$ 1,2 milhão por ano e até cinco alunos e um professor podem ser beneficiados por evento ou projeto.

A Secretaria Municipal da Educação (SME) foi questionada pelo Diário do Nordeste e informou que a Prefeitura precisa seguir a legislação e, portanto, pagará as despesas de apenas uma equipe. 

“Ressalta-se que a lei foi criada no ano de 2022 e regulamentada em 2023, partindo da compreensão da gestão municipal sobre a importância de viabilizar que estudantes da Rede Municipal de Ensino possam expandir seus conhecimentos para além da Capital. O projeto inovador prevê que a gestão municipal custeie a participação dos alunos em eventos científicos, artísticos, culturais e desportivos fora da Cidade, incluindo passagens, hospedagem, alimentação e transporte”, ressaltou a Secretaria, em nota. 

LIMITAÇÕES E BUROCRACIAS

“Faz sentido juridicamente, não faz sentido social e historicamente, pois a demanda apresenta uma outra realidade. Deveria ter uma flexibilidade em casos específicos e  não uma rigidez tão grande no que diz respeito a representatividade da educação da prefeitura em outros estados em eventos nacionais e até internacionais. A Prefeitura estimula a inscrição e participação, mas não garante a possibilidade de irmos até a final. É desestimulante”, evidencia Amanda Duarte em relação à resposta da Prefeitura.

O entendimento é reforçado pelo professor André Isaac Sousa, que lidera uma equipe finalista formada por três estudantes de 15 anos da Escola Municipal Ismael Pordeus, no bairro Jardim das Oliveiras. Ele defende que não faz sentido alegar o decreto para limitar o apoio financeiro, ao avaliar que a ida dos alunos não comprometeria nem 1% do valor previsto pelo orçamento para esse fim.  

“Se não houver o apoio da Prefeitura, dificilmente a gente vai conseguir ir para Campinas este ano. É importante lembrar que a Prefeitura, no começo do ano, recomendou às escolas que participassem da Olimpíada, já que este ano era gratuita. Então, nos anos passados, como era paga, a SME não abraçava a Olimpíada. Este ano, por ser gratuita, a SME abraçou, o que me faz pensar que se a gente está abraçando uma olimpíada e os alunos chegam até a final, é necessário que a SME possa bancar essa final”, enfatiza o orientador. 

À reportagem, o docente comentou ainda o sentimento de “frustração” com o possível retorno negativo ao grupo. Isso interromperia um trabalho que se estendeu por seis etapas da competição nacional e iniciou em maio. Além de possíveis medalhas e toda a bagagem da experiência, afirma Isaac, os alunos perderiam a chance de concorrer a bolsas de Iniciação Científica Júnior, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), uma novidade desta edição. 

CEARÁ É DESTAQUE 

Com 93 equipes, o Ceará lidera de modo isolado o ranking de estados com mais finalistas na Olimpíada Nacional em História do Brasil. O número, que envolve escolas públicas e privadas, é mais do que o dobro da Bahia, que ocupa a segunda colocação com 43 grupos.

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Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Secretaria da Educação (Seduc) afirma que apoia professores e alunos das escolas públicas estaduais na participação de eventos científicos, como feiras e mostras. 

“No caso da Olimpíada Nacional de História do Brasil, a Seduc informa que será garantida a participação de todos os professores e estudantes das 18 equipes finalistas. A Secretaria reitera que as solicitações das escolas estão em processo de análise de documentação para emissão das passagens e apoio à estadia e alimentação das equipes”, finalizou a Pasta.

COMO AJUDAR

A equipe ‘Sábios historiadores viajantes' da Escola Marieta Guedes Martins recebe doações por meio do PIX (celular) 85 996110376 - Amanda Duarte Lima. Os valores serão utilizados para cobrir os custos de passagens aéreas, alimentação e hospedagem. 

A equipe ‘Womens Team’ também está recebendo doações. Os finalistas da EMTI Alberto Gomes de Queiroz disponibilizaram o PIX (CPF) 082.490.513.00 - Lorena Silvia dos Santos Lopes, estudante que integra o grupo. Para mais informações, o professor orientador Samuel Costa pode ser contatado por meio do telefone (81) 99829-4751.

Já o grupo ‘Hello Kittys Soviéticas’, da escola Escola Maria José Macário Coelho, recebe doações por meio do PIX (CPF) 096.162.833-24 - Matheus Santos de Oliveira (instituição Z1). Ele é um dos alunos finalistas. 

O grupo finalista ‘Três espiãs demais 3.0’, orientado pelo professor Isaac, ainda não está recebendo doações de forma oficial. O grupo da Escola Ismael Pordeus deve estruturar alguma campanha após receber o retorno da Secretaria de Educação.

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