Quais as regras para ‘motinhas da Shopee’ que dominam lojas do Centro de Fortaleza
Veículos elétricos se tornam opções ao transporte coletivo, mas desafiam segurança viária.
Entre livros de pintar, maquiagens, bolsas e todas as bugigangas comuns em lojas de importados do Centro de Fortaleza, um item tem se destacado: as “motinhas da Shopee”. Elas se popularizam com a promessa de mobilidade a baixo custo, mas exigem atenção quanto às regras de trânsito e de segurança.
Expostas quase sempre à porta dos estabelecimentos, as “motinhas” – descritas erroneamente por vendedores como “bikes” elétricas – custam em média entre R$ 6 mil e R$ 9 mil, e em geral contam com acelerador próprio, painel digital e até caixa de som embutida, em alguns modelos.
Para o estudante universitário Lucas Alves, 21, a compra “bem parcelada” do dispositivo de mobilidade foi “uma mudança e tanto”, já que os gastos com transporte por aplicativo praticamente zeraram. As distâncias percorridas por ele ainda são curtas – mas, confessa, não sabe quais regras valem para o tipo de veículo.
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“Eu nunca tinha usado a ‘bike’ quando decidi comprar uma. Já andei em avenida sem ciclofaixa, não sabia que não podia. É um pouco arriscado, tô pensando até em comprar um capacete pra prevenir. Mas o custo-benefício compensa”, avalia o jovem.
O Diário do Nordeste buscou órgãos de trânsito para explicar o que são, de fato, esses veículos; se exigem carteira de motorista para pilotagem; se é preciso emplacá-los; em quais vias da cidade podem trafegar – e, principalmente, que impactos podem ter na segurança viária de Fortaleza.
É moto, bicicleta ou nenhum dos dois?
Em janeiro de 2026, novas regras para circulação de ciclomotores, bicicletas elétricas e equipamentos de mobilidade individual autopropelidos passarão a valer, regidas pela Resolução 996/2023 do Contran, o Conselho Nacional de Trânsito.
Para saber o que muda, é preciso entender onde se enquadra a maioria das “motinhas da Shopee”: se tiverem velocidade máxima de 32 km/h, são consideradas veículos autopropelidos. Acima disso, são ciclomotores e estão sob normas mais rígidas.
A maioria dos modelos nas lojas de importados da capital cearense têm velocidade até 32 km/h e, portanto, não precisa ter registro, licenciamento nem emplacamento. As definições dos tipos de veículos são estabelecidas pelo Contran:
Veículo autopropelido
- Equipamento de mobilidade individual, com uma ou mais rodas;
- Com ou sem sistema de autoequilíbrio que estabiliza o equipamento;
- Motor com potência máxima de até 1.000 W (mil watts);
- Velocidade máxima de 32 km/h;
- Largura até 70 cm e distância entre eixos de até 130 cm;
- Não exige CNH.
Bicicleta elétrica
- Veículo de propulsão humana, com duas rodas;
- Motor auxiliar com potência máxima de 1.000 W (mil watts);
- Motor deve funcionar somente quando o condutor pedalar (pedal assistido);
- Não deve possuir acelerador ou qualquer dispositivo de variação manual de potência;
- Velocidade máxima de 32 km/h;
- Não exige Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Ciclomotor
- Veículo de duas ou três rodas;
- Motor de combustão interna com até 50 cilindradas ou elétrico com potência máxima de até 4.000 W (quatro mil watts);
- Velocidade máxima de 50 km/h;
- Exige CNH ou Autorização para Conduzir Ciclomotor (ACC).
Entre as exigências para um veículo autopropelido circular está a instalação de velocímetro ou limitador eletrônico de velocidade, campainha (buzina) e sinalização noturna em todos os lados do veículo: frente, trás e laterais.
Como as “motinhas” impactam a segurança
O tráfego dos veículos autopropelidos, conforme o Contran, pode ser autorizado pelos órgãos de trânsito nos seguintes locais:
- Áreas de circulação de pedestres, limitada à velocidade máxima de 6 km/h;
- Ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas, limitada à velocidade máxima regulamentada pelo
- órgão;
- Vias com velocidade máxima regulamentada de até 40 km/h.
Ou seja, as populares “motinhas da Shopee” não podem trafegar em avenidas de Fortaleza – onde a velocidade máxima é, em geral, a partir de 50 km/h – nem em rodovias, por exemplo.
A permissão de dividir espaço com pedestres, bicicletas comuns e outros veículos de maior potência nas vias públicas – além da não exigência de uso de capacete – soam como preocupações diante do aumento da presença desses equipamentos elétricos na cidade.
Para André Luís Barcelos, gerente de operação e fiscalização da AMC e pesquisador do Grupo de Pesquisa Rodoviário e Urbano em Mobilidade (Prumos) da Universidade Federal do Ceará (UFC), os autopropelidos são necessários, mas é preciso criar na cidade infraestruturas seguras e educação para circulação.
“Esses veículos estão tomando a cidade. Eram muito usados pro lazer, mas agora são meios de transporte. E como todo veículo, exigem cuidado do usuário”, alerta.
O pesquisador lista dicas de segurança a serem seguidas pelos condutores das “motinhas”:
- Estar em boa capacidade física e mental, com aptidão mínima para dirigir;
- Evitar vias rápidas, porque o veículo tem velocidade e visibilidade menor;
- Ver e ser visto: ter atenção ao dividir a via com outros veículos;
- Priorizar pedestres e não andar em áreas de passeio (calçadas);
- Usar capacete, mesmo que seja ciclístico, dispositivo efetivo na proteção do usuário em caso de queda ou acidente.
André reconhece que fiscalizar esses veículos é desafiador para a AMC, porque “não existe uma forma de fiscalização como tem pra moto e ciclomotor”. “A falta de registro gera uma dificuldade de fiscalização. O que temos é um trabalho educativo, pra orientar o usuário”, pontua.
Uma das situações mais comum, relata o pesquisador, é flagrar usuários conduzindo ciclomotores comprados como autopropelidos. Quando isso ocorre, o veículo é recolhido ao pátio da AMC e encaminhado ao Detran.
“Hoje vemos várias lojas no Centro vendendo autopropelidos, mas alguns já excedem essa categorização. É preciso atentar à potência, à largura, à distância entre os eixos e à velocidade”, indica.