Pirambu segue luta por direitos 61 anos após marcha popular que garantiu seu território; relembre

Bairro da periferia litorânea de Fortaleza é referência em mobilizações sociais e busca de investimentos em educação, moradia e saneamento

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Pirambu é a maior favela do Ceará
Legenda: O bairro Pirambu celebra 21 anos neste 25 de maio
Foto: Waleska Santiago

Comemorando aniversário nesta quinta-feira (25), o Pirambu é um dos bairros mais conhecidos da orla litorânea de Fortaleza. Fundado há 61 anos, tornou- se tão relevante para a cidade que deu nome à própria região onde está inserido: o Grande Pirambu. Apesar do tempo decorrido, no ontem e no hoje, a maior favela do Ceará continua lutando por reconhecimento e investimentos do poder público.

O 25 de maio relembra a data, no ano de 1962, quando o Decreto do Conselho de Ministros nº 1.058 declarou de utilidade pública terras situadas no Pirambu, “necessárias a melhoramento habitacional”, para a execução de obras de higiene e urbanização e a abertura de vias e logradouros públicos que favorecessem a “fixação dos habitantes”.

O decreto foi uma conquista da comunidade local, que em janeiro daquele mesmo ano promoveu a “Grande Marcha do Pirambu”. O evento atraiu milhares de pessoas e ficou conhecido como a primeira marcha periférica da cidade. Seu objetivo foi chegar ao Palácio do Governo para alertar as autoridades sobre as condições precárias de vida na área.

A Marcha, pacífica, foi uma iniciativa da própria comunidade em parceria com a Igreja Católica, representada pelo padre Hélio Campos, e recebeu apoio de outros movimentos sociais. O sacerdote havia assumido a paróquia do Pirambu em 1958 e iniciou uma mobilização com os moradores visando ao desenvolvimento da área.

Legenda: Mobilização comunitária no bairro, na década de 1960; na foto, Dom Hélio Campos está de óculos
Foto: Acervo/Pirambu Pensante

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moradores é a população atual estimada do bairro, segundo a Prefeitura.

Helder Careca, 36, se define como “cria” do Pirambu - afinal, nasceu por lá e é “fruto da luta da ocupação urbana” promovida pelos pais. Hoje, ele também se engaja na busca por melhorias para a localidade.

“A gente tem as coisas porque a gente briga. Teve muitos avanços na parte de abrir mais escolas, creches e políticas públicas como Cuca e areninhas”, enumera. Porém, ele também descreve as principais necessidades:

  • segurança
  • saneamento básico
  • mais vagas em creches
  • políticas públicas para a juventude

Para o morador, há um desnível entre os investimentos oferecidos ao bairro em comparação à Praia de Iracema, outro bairro litorâneo, mas que recebe mais atenção da Prefeitura. Apesar da precariedade das condições de vida, Careca se diz orgulhoso do bairro.

“Aqui, aprendemos a ser quem somos hoje e a respeitar as pessoas. Mesmo sendo um bairro periférico, é muito acolhedor, a gente recebe muito bem, tanto é que quem vem sempre volta”, pensa.

O arte-educador e articulador social Fábio Lessa, outra cria do bairro, reforça que a comunidade ainda sente a falta de olhares mais específicos do poder público, mas tem sido atendida com a união de lideranças comunitárias que trazem respostas e resoluções - “mesmo que, muitas vezes, na base da cobrança permanente”. 

A organização do bairro se dá através desse movimentos sociais e culturais, com todas as raízes que se mantêm do seu povo, pois muitos têm raízes sertanejas, muitas famílias que vieram do interior e ajudaram a formar o Grande Pirambu. O projeto Vila do Mar é uma prova viva dessas lutas atuais, pois tem sido fiscalizado e acompanhado 
Fábio Lessa
Liderança comunitária do Pirambu

O maior desejo de Fábio é ver as potencialidades do Pirambu serem aproveitadas pela população, nos âmbitos turístico, ambiental, cultural e esportivo, além da abertura de mais empregos na região e da ampliação de recursos para políticas de moradia popular.

Em nota, a Prefeitura de Fortaleza elencou os principais serviços públicos ofertados à população do bairro:

  • 26 unidades escolares para atender à demanda do Grande Pirambu, com uma nova creche em construção;
  • Areninha requalificada em março de 2023;
  • Obras de urbanização da segunda etapa do projeto Vila do Mar, com investimento de R$ 10,9 milhões, da Avenida Pasteur até a Rua Santa Rosa;
  • Implantação do projeto Meu Bairro Empreendedor no Pirambu, com a construção do Centro de Referência do Empreendedor e previsão para o segundo semestre deste ano;
  • 976 famílias do Grande Pirambu beneficiadas com a entrega de papéis da casa;
  • Dois Ecopontos: Pirambu I e Pirambu II.

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História do Pirambu

O Pirambu deriva de favelas criadas em Fortaleza como resultado das migrações causadas pela seca, sobretudo nos anos de 1915 e 1932. Na década de 1930, a instalação de indústrias e a construção do Porto do Mucuripe estimularam a ocupação de mais áreas litorâneas, incluindo o Pirambu - considerado um prolongamento do Arraial Moura Brasil.

Na década seguinte, a elite alencarina migrou da Jacarecanga e do Centro, temendo a poluição e a “invasão” de seus territórios por operários das fábricas e pescadores (criando um estigma de miséria, criminalidade e prostituição), e ocupou áreas hoje nobres na Praia de Iracema e no Meireles.

Sucessivas tentativas buscaram desocupar o Pirambu, inclusive por influência das políticas de ordenamento promovidas pela Ditadura Militar. Contudo, a organização popular garantiu o engajamento necessário para as lutas por direitos.

Significado de Pirambu

É um peixe conhecido como “roncador”, da espécie sargo-de-beiço, que pode ter consumo humano. Ele chega a atingir cerca de 75cm de comprimento e pesar até 6 kg. É mais ativo à noite, quando sai de seu habitat para se alimentar. 

Programação de aniversário

Em lembrança ao aniversário do bairro, várias atividades estão programadas para o próximo sábado (27), organizadas pela entidade Mobiliza Pirambu. 

Das 9h às 15h, haverá ação social no calçadão do Vila do Mar, em frente ao Instituto Cai Cai Balão. Às 16h, haverá uma marcha com concentração na Av. Pasteur com Vila do Mar.

Segundo Fábio Lessa, a nova marcha não repete as mesmas demandas da década de 1960, mas comemora o aniversário do bairro e reafirma suas raízes como uma comunidade de lutas e movimentos sociais. O tema será “Nosso Grito é Paz!” 

Por fim, às 18h, apresentações artísticas e culturais serão realizadas na Areninha do Pirambu.

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