Da dependência à autonomia: quando saber se a tarefa de ser pai ou mãe foi exitosa

Um dos maiores desafios da vida é deixarmos de viver na dependência de pessoas e coisas, para atingirmos uma autonomia que nos permita comer do pão e do suor de nosso esforço

Legenda: A educação para a autonomia deve ser uma tarefa cotidiana
Foto: Natinho Rodrigues

O grande desafio de uma família, é dar à luz a uma criança frágil, dependente, necessitando dos cuidados da mãe, do pai e de políticas públicas de proteção da família, e torná-la em uma pessoa confiante, autônoma e independente. Durante a gravidez, o feto dependia completamente da mãe. Ele precisava dos pulmões da mãe para respirar, necessitava do coração da mãe para sobreviver, necessitava dos olhos e ouvidos da mãe para se conectar com o meio ambiente. Durante toda a gravidez, a criança se preparava para, ao nascer, dar início a um processo de autonomização de individuação.

Ao nascer, seu coração e seus pulmões já têm autonomia. Com o parto, a criança dá início a um processo de individualização. Cada dia a criança manifesta, exercita seu desejo de deixar os braços e o colo da mãe, para dar os primeiros passos. São passos que devem ser encorajados, estimulados a ter iniciativas, a ousar levantar-se e recomeçar, até aprender a andar com seus próprios pés.

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Nesta fase, a educação para a autonomia deve ser uma tarefa cotidiana. Muitos pais e mães inseguros procuram superproteger seus filhos, evitando que passem pelo que passaram quando eram crianças, impedindo que aprendam a se levantar quando caem, e tornam essas tentativas de autonomia em sofrimento e frustração. Ora, toda superproteção é um atestado de incapacidade que dou ao meu protegido. Quando ajo no lugar do outro, quando decido pelo outro, a mensagem que transmito é: “você é um incapaz... sem mim, não sei o que será de você”.

Essa atitude vai gerando um sentimento de incapacidade, insegurança, que compromete o desenvolvimento psicológico da criança. Sabemos que, o maior patrimônio de uma pessoa é a confiança em si. Quando esse patrimônio é arruinado por uma educação repressora, por um contexto familiar conturbado, superprotetor, me sinto inseguro, incapaz e tendo a levar uma vida na quase total dependência dos outros.

Tenho uma grande dificuldade de tomar iniciativas e terminar o que eu começo. Sem meu protetor/a não consigo concluir minhas tarefas e nem levar uma vida independente e responsável. O protetor/a também não consegue viver sem seu protegido, e o filho/a não consegue viver sem a mãe/pai protetor. Essa co-dependência afetiva vai aos poucos minando o desenvolvimento do futuro adulto.

Ele Passa a ter dificuldade de tomar decisões, de ter iniciativas e tem uma necessidade de apoiar-se em outra pessoa ou objetos para se sentir seguro ou feliz. Sem a presença ou aprovação do outro, ele se sente desnorteado, compromete a baixa autoestima e gera uma sensação de impotência e vazio. Do mesmo jeito que para viver, eu preciso e dependo do outro, de recursos externos, quando aparecem obstáculos, frustrações busco apoio fora, nas drogas. Da dependência afetiva para a dependência química é apenas um passo. 

Por isso é difícil tratar a dependência de um indivíduo, sem tratar o sistema familiar. É ele que precisa ser tratado. E então o que fazer? Como podemos prevenir as dependências que comprometem a vida do indivíduo, da família e da sociedade?

Vejamos: eduque seu filho, para que desde pequeno, participe ativamente da vida e das tarefas da família. Por exemplo, após brincar com seu filho, chame-o para guardar os brinquedos. Ele vai aprendendo que tudo que for fazer, tem que concluir. Ele deve ser parceiro participativo e corresponsável.  Se ele acendeu a luz, abriu a porta, ensine-o a fechá-las, se já pode ajudar nas tarefas de casa, chame-o para fazê-la. Não o eduque para ser um príncipe ou uma princesa que ficará sempre esperando ser pajeado e assistido em suas necessidades.

Eduque-o para ser uma pessoa participativa, solidaria e corresponsável. Agindo assim você está educando para uma vida autônoma e saudável, evitando que ele vá buscar no mundo exterior,  a força e a coragem que ele já tem dentro de si, se tivesse sido educado para a autonomia. Outra atitude é educar para superar a frustração, impondo limites. Quem ama frustra, porque alerta, protege e impõe limites. A criança, desde pequena, precisa entender que a frustração faz parte da vida e do aprendizado dela. Que existem “nãos” que tem que ser respeitados.

Errar é essencial, muitas vezes é através do erro que vem a persistência e a vontade de superação.  Muitas vezes, terão de repetir a tarefa, até que ela seja realizada com destreza. A paciência e a orientação são aqui regras de ouro. As crianças, antes de acertar, vão ter que tentar, errar e se frustrar muitas vezes.  Quando me frustro, aprendo que nem tudo que eu quero eu consigo. Quando estou chateado supero minha chateação, vou praticar um esporte, pedalar e descarregar as tensões pela física e não pela química. Não existe remédio para tudo. Na vida eu ganho, eu perco ou aprendo.

Quando não consigo o que queria e me frustro, vou aprendendo com meus erros e acertos. Aprendo que a vida exige renúncias, determinação, que tenho que celebrar as conquistas, aprender com meus erros. Se quero vencer, preciso estar atento para o resultado dos meus atos. “Nenhum vento sopra favorável quando não sei para onde quero ir”, diz o ditado popular. Não podemos perder de vista nossos objetivos, nossos sonhos e nosso potencial.

Um dos maiores desafios da vida é deixarmos de viver na dependência de pessoas e coisas, para atingirmos uma autonomia que nos permita comer do pão e do suor de nosso esforço. Para tal, precisamos ter disciplina, perseverança, capacidade de nos organizar e, sobretudo, acreditar em nós mesmos. Precisamos ser cuidadosos e sempre nos perguntarmos: O que quero de minha vida? O que estou fazendo para conseguir realizar meus sonhos, que mudanças preciso fazer em minhas estratégias? Temos que ir à luta, ter garra. Precisamos dizer sim quando for necessário e dizer não quando for preciso.

A droga inicialmente vem para anestesiar um sofrimento ou uma frustração. Depois torna-se um hábito, desumaniza a pessoa, intoxica a mente de quem usa e destrói as relações familiares. Essa é a política da avestruz. Quando ameaçada, enfia a cabeça no primeiro buraco que encontra, mas deixa visível todo o seu corpo. E vive uma ilusão que enfiar a cabeça num buraco, usar uma droga, resolve sua situação. Você quer saber se foi uma boa mãe e um bom pai? É quando você não é mais necessária/o. Quando seu filho já adquiriu autonomia, ele não precisa mais de você. Isso significa que sua missão foi exitosa.

 

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