Contadora reúne amigos e faz aniversário surpresa para vendedora ambulante em semáforo de Fortaleza
Uma amizade feita no trânsito emocionou quem passava pela Avenida 13 de Maio num gesto de carinho genuíno
Sair cedo de casa, pegar o ônibus no bairro Vila Manuel Sátiro rumo ao Benfica, em Fortaleza, vender doces e pipocas no canteiro central de uma via movimentada. O cotidiano da aposentada Maria Leuda de Oliveira é certo na busca por complementar a renda. Na última semana, contudo, teve a rotina rompida e recebeu a primeira festa de aniversário surpresa da vida, aos 73 anos.
No cruzamento entre as Avenidas da Universidade e 13 de Maio, o barulho incômodo do trânsito deu lugar ao som alto com o tema de “parabéns para você”, às palmas e buzinas em comemoração à vendedora ambulante, na quinta-feira (2). O coração também disparou. Foi emoção ao ar livre.
"Eu jantei o bolo: era eu comendo e as lágrimas caindo. 'Meu Deus, como uma pessoa gosta de outra assim?’ Quando o coração bate é assim mesmo", refletiu dona Leuda, na noite daquele dia, para a contadora Isaura Alves, que organizou a festa.
Tudo foi feito de improviso. O único registro veio de uma estudante que passava pela avenida e compartilhou a cena nas redes sociais. Em 3 dias, quase um milhão de pessoas viram a cena: o bolo com a vela faiscante e o abraço que emocionou.
Mas essa história começou bem antes, há cerca de dois anos, quando dona Leuda e Isaura trocaram as primeiras palavras. "O nosso tempo é muito curto, é o tempo do sinal, o suficiente para ela me abençoar e me desejar o bem", resume a contadora.
Pelo menos uma vez por semana, desde então, as duas trocam uma palavra, abraço ou confidências pessoais. Já na semana passada, ao sair de uma reunião, o sinal fechou e as amigas tiveram o diálogo, por volta de 10h30:
– Como está?
– Completei 73 anos ontem com muita saúde
– Teve festa?
– Não teve nem um bolinho…
– E o que a senhora quer de presente?
– A sua amizade
Sinal verde, ritmo agitado, e Isaura seguiu para o escritório de onde encomendou as comidas e convidou os colegas de trabalho para uma festa-missão.
"'Gente, se organizem aí para irmos para um aniversário surpresa de uma amiga minha’. Não disse quem era e nem onde era. Eles entraram no carro, pegamos o bolo, os salgadinhos, o refrigerante e a vela e fomos para lá", remonta a contadora.
O grupo chegou perto de meio dia, conseguiram encontrar a aniversariante, e levar suavidade ao clima do cruzamento onde a pressa impera. “Estava com medo de ela já não estar mais lá. Quando eu cheguei, parei em frente onde ela fica, coloquei o carro o som de parabéns e desci cantando para ela", completa Isaura.
Em nenhum momento foi minha intenção ter essa repercussão porque eu não gosto de tirar foto, só que uma moça do outro lado filmou e postou no Tik Tok. O vídeo começou a chegar até mim e foi quando eu fiquei sabendo
A estudante de odontologia Nicolle Falcão, de 21 anos, foi quem viu a comemoração para a senhora a qual já está acostumada a observar no local. “Comecei a gravar porque achei uma ação tão verdadeira e fofa que quis registar”, detalhou em entrevista ao Diário do Nordeste.
O engajamento de vários desconhecidos foi motivo de felicidade para a estudante. “Algumas pessoas ficaram interessadas em ajudar ela e ficaram felizes com a atitude da Isaura, assim incentivando também a fazerem outras ações como essa”, completa Nicolle.
Para dona Leuda, de sorriso fácil apesar da rotina puxada e da dificuldade para andar, o carinho veio para curar os momentos em que chora por se sentir só.
“Muita gente já me ajudou, mas isso que você fez foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida, nunca esperei isso, você marcou minha vida”, agradeceu a idosa diretamente à “neta que Deus deu”, como define.
Como foi a comemoração
A auxiliar administrativa Luana Lima, de 33 anos, estava no meio do expediente quando ouviu a chefe Isaura: "Tenho uma amiga que fez aniversário ontem e ninguém lembrou. Nós vamos agora bater os parabéns para ela".
Ainda no carro, com ajuda de outros dois colegas, colocou a vela no bolo e se preparou para a celebração mesmo sem saber de quem se tratava. O grupo colocou a música no carro, parou no meio da Avenida 13 de Maio e os funcionários foram guiados pela contadora.
“Entre tantas outras pessoas, não imaginávamos a repercussão, porque o intuito era somente fazer dona Leuda feliz. Nenhum de nós nem sequer preparamos o celular para gravar e estamos ainda sem saber como lidar com a quantidade de pessoas que nos mandam mensagem”, completa.
Depois disso, a aniversariante e os convidados foram para a calçada e ficaram um tempo conversando, comendo e comemorando a data. “Um doce de pessoa, não tem como não amar à primeira vista”, observa Luana.
Dona Isaura voltou a ser surpreendida nesta segunda-feira (6), quando a equipe do Diário do Nordeste chegou para a entrevista. "Quando ela passa, me beija e abraça, eu adoro ela. Os outros conheci na quarta-feira, o 'gatão' e as 'gatinhas'", apelida o grupo entre risadas. "Todo dia eu venho para cá, moro sozinha e venho para cá ganhar meu dinheirinho, vendendo pastilhas e pipoca", completa a idosa sobre a própria trajetória.
Luana descreve como surreal o momento em que viu a aniversariante chorando do outro lado da rua ao receber a surpresa.
“Foi um sentimento tão bom de estar fazendo um bem tão grande a uma pessoa como ela que, de imediato, dava pra perceber que da mesma forma da gente não queria nada em troca daquilo tudo a não ser amor e carinho e abraço”, conclui.