Com uso de remédios ou chás para emagrecer, fígado pode levar meses para se recuperar, alerta médica

Marina Studart, hepatologista e gastroenterologista do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), afirma que é frequente a chegada de pacientes com lesões no fígado por uso de medicamentos, como ocorreu com a cantora Paulinha Abelha

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Fita métrica emagrecimento
Legenda: Internautas vêm discutindo sobre os riscos que os remédios emagrecedores podem trazer à saúde
Foto: Shutterstock

Emagrecer, por estética ou saúde, é um processo complexo e que exige cuidado. Medicamentos, chás e suplementos com este fim podem causar sérios danos ao corpo – como lesões no fígado, a exemplo do que ocorreu com a cantora Paulinha Abelha

A médica Marina Studart, hepatologista e gastroenterologista do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), afirma que a chegada de pacientes com lesões hepáticas à unidade de saúde pública “é frequente”.

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Em entrevista ao Diário do Nordeste, Marina explica os possíveis danos que medicações e ervas “emagrecedoras” podem causar ao fígado e à saúde global, e orienta o que se deve fazer para emagrecer com saúde

Confira a entrevista completa:

Médica hepatologista Marina Studart
Legenda: Marina Studart, médica hepatologista e gastroenterologista no Hospital Geral de Fortaleza (HGF)
Foto: Arquivo pessoal

Que complicações o uso de medicamentos para emagrecer podem causar ao fígado?

Geralmente, separamos dois termos principais em relação a medicamentos e ervas que podem ocasionar o dano hepático: 

  • DILI: Doença Hepática Induzida por Drogas (traduzido do inglês), que inclui medicamentos e suplementos alimentares;
  • HILI: Doença Hepática Induzida por Ervas (traduzido do inglês), que inclui as ervas, plantas e chás, como chá verde.

Em geral, essas medicações podem causar insuficiência hepática aguda, que é uma lesão no fígado. O diagnóstico pode ser difícil, porque fazemos o diagnóstico diferencial com todas as outras doenças no fígado. Não existe exame específico, porque a lesão no fígado mimetiza muitas outras doenças.

Por que o fígado é vulnerável a medicações e ervas? Porque metaboliza em torno de 95% dos compostos químicos, sendo um filtro, eliminando as toxinas e metabolizando outros produtos, então fica bem vulnerável.

25%
dos casos de insuficiência hepática aguda são devidos a lesões por medicações e suplementos. A taxa de mortalidade chega a 12%, segundo Marina.

Existem mais de 1.200 medicações que podem causar lesões no fígado, e é uma causa frequente de retirada de medicamentos do mercado. A lesão pode evoluir para insuficiência grave e levar ao óbito, junto a outras complicações.

Que outras medicações podem causar doenças no fígado?

Existem muitas medicações que podem causar lesão no fígado, como antibióticos, hormonais e os próprios anabolizantes. Analgésicos, se utilizados na dose correta, não tem problema. É mais comum associar as lesões no fígado aos anti-inflamatórios não esteroidais.

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No caso da cantora Paulinha Abelha, a lista de medicamentos foi receitada por uma médica nutróloga. Que cuidados os profissionais devem ter com isso?

Os profissionais devem observar, em relação à utilização de medicamentos para emagrecer, que é sempre pior quando se utiliza uma associação de remédios, sejam ervas, sejam medicações.

Em muitos casos, a associação da atividade física e dieta saudável já seria suficiente para a perda de peso. 

Existem critérios específicos para indicar a utilização de remédios para emagrecer. E existem as drogas mais indicadas para esses tratamentos, e em geral não fazemos associação de remédios.

Além disso, devem ser feitos exames para avaliar o fígado antes da prescrição da droga. Se houver alteração, que o paciente seja encaminhado para um hepatologista.

Já recebi muitos pacientes cujo médico queria saber se ele estava liberado para utilizar as medicações. Quando o paciente já tem alguma lesão, aumenta o risco de dano.

Quais profissionais devem acompanhar um tratamento para emagrecimento?

O profissional ideal para tratamento da obesidade e utilização de medicamentos para emagrecer, quando indicados, deve ser primariamente o endocrinologista. Pode ter, claro, a associação de um nutrólogo especializado, que tenha qualificação para prescrever.

Quais as outras possíveis causas de doença hepática tóxica?

A doença hepática tóxica é um nome genérico, que pode indicar a utilização de qualquer substância, sejam fármacos, ervas, suplementos alimentares, álcool, lesão induzida pela gordura. Por isso, fazemos o diagnóstico diferencial.

Os sintomas de um dano hepático causado por medicamento ou erva para emagrecer são inespecíficos. Vão desde astenia (cansaço), mal estar, até a icterícia (pele e olhos amarelados), e inclusive dor abdominal que pode mimetizar uma pedra na vesícula. Por isso é importante consultar um profissional da área.

Há muitos casos no Ceará? Existem grupos de risco para doenças hepáticas?

Trabalho num hospital de referência em transplante hepático, o HGF, e tivemos alguns casos, antes da pandemia, de pacientes que utilizaram chás e medicações emagrecedoras, além de suplementos alimentares. É frequente não apenas em ambiente hospitalar, como em consultório.

Muitas vezes pode demorar, mesmo com a retirada da medicação, de semanas a meses para que os exames do fígado se normalizem.

A idade é um fator de risco importante, porque o envelhecimento altera o metabolismo das medicações, diminuindo a eficácia de alguns remédios e aumentando o risco de toxicidade de outros. 

O consumo de álcool exagerado também pode levar a lesão no fígado; o uso frequente de anti-inflamatório para alguma dor crônica; a associação com outros tratamentos, como controle de colesterol, diabetes e outras doenças crônicas.

O que se recomenda a pessoas que têm o objetivo de emagrecer com medicamentos?

Pessoas que têm a intenção de utilizar medicamentos para emagrecer devem procurar um atendimento especializado, qualificado. 

Existem critérios específicos pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Obesidade para tratamento do emagrecimento – a medicação não é a primeira indicação.

O acompanhamento conjunto é importante. Os pacientes que estão tratando problemas relacionados à obesidade muitas vezes têm outras doenças associadas, como gordura no fígado, ansiedade ou depressão, hipertensão, diabetes ou pré-diabetes. É preciso um acompanhamento multidisciplinar.

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