Às vésperas do Enem 2022, estudantes relatam estresse, exaustão e ansiedade

Pressão para alcançar bom resultado afeta candidatos na disputa por vaga em universidades após período no ensino remoto

Escrito por Lucas Falconery , lucas.falconery@svm.com.br
Criança escrevendo em caderno ao lado de notebook.
Legenda: Os dias que antecedem o Enem candidatos podem ser afetados por dificuldade de concentração, sono desregulado e distúrbios na respiração.
Foto: Camila Lima

Dois dias de provas definem o rumo de estudantes após anos de preparo para entrada no ensino superior. E a chegada desse momento causa impactos na saúde física e mental dos candidatos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que terá a primeira prova no domingo (13), com relatos de estresse, exaustão e ansiedade.

E como isso se manifesta na reta final dos estudos? Dificuldade de concentração, sono desregulado, distúrbios na respiração, taquicardia e pensamentos com medo do futuro podem afetar os candidatos. No Ceará, 224.113 estão inscritos no Enem 2022.

Além da pressão natural com a proximidade do exame, os estudantes sofrem com o receio de que o conteúdo visto de forma remota, devido à pandemia, não seja suficientes para um bom resultado. Como compensar?

“Me cobrava para resolver simulados até chegar a um ponto em que minha mente estava tão desgastada que precisei mudar de escola. Eu estava com muita crise de ansiedade, pensava não estar fazendo o suficiente", descreve Emanuel Santos, de 17 anos.

A situação ficou mais intensa quando o adolescente chegou ao 3º ano e viu a pressão escolar, familiar e a autocobrança aumentar. Emanuel viu o sonho da infância, de se tornar doutor em direito e química, esbarrar na exaustão do preparo para a prova.

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Esse percurso, inclusive, acontece em meio aos desafios históricos da educação: são 25 km de distância entre a casa, no distrito de Ingazeiras, em Aurora, até a escola.

Tenho que acordar muito cedo e chego em casa muito tarde, eu fico exausto. Muitas vezes, eu e meus colegas, fomos prejudicados pelas chuvas que alagaram as estradas e o ônibus atolava
Emanuel Santos
Estudante

Os dois últimos anos foram delicados para o aprendizado de estudantes do ensino médio, principalmente, os do 3º ano, como analisa Marlon Coutinho, mestrando em psicologia com foco em educação.

“Muitos estavam desestimulados das atividades, tivemos um número significativo de pessoas que não foram fazer o exame nesses anos por questão de saúde em relação à Covid, mas também por saúde mental”, pondera o especialista.

Com o retorno das atividades presenciais, também há um cenário de maior pressão para os estudantes alcançarem um bom resultado.

Sintomas da tensão pré-Enem:

  • Estresse
  • Ansiedade
  • Dificuldade de concentração
  • Problemas com o sono
  • Dificuldade de respirar
  • Taquicardia
  • Medo do futuro

“Sempre temos a perspectiva de que falta algo. Agora o movimento é contrário, a gente tem a presença das pessoas, mas também a pressão de tirar uma nota boa”, reforça.

Essa sensação de não estar preparada afeta a estudante Mailana Campos, de 18 anos, que dedica boa parte do dia aos estudos para o Enem.

“Enquanto as pessoas à minha volta têm certeza que eu terei bons resultados, muita das vezes, me questiono e tenho dúvidas em relação ao meu futuro”, compartilha.

É um momento decisivo, então de certa forma, eu acabo me pressionando também
Mailana Campos
Estudante

Mailana estuda numa escola de tempo integral em Camocim e decidiu assinar um curso online para estudar em casa à noite.

“Não consegui cumprir com os estudos devido a contratempos que aconteciam, pelo fato de estar em casa, como também, dificuldade de assimilar alguns conteúdos”, completa sobre os fatores que causam insegurança.

Qual o limite dos estudos?

“Estão estudando enquanto você descansa”, “a concorrência é com o Brasil inteiro”, “se você não passar, vai desperdiçar um ano”. Essas frases eram ouvidas e passavam pela mente do engenheiro Gustavo Pinheiro, quando tinha 18 anos.

engenheiro
Legenda: Gustavo Pinheiro, estudante
Foto: Arquivo pessoal

Era o último ano do ensino médio e a primeira vez que ia realizar a prova. Para garantir uma vaga no ensino superior, Gustavo resolveu conciliar a rotina de estudos da escola com cerca de 3 cursinhos e a resolução de 16 edições do Enem como forma de se preparar.

Duas semanas antes da prova, uma dor forte na cabeça o levou ao hospital, onde recebeu o diagnóstico de Acidente Vascular Cerebral (AVC). Gustavo ficou sem parte dos movimentos do lado direito do corpo.

“Eu me via na rotina de aulas do ensino médio, todas as noites eu ia pro curso e no fim de semana fazia simulados. De domingo a domingo, exceto nos feriados, eu não tinha folga. Deu certo durante quase todo o ano”, lembra.

Nenhum aluno do ensino médio consegue se sentir confiante em todas as matérias e para tentar compensar eu acabei me matriculando em dois pré vestibulares e de um programa da UFC
Gustavo Pinheiro
Engenheiro

Gustavo conseguiu fazer a prova naquela edição, em 2014, mesmo passando mal durante os dois dias do Exame. Mesmo com a aprovação no curso sonhado, a situação trouxe um outro tipo de lição.

“Eu acabei levando essa experiência pro resto da vida, comecei a respeitar meu corpo, quando eu chego mais perto do limite eu paro. Comecei a ter momentos de lazer de não trabalhar e estudar sem me sentir culpa”, reflete.

Evitar cobranças

Manter a mente saudável tem como base evitar as cobranças excessivas, entender quais são as dificuldades e facilidades para um bom planejamento de estudos. Esse período pré-vestibular exige atenção dos estudantes, responsáveis e professores.

“Evitar comparação com outros adolescentes, evitar se sentir inferior e achar que não vai dar conta da rotina de estudos. A escola exige e cobra dos estudantes que ele esteja muito disponível, saiba todas as disciplinas e questões”, analisa Marlon.

Para isso, o especialista indica a prática de exercícios físicos, a manter a qualidade do sono, uma boa alimentação e aliviar a mente também no último dia antes da prova.

estudante
Legenda: Emanuel Santos, estudantes de 17 anos
Foto: Arquivo pessoal

Emanuel encontrou uma válvula de escape na prática de vôlei, que acontece próximo de casa. "Fiquei menos estressado e mais disposto, recomendo para aquelas pessoas que estão tensas devido ao Enem. Fazer atividades físicas para aliviar o estresse ajuda muito".

Já Mailana encontra tranquilidade na leitura de textos cristãos. “Gosto de fazer meu devocional, o que me acalma e me deixa mais leve. Depois, me permito descansar sempre que necessário”, acrescenta.

Ir para o modelo remoto, voltar para as aulas presenciais e agora realizar o Enem são momentos exigentes da mente dos estudantes, como analisa a psicóloga Alana Ricarte, psicóloga clínica especialista em terapia cognitivo-comportamental.

"A autocobrança e a cobrança externa sobrecarrega os jovens, uma exaustão mental, pensamentos acelerados e uma cobrança desproporcional", frisa.

A seriedade da escolha do futuro acadêmico também se soma a essa confusão na cabeça. 

"O Enem vem dando uma possibilidade muito bacana de concorrer a diversos cursos isso é muito bom, porque o ser humano é plural, pode ter vários interesses e habilidades, mas ao mesmo tempo gera muitas dúvidas na escolha", pondera Alana.

É muito importante a convivência social com pessoas que estão vivendo a mesma fase para trocar figurinhas, porque a identificação gera unidade e pertencimento. Faz com que o adolescente entenda que não está sozinho
Alana Ricarte
Psicóloga

Para o dia anterior à prova, descanso, boa alimentação são as dicas. "O desgaste é físico e mental", resume. "Tenham calma, a vida de vocês está começando agora e não precisa passar de primeira vez. Existe tempo para isso e para a maturação da decisão profissional", fala aos estudantes.

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