Criança de Ubajara passa por transplante inédito de fígado com doador vivo no Ceará

Procedimento realizado em Fortaleza consistiu em retirar parte do fígado de um doador vivo para implantar em uma criança

Com apenas cinco anos de idade, uma menina de Ubajara, na região da Serra da Ibiapaba, passou por um procedimento cirúrgico inédito no Ceará: um transplante de fígado intervivos, realizado na última sexta-feira (23), em Fortaleza. 

O procedimento consistiu em retirar parte de um fígado de um doador vivo e saudável para ser implantado na paciente.

A criança começou a apresentar sintomas característicos de uma disfunção hepática e, após investigação, descobriu ser portadora de Pfic tipo 3, doença genética grave que afeta o funcionamento do órgão. 

"Essa é uma doença colestática intra-hepática, que é como se o fígado não conseguisse expelir a bile de dentro dele. Então a criança fica com icterícia e com prurido. Não tem tratamento. O único tratamento inicial é sintomático para melhorar o prurido e a icterícia. Então, você dá remédios para a criança não sentir tanta coceira", explica a cirurgiã Denissa Mesquita, que atuou no procedimento, realizado no Hospital São Carlos. 

A menina chegou a ser acompanhada pelo Hospital Infantil Albert Sabin (Hias), em Fortaleza, e depois por médicos do Amapá, para onde a família se mudou. Segundo a médica, no entanto, após uma piora do quadro de saúde, a paciente retornou ao Ceará já com a indicação para transplante. O procedimento, destaca Denissa Mesquita, seria a única chance de a criança melhorar a qualidade de vida e sanar os riscos da doença. 

Transplante intervivos

A escolha pelo transplante intervivos, ainda conforme a cirurgiã, ocorreu pela dificuldade que seria em encontrar doadores para uma paciente tão jovem. 

"Como ela é muito pequena, o doador cadáver fica muito difícil porque são poucos os doadores cadáveres pediátricos, fica um transplante que tem que esperar muito. Então pensamos no transplante intervivo", destaca. 

Ela explica ainda que, neste tipo de procedimento, a preferência para doação é sempre os pais. Os progenitores da paciente, no entanto, foram descartados pelo risco de apresentar gordura no fígado, já que ambos estavam com sobrepeso. 

A doadora acabou sendo uma prima legítima do pai da menina, de 30 anos, sem comorbidades. Para o procedimento, o hospital recebeu autorização judicial, após a doadora passar por uma avaliação psicológica. O fluxo é necessário quando a doação não é concedida por parentes de primeiro grau, segundo ressalta Denissa Mesquita. 

Como foi o procedimento

Para o transplante intervivos, foram necessárias duas equipes cirúrgicas trabalhando quase simultaneamente em salas de cirurgias distintas e contíguas. 

"Fizemos duas cirurgias: uma com o doador, e outra com o receptor. Retiramos 20% do fígado do doador para implantar na criança receptora", ressaltou a médica.

Segundo Lúcio Pacheco, chefe da equipe de transplante de fígado da Rede DOr no Rio de Janeiro, a cirurgia realizada na unidade cearense é um passo importante para aumentar o alcance deste procedimento em pacientes pediátricos do Nordeste. Até então, crianças com esse diagnóstico tinham que ir para São Paulo para se tratar, segundo ele. 

A criança receptora e a adulta doadora estão bem e seguem internadas na unidade em Fortaleza.