137 mil famílias em pobreza e extrema pobreza no Ceará estão na fila de espera por Auxílio Brasil

Número de cearenses aguardando para receber benefício mais do que dobrou entre março e abril deste ano

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Fila de espera para o Auxílio Brasil é composta por população pobre ou extremamente pobre do Ceará
Legenda: Fila de espera para o Auxílio Brasil é composta por população pobre ou extremamente pobre do Ceará
Foto: Natinho Rodrigues

Manter-se o mês inteiro com R$ 400 ou menos soa impossível para a classe média, mas é a realidade de muitos cearenses. Outros milhares sequer têm essa quantia: no Ceará, quase 137 mil famílias ainda estão na fila para receber o Auxílio Brasil, número que dobrou em 1 mês.

Em abril deste ano, 136.685 famílias cearenses estavam inseridas no CadÚnico, tinham perfil para estar no Programa Auxílio Brasil (PAB) – o Bolsa Família “rebatizado” –, mas ainda não recebiam o benefício. Em março, eram pouco mais de 63 mil famílias nessa situação.

Os dados são de estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), e mostram que o Ceará é o 7º estado do Brasil e 3º do Nordeste com maior demanda reprimida para o Auxílio Brasil, em vigor desde novembro de 2021.

2,8
milhões de famílias estão na fila do Auxílio Brasil. A demanda cresce mês a mês, mais acelerada do que a oferta.

O CadÚnico, como explica a CNM, “continua sendo o principal instrumento para a seleção e a inclusão de famílias de baixa renda em programas sociais, sendo usado obrigatoriamente para a concessão de benefícios como o antigo Bolsa Família e o atual Auxílio Brasil”.

“O PAB segue provendo novos acessos, porém em uma velocidade desproporcional à demanda. É importante que o Governo Federal trabalhe com projeção de demanda”, pontua a CNM no estudo.

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Garantir essa mínima renda por mês é a principal forma de sobrevivência de milhares de famílias – como a da jovem Sabrina Lima, 25, cujo único rendimento para sustentar a si e ao filho de 5 anos tem sido o Auxílio Brasil.

Desempregada, ela chegou a ter o benefício bloqueado, mas conseguiu retomar o acesso e ainda complementar a ajuda com o Auxílio Gás. A quantia é vital, mas ainda insuficiente diante da alta inflação.

Esse auxílio é quase todo pra pagar aluguel. O que fica é pra pagar água, luz e o que dê pra comprar de alimentação, porque hoje em dia comida tá até difícil, não dá pra comprar muita coisa. Quebra o galho.
Sabrina Lima
Desempregada

O “sufoco” de Sabrina, que é mãe solo, será amenizado a partir do próximo mês, já que na segunda-feira, dia 18 de julho, voltará ao mercado de trabalho após tempos sem conseguir. “Vai ser um alívio grande.”

Por que não há auxílios suficientes?

Num cenário em que o preço de itens básicos e o desemprego aumentam na mesma velocidade, a dificuldade de as vagas do Auxílio Brasil acompanharem a demanda também cresce, como explica André Lima Sousa, professor de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará (Uece).

“As famílias vão empobrecendo, então cresce a procura pelo auxílio. Isso se justifica pela corrosão do poder de compra das famílias, sobretudo dos bens mais básicos, como alimentação, gás e transporte”, destaca o professor.

Outra questão é o aumento da fome e da miséria. Com o retorno do Brasil ao mapa da fome: 3 a cada 10 pessoas passam fome no País, isso é muito grave.
André Lima
Professor da Uece

Ao fim de 2020, 19,1 milhões de brasileiros conviviam com a fome. Em 2022, o número atingiu trágicos 33,1 milhões de pessoas. No Nordeste, 38,4% da população vive em insegurança alimentar moderada ou grave, de acordo com estudo da Rede Penssan.

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André Lima lamenta que “às famílias que não conseguem acesso ao Programa Auxílio Brasil, só resta continuar na situação de miséria e fome”, cenário que impacta diversas esferas da sociedade – como saúde e educação.

“Claro que essa política (PAB) vem permeada por diversas dimensões: famílias com gestantes precisam fazer acompanhamento médico para receber o benefício; em famílias com crianças e jovens, eles devem estar matriculados na escola”, exemplifica o professor.

O Diário do Nordeste questionou o Ministério da Cidadania sobre a quantidade insuficiente de vagas do Auxílio Brasil no Ceará, enviando as seguintes perguntas:

  • Quais os possíveis motivos para a existência dessa demanda reprimida? 
  • O Ministério da Cidadania acompanha a evolução do número de famílias que precisam de assistência?
  • Quais os critérios para uma família sair dessa "fila" de espera pelo Auxílio Brasil?
  • Há previsão de ampliação do programa no Ceará?

Até a publicação deste texto, a Pasta não respondeu às questões.

O que o Ceará pode fazer

A reportagem também buscou os governos estadual e municipal de Fortaleza para saber como atuam no cadastramento da população no CadÚnico e se há políticas complementares ao auxílio federal, que assistam a população de baixa renda, sobretudo em extrema pobreza.

1.466.180
famílias do Ceará inseridas no CadÚnico vivem em situação de pobreza e extrema pobreza, segundo dados do Ministério da Cidadania.

Em nota, a Secretaria de Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS), da prefeitura, detalhou apenas o procedimento que as famílias devem seguir para ingressar no CadÚnico, sem citar nenhuma política pública assistencial complementar à federal.

Já a Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos, do Governo do Estado, citou 4 "políticas públicas estaduais voltadas à população em situação de vulnerabilidade: Vale Gás Social; Mais Nutrição (doação de alimentos); Cartão Mais Infância Ceará (transferência de renda); e AvanCE (bolsas estudantis).

A Pasta destacou ainda que "presta orientação técnica aos municípios sobre a gestão do CadÚnico, estimula o cadastramento, faz as articulações necessárias com os governos federal e municipais, e articula estratégias de qualificação da base de dados".

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