Reajustes e inflação crescente pesarão mais no orçamento em 2021

Aumento de preços de energia, planos de saúde, água, transportes, combustíveis e alimentos se somam às despesas tradicionais de início de ano e desafiam planejamento financeiro de cearenses

Escrito por Redação ,
Legenda: Despesas com alimentação devem continuar subindo no início do ano

Além das obrigações já previstas para o início do ano, como pagamento de IPTU, IPVA e matrícula escolar, a crescente inflação deve apertar ainda mais o orçamento das famílias cearenses. O aumento da energia elétrica, que já começou neste mês, vai ser acompanhado também nos próximos meses por reajustes dos planos de saúde, água, transportes e inflação de combustíveis e de alimentos.

“O início de 2021 deve ser bastante desafiador para a maioria dos brasileiros. Estaremos em meio à pandemia, com taxa de desemprego em aceleração e retirada de estímulos fiscais e monetários, como o auxílio emergencial. Temos as despesas de início de ano, alguns reajustes de preços administrados que não ocorreram em 2020 e ainda uma inflação dos preços livres que está em franca aceleração, como alimentos e outros”, aponta o economista Ricardo Eleutério.

Os chamados preços administrados, que têm os valores definidos por meio de contratos ou pelo Governo, foram responsáveis por segurar a inflação em 2020, por conta do adiamento dos reajustes em função da pandemia, ressalta o economista. No próximo ano, entretanto, devem atuar com força contrária para recuperar os prejuízos do ano anterior. O mercado estima que os preços administrados encerrem 2020 com variação de 2,33%, e 2021 com 4,27%, de acordo com o Boletim Focus. 

Um exemplo é aqui no Ceará. Em julho passado, a Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce) adiou para dezembro a definição do reajuste na tarifa de água da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) e as revisões dos preços praticados pelos setores de transporte intermunicipal – que deve incluir mecanismos para rever a perda do fluxo de passageiros na pandemia – e gás canalizado no Estado. Os consumidores já sentirão as consequências dos aumentos a partir de janeiro.

Nesse mesmo mês, os planos de saúde também apresentarão uma dificuldade adicional. Por conta da pandemia, a Agência Nacional de Saúde Suplementar determinou que os beneficiários dos planos terão o reajuste dos valores de 2020 aplicado diluidamente em 12 meses, contados a partir de janeiro de 2021. A despesa deve se sobrepor, portanto, ao reajuste de planos relativos ao ano de 2021, a depender do mês do contrato.

A situação tem impacto ainda maior para os aposentados, que, além de pagarem valores mais altos pelos planos, não receberão o 13º em dezembro – o pagamento das parcelas do benefício foi antecipado no primeiro semestre deste ano em decorrência da pandemia. “Há uma mudança na dinâmica do orçamento na virada de 2020 para 2021 que (as pessoas) devem ter muito cuidado”, alerta o economista Ricardo Eleutério.

A alta nos preços da energia, por sua vez, já é sentida em dezembro por conta da aplicação do segundo patamar da bandeira vermelha, com taxa extra de R$ 6,24 a cada 100 kWh. Até então, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vinha praticando a bandeira verde, sem cobrança de taxa extra, mas adotou o mecanismo para compensar o acionamento das termelétricas por conta da seca nos reservatórios do Sudeste.

Entre os preços administrados ainda há o impacto da alta dos combustíveis. A avaliação do mercado é que, com a queda no preço do petróleo no mercado internacional, os combustíveis devam fechar o ano em baixa, mas que tenham novos aumentos no próximo ano com a retomada da atividade econômica e o controle da pandemia.

“Os preços administrados podem ter uma alta ainda mais robusta nos próximos meses, porque eles foram contidos neste ano por causa da pandemia”, aponta Eleutério. “A expectativa é que a gente continue com esse processo de pressão inflacionária no ano que vem”.

Um levantamento feito pelo economista Andre Braz, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) confirma a análise. O estudo revela que os preços de insumos da cadeia produtiva nacional alcançaram a maior alta desde o início do Plano Real. A pressão do aumento é tamanha que está espalhando a inflação, antes concentrada no produtor, por vários setores da economia, chegando ao consumidor.

Ontem, o Relatório de Mercado Focus, divulgado pelo Banco Central, mostrou um aumento da expectativa para a inflação oficial de 2020 de 3,54% para 4,21% em uma semana, após a aplicação da bandeira tarifária pela Aneel.

Alimentação

Já em escalada há meses, o preço dos alimentos ainda vai continuar pesando sobre o orçamento dos cearenses nesse início de ano. A tendência de encarecimento de alguns produtos deve continuar enquanto a oferta dos itens não se normalizar, conforme indica o analista de mercado da Central de Abastecimento do Ceará (Ceasa), Odálio Girão.

Ele aponta que produtos da cesta básica que já estão com aceleração de preços, como o óleo, arroz, feijão, milho, leite, carne e batata-inglesa, devem continuar neste cenário. “Nós tivemos uma redução da colheita da batata-inglesa no Nordeste e no Sudeste, de forma que o preço acelerou. É um item que pesa muito na cesta básica”, aponta.

No caso de arroz, feijão e milho, que já vêm em tendência de alta há alguns meses, ele explica que a pandemia é um dos motivos para o aumento de preços. “Vamos continuar nesse patamar de alta. A pandemia fez os preços subirem e agora essa ameaça de segunda onda faz eles permanecerem bastante elásticos”.

A exportação em larga escala da carne e soja, assim como do arroz, também deve continuar. O analista explica que a normalização dos preços depende das condições climáticas e consequente safra. “Com uma boa produção, teremos condições de melhor abastecer o mercado nacional, mas depende do fator climático para, pelo menos, nos mantermos nos patamares que estamos, sem novos aumentos”, projeta.

Neste fim de ano, os alimentos típicos desta época também devem ficar ainda mais caros por conta do câmbio. Vindos de outros países, itens como ameixa, damasco, uva passas e avelã sofrem uma escalada de preços com a alta do dólar. “As frutas frescas e secas de um modo geral estão com preços bastante elevados. O consumidor precisa de um jogo de cintura muito bem feito para manter a mesa bem abastecida”, aponta.

Em novembro, o conjunto dos 12 produtos que compõem a cesta básica de Fortaleza registrou uma alta de 5,64%, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômi-cos (Dieese). Segundo o órgão, o preço da cesta básica na Capital foi puxado pela subida de dez produtos, com destaque para o óleo (10,08%), a banana (8,56%), o pão (7,58%), o leite (6,58%), a carne (6,05%) e o tomate (6,01%). 

Câmbio

Por outro lado, o avanço da inflação poderá ser atenuado ao longo de 2021 tanto pela queda do dólar como pela reorganização da cadeia de suprimento da indústria, que sofreu com a falta de insumos após a reabertura da economia, ocasionando pressão sobre os preços. O mercado reduziu as estimativas para o dólar no fim do ano, a R$ 5,22.

A queda da moeda deverá atenuar a pressão inflacionária sobre o preço de commodities, como o trigo, que têm impacto direto no preço do pão e massas em geral, combustíveis e produtos importados. Embora considere significativa a forte revisão das expectativas do Banco Central para a inflação deste ano, o economista Lauro Chaves, conselheiro federal de economia e professor da Uece, diz que essa alteração não deve “gerar alarmismo no mercado”. “O ano de 2020 foi totalmente atípico. Vamos fechar com uma queda do PIB em torno de 5%. E mesmo com essa mudança de patamar, teremos uma inflação dentro da meta estipulada para o ano”, diz.

Para 2021, Chaves diz que os resultados da inflação dependerão muito do crescimento da economia e do comportamento dos setores mais afetados em 2020. “O crescimento da taxa de inflação neste ano foi localizado em alguns setores, não foi homogêneo. Em alguns setores tivemos choques de oferta e em outros tivemos a destruição das cadeias de suprimento. O importante agora é olhar para 2021, em que há uma expectativa de crescimento mais robusto do PIB, em torno de 3,5%, com a inflação sob controle”.

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