Produtores de camarão defendem imposto de 100% contra entrada de produto importado do Equador
Para o setor, Brasil não precisa comprar de fora o crustáceo, e pode retomar protagonismo internacional com ações governamentais
O presidente da Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), Itamar Vieira, não poupou críticas ao crescente volume de camarão importado pelo Brasil, sobretudo vindo do Equador.
Em entrevista para o Diário do Nordeste nesta quarta-feira (27) durante a Expolog 2024, realizada no Centro de Eventos do Ceará, o gestor ainda defendeu que a alíquota de importação saia dos atuais 9% e passe para 100%, pois além de proteger a indústria brasileira, protege a própria criação do crustáceo no País.
Podia botar esse imposto a 100%, porque imposto não mata vírus. Não queremos que o camarão venha. Para o Equador, se botasse de graça, ainda saía ganhando. O Brasil é o país que já incomodou o Equador, porque já exportamos mais do que ele. Na França, já chegamos a ter 28% das importações. Para o Equador, funciona assim: 'bota o camarão para o Brasil, porque o Brasil pega as doenças e não vai incomodar a gente'.
Itamar explica que a produção do Equador, atualmente, é bem maior do que a do Brasil. Ao lado da Índia, o país sul-americano é o maior produtor mundial do alimento, e tinha a China como principal mercado exportador.
"Lá, os grandes são realmente grandes. Só uma empresa de lá exportou US$ 1,2 bilhão. Não queremos que venha o camarão, temos é que proteger. Temos milhares de micro e pequenos produtores não usando o camarão na água salgada, mas sim na água doce, que não é a do camarão. Nesse processo de osmorregulação, o camarão gasta toda a energia e fica sem defesa para poder se defender de um vírus de fora. As pessoas não conhecem, precisamos ter noção", alerta.
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Na palestra realizada na Expolog sobre carcinicultura, como é conhecida a produção de camarão em cativeiros, seja de água salgada ou doce, Itamar traçou um paralelo entre as doenças no crustáceo do Brasil e do Equador. Segundo o presidente da ABCC, o animal do país equatoriano tem 13 doenças, enquanto o brasileiro é acometido de somente quatro, já mapeadas e controladas pelos produtores.
"Não precisamos importar camarão, é um equívoco muito grande do Governo. Um país que tem a capacidade de produzir como o Brasil não pode estar importando. O camarão é um vetor de todas as doenças, que vieram sempre nas importações. Eles têm diversas doenças que vêm se revelando uma mais violenta do que a outra. O Brasil só tem quatro doenças que atingem os camarões, e para quê vai correr risco de trazer mais doenças?", reflete.
Importação de camarão é "crime de lesa-pátria"
De acordo com os dados de exportação e importação brasileiras, disponíveis na plataforma Comex Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o camarão equatoriano está cada vez mais presente no Brasil.
Na seção que contempla "outros camarões, congelados", o Brasil importou, entre janeiro e outubro de 2024, cerca de 2,1 mil toneladas (t) do crustáceo. Esse valor é 138,6% maior do que tudo o que foi comprado pelo País do exterior no ano passado: 880 t. O valor investido foi de US$ 16,53 milhões.
Assim como em 2023, o Equador corresponde a maior parte das importações, com 928 toneladas compradas pelo Brasil. Isso representa 44,2% de tudo o que foi importado de camarão pelo País.
Estados Unidos e a Europa têm que importar camarão porque não produzem. A China, mesmo sendo uma grande produtora, não tem capacidade de atender todo o mercado, e já tem todas as doenças. O Brasil não era para importar, de jeito nenhum, considero isso um crime de lesa-pátria.
Durante a pandemia, irregularidades sanitárias foram encontradas em lotes de camarão equatoriano, fazendo com que a China suspendesse a importação do animal. Com uma produção acima do necessário e com estoques lotados de camarão, a saída encontrada pelo Equador foi negociar com outros países. Um deles é o Brasil que, em condições normais, tem condições de competir com a criação equatoriana, mas produtores brasileiros alegam que o País sul-americano vem praticando dumping.
"Queremos entrar com uma ação contra a importação do camarão do Equador, e estamos defendendo abrir o mercado para a China, que poderia substituir muito bem a Europa", decreta Itamar Vieira.
Brasil não exporta mais camarão no mesmo volume do passado
O presidente da ABCC relembra um episódio ocorrido em 2018, quando foram encontradas irregularidades em um barco de pescados em Santa Catarina. A embarcação, que pescava camarão do mar (e não dos cativeiros, que concentram a maioria dos crustáceos produzidos no País), levou à União Europeia a colocar um embargo contra as importações do animal para os países-membros.
"Pegaram um barco em Santa Catarina que não tinha banheiro e mandaram o Ministério da Agricultura defender. O Ministério não defendeu, e botaram o camarão de cultivo, que não tem nada a ver com o camarão do mar, que o Brasil não exporta, e botaram na sanção. Essas variações na política do Brasil fizeram a gente sofrer, mas a sanidade não veio junto", lamenta Itamar Vieira.
Conforme o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), sanidade "tem por finalidade garantir a sustentabilidade dos sistemas de produção de animais aquáticos e a sanidade da matéria-prima obtida a partir dos cultivos nacionais". No caso da carcinicultura, isso inclui boas práticas da água onde os crustáceos vivem e o controle de pragas e doenças.
Sem Europa, China é meta para exportações de camarão brasileiras
Com o embargo da União Europeia, o próximo passo do mercado brasileiro de crustáceo — do qual o Ceará é o maior produtor e representa quase 60% de toda a produção, segundo dados de 2023 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) — é a China. O foco é principal enviar o camarão cinza, que é de tamanho menor do que o de outros países.
"A China precisa do nosso camarão, lá se transforma tudo porque precisa gerar empregos. Estão comprando camarão do Equador, de 30 a 40 gramas, da Índia e da Tailândia, de 18 a 25 gramas. Nenhum país desses têm camarão pequeno ou médio, o Brasil é o único que tem e vai atender na base da pirâmide de consumo da China, que é gigantesca, que pode pagar US$ 4 pelo quilo do camarão, mas ainda não estamos abertos", expõe Itamar Vieira.
Com a abertura para o mercado chinês, a expectativa é de que o Nordeste capitaneie e lidere as exportações de camarão do Brasil. O presidente da ABCC elenca as vantagens do crustáceo brasileiro criado na região, principalmente com uma produção interiorizada e distante do litoral.
"É uma atividade enquadrada nas condições do Nordeste: falta de chuva, clima alto e seca se enquadra perfeitamente para o camarão, e está estruturando uma ordem econômica que prevê a reversão do êxodo rural. É um desafio intransponível do ponto de vista de política pública", pondera.
A reportagem demandou o MAPA e o MDIC para entender sobre a necessidade de importação de camarão e como estão atualmente as exportações do crustáceo pelo País. Quando houver retorno da demanda, este material será atualizado.