Quais os caminhos da sucessão bem-sucedida em empresas familiares

Escrito por
Delania Santos producaodiario@svm.com.br
Legenda: Nem todo herdeiro está preparado ou deseja assumir o comando do negócio da família
Foto: Shutterstock

As empresas familiares são protagonistas da economia brasileira. Representam mais de 90% dos negócios no país e geram milhões de empregos. Ainda assim, quando o assunto é continuidade, os números acendem um alerta: poucas sobrevivem à passagem de bastão para a segunda geração, e ainda menos alcançam a terceira.

Segundo o IBGE, apenas 36% das empresas familiares sobrevivem à segunda geração. Os principais motivos para essa baixa taxa de sobrevivência estão diretamente ligados à falta de preparo para a transição. Três fatores se destacam:

  • Apego e centralização excessiva de poder: Muitos fundadores têm dificuldade em delegar, abrir espaço para novas ideias e confiar na capacidade da geração seguinte. Esse comportamento não apenas limita o crescimento e a inovação do negócio, como também atrasa decisões cruciais sobre o futuro. A transição, quando deixada para o último momento, tende a acontecer em meio a tensões e urgências, gerando conflitos que poderiam ser evitados com planejamento e diálogo. O resultado é um processo sucessório desorganizado e distante da harmonia desejada.
  • Conflitos familiares: quando a empresa é uma extensão da casa, sem fronteiras claras entre o que é profissional e o que é pessoal, as disputas emocionais acabam contaminando a gestão. Muitos desentendimentos são atribuídos à rotina do dia a dia, mas, na verdade, podem refletir a vulnerabilidade da base familiar. 
  • Falta de um planejamento sucessório adequado: muitos negócios subestimam a importância de preparar a família e os herdeiros para a transição. Ignoram etapas essenciais, como definir critérios objetivos para a sucessão, desenvolver competências nos futuros líderes e estruturar um plano claro que envolva, de forma ativa, tanto o sucedido quanto o sucessor. Sem esse preparo, a sucessão ocorre de maneira improvisada, gerando inseguranças e riscos para a continuidade da empresa.
  • Ignorar a ancestralidade da empresa: na ânsia de inovar, a segunda geração pode desconsiderar o legado e a história das pessoas que construíram o sucesso da organização. Um sucessor que valoriza as raízes, os valores e as práticas da empresa tem mais chances de inovar em base sólida e engajar os colaboradores em torno do mesmo propósito. 

Profissionalizar, portanto, não significa afastar a família ou romper com a história do negócio. Significa, sim, criar mecanismos que garantam sua perenidade. Envolve estabelecer governança, clareza de papéis, meritocracia e, sobretudo, maturidade para lidar com as transições inevitáveis.

Veja também

O que fazer para garantir a perpetuidade do negócio familiar?

1. Iniciar cedo o diálogo sobre sucessão: conversar sobre o futuro não enfraquece o presente — fortalece. Quanto antes se começa a preparar os sucessores, mais natural será a transição. Mesmo sem clareza sobre o caminho a seguir, amadurecer este diálogo é um passo importante para que a transição seja bem-sucedida. 

2. Implantar práticas de governança: conselhos consultivos, acordos entre sócios, reuniões periódicas e regras claras ajudam a separar a emoção da gestão e profissionalizam a tomada de decisão.

3. Desenvolver os membros da família com base em meritocracia: Pertencer à família não pode ser o único passaporte para cargos de liderança. É fundamental que os herdeiros estejam preparados técnica e emocionalmente para assumir responsabilidades no negócio. Quando isso não acontece, eles enfrentam dificuldades para construir autoridade, sentem-se inseguros diante dos desafios da gestão e, muitas vezes, acabam desmotivados — o que pode levá-los a buscar outros caminhos profissionais, afastando-se da empresa.

4. Buscar apoio externo quando necessário: mentores, consultores e advogados podem oferecer a isenção e o olhar estratégico que, muitas vezes, faltam dentro da família. É importante coletar referências desses profissionais e investigar sua conduta ética. Lidar com o futuro da família requer muita experiência, sensibilidade e sobretudo ética profissional. 

5. Preservar a cultura sem resistir a mudanças: valores são legados importantes, mas não devem impedir a evolução. Saber o que manter e o que transformar é o segredo para seguir relevante. Negócios que resistem ao tempo entendem que a profissionalização não é uma ameaça à identidade da família — é o que torna possível que essa identidade continue existindo nas próximas décadas.

Quando o herdeiro não tem perfil para ser sucessor ou não deseja isso para sua carreira? 

Nem todo herdeiro está preparado ou deseja assumir o comando do negócio da família. E isso não deveria ser um tabu. Forçar uma sucessão apenas por laço sanguíneo pode ser prejudicial tanto para o herdeiro quanto para a empresa.

Com mais de dezesseis anos de experiência atuando como mentora executiva, posso garantir que as duas situações são extremamente delicadas. O sucedido alimenta expectativas sobre esse momento, e não contar com a participação do filho ou da filha na liderança muda tudo.

Contemplar a possibilidade de que um profissional de mercado assuma o cargo que, em tese, seria do herdeiro requer uma mentalidade muito flexível e uma visão altamente estratégica.

O papel da família, nesse caso, é acolher essa escolha com maturidade e buscar caminhos alternativos: seja capacitando um profissional de fora para ocupar a liderança, seja envolvendo o herdeiro em outro papel relevante, como conselheiro ou sócio.

Sucessão responsável é aquela que respeita vocações, preserva relacionamentos e garante a continuidade do negócio com competência e legitimidade.

Por fim, é preciso compreender que a profissionalização não elimina o caráter familiar da empresa, ela o fortalece. Quando bem conduzido, esse processo transforma a herança em alicerce e não em obstáculo, permitindo que o negócio se renove sem perder sua essência.

Se o desafio da primeira geração foi construir, o da segunda é perpetuar. E isso exige coragem para rever práticas, humildade para aprender com o passado e sabedoria para conduzir o presente de forma mais consciente e preparada.

Nesta coluna, trarei reflexões sobre carreira, liderança, coaching e tendências que impactam o mundo do trabalho. Sua participação é muito bem-vinda! Deixe sua pergunta, comente este post ou envie uma mensagem pelo Instagram: @delaniasantosds. Aproveite para se inscrever no canal do YouTube: @delaniasantosds. Será um prazer ter você comigo nessa jornada. Até a próxima!

Assuntos Relacionados