Paracuru e Pentecoste concentram criação de búfalos, e rebanhos crescem 20% no Ceará

Estado tem condições climáticas favoráveis para a produção do animal

Escrito por
Paloma Vargas paloma.vargas@svm.com.br
Imagem mostra campo com mais de 5 búfalos pastando.
Legenda: Bubalinos ainda têm pequena ppulação no Ceará, mas características da criação são favoráveis para clima do Estado.
Foto: Divulgação/ Fazenda Laguna

O Ceará ocupa a quarta posição na criação de búfalos no Nordeste e o 21º lugar no cenário nacional em 2024, com um rebanho de 1.763 cabeças, de acordo com a Pesquisa da Pecuária Municipal (PPM), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Apesar de ainda pouco representativa no Ceará, a bubalinocultura vem crescendo devido ao mercado de alto valor agregado e à boa adaptação dos animais ao clima local.

Carne, queijos e leite de búfala são voltados para a alta gastronomia, apresentam perfil mais saudável e têm alto potencial de expansão.

Nos últimos 10 anos, o rebanho cearense cresceu quase 19,9%, ao passar de 2014 para 2024. Entre 2023 e 2024, a alta foi modesta, de 0,28%, mas suficiente para fazer o Ceará ganhar uma posição no ranking nacional. 

Para fontes especializadas, a atividade pode se consolidar como uma alternativa rentável para o Estado. Nesse contexto promissor, destaca-se o projeto de fertilização in vitro (FIV) de búfalos desenvolvido pela Universidade Estadual do Ceará (Uece). 

Maranhão lidera ranking do Nordeste

No Nordeste, o Maranhão concentra o maior rebanho de búfalos, com 95.152 cabeças, seguido por Bahia (23.571), Pernambuco (10.916) e Ceará (1.763). Veja ranking abaixo. 

  1. Maranhão - 95.152
  2. Bahia - 23.571
  3. Pernambuco - 10.916
  4. Ceará - 1.763
  5. Alagoas - 1.669
  6. Rio Grande do Norte - 1.664
  7. Paraíba - 761
  8. Piauí - 532
  9. Sergipe - 454

*Números do rebanho em 2024 - Fonte IBGE

No Brasil, a produção soma mais de 1,8 milhão de cabeças. O Pará lidera com folga, com 775.075 animais, seguido do Amapá, com 340.448. Na outra extremidade, quatro estados registram menos de mil cabeças: Paraíba, Distrito Federal, Piauí e Sergipe.

Por que o rebanho de búfalos ainda é pequeno no Ceará?

Para o professor do Departamento de Economia Agrícola e do Programa de Pós-Graduação em Economia Rural da Universidade Federal do Ceará (UFC), Kilmer Coelho Campos, a ausência de uma grande criação de búfalos no Estado está relacionada, primeiramente, a uma questão cultural, já que “não é tradição do Estado”.

Imagem mostra local de criação de búfalos na Fazenda Laguna, em Paracuru.
Legenda: Fazenda laguna, em Paracuru, está investindo na produção de matrizes.
Foto: Divulgação/ Fazenda Laguna

"Há também o desconhecimento sobre a atividade, já que os produtores estão adaptados à bovinocultura e à caprino-ovinocultura", explica.

Outro fator apontado por ele são os altos investimentos em capital fixo e de giro necessários para desenvolver a atividade, além da dificuldade de comercialização do produto e de seus derivados.

Sobre a possibilidade de aumento do rebanho de bubalinos no Estado, o economista afirma que é viável e que, inclusive, poderiam ser utilizadas as mesmas estruturas de outras criações, com adaptações e investimentos, sobretudo em tecnologias e manejo.

“Porém, como em tudo, o aumento da criação gira em torno da lei da oferta e da demanda. Os resultados dependem da procura por carne e derivados e viriam a médio e longo prazos”, reforça.

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Rebanhos de búfalos estão concentrados em 38 municípios do Ceará 

Ao todo, 38 municípios possuem rebanhos de búfalos no Ceará. Os três com maior número são Paracuru (570), Pentecoste (270) e Sobral (257). Além disso, chama a atenção que 35 têm menos de 100 cabeças, sendo que, desses, 15 registram menos de 10 animais. Veja lista abaixo:

  1. Paracuru - 570
  2. Pentecoste - 270
  3. Sobral - 257
  4. Caucaia - 95
  5. Tianguá - 72
  6. Crato - 70
  7. Itaitinga - 38
  8. Ibiapina - 35
  9. Miraíma - 31
  10. Itarema - 28
  11. Beberibe - 27
  12. Guaiúba - 26
  13. Pacajus - 21
  14. Senador Pompeu - 20
  15. Morada Nova - 19
  16. Juazeiro do Norte - 19
  17. Quixadá - 18
  18. Maranguape - 16
  19. Santana do Cariri - 14
  20. Aquiraz - 12
  21. São Benedito - 11
  22. Santana do Acaraú - 10
  23. Capistrano - 10
  24. Ipu - 9
  25. Tejuçuoca - 8
  26. Irauçuba - 8
  27. Forquilha - 7
  28. Jaguaretama - 6
  29. Ipueiras - 6
  30. Ubajara - 5
  31. Tururu - 5
  32. Cedro - 4
  33. Antonina do Norte - 4
  34. Uruoca - 3
  35. Palmácia - 3
  36. Guaramiranga - 3
  37. Pedra Branca - 2
  38. Tauá - 1

*Números do rebanho em 2024 - Fonte IBGE

Por que Paracuru tem o maior rebanho do Ceará? 

O município com maior número de búfalos no Ceará é Paracuru, posição que se deve principalmente ao plantel da Fazenda Laguna. Referência na América Latina no segmento, o local possui atualmente cerca de 570 cabeças, número registrado pelo IBGE em 2024 para o município.

Conforme Marcelo Prado, diretor da Fazenda Laguna, os primeiros búfalos chegaram em 1992. Ele comenta que há outros criadores no estado, mas focados na produção de leite.

“De forma sistemática, com trabalho mais rigoroso e maior controle na seleção e nos processos, só temos a Laguna”, diz.

Imagem mostra vista aérea da Fazenda Laguna em Paracuru.
Legenda: Fazenda Laguna, reconhecida na América Latina pela criação de bubalinos e fabricação de produtos derivados do leite, tem o maior plantel do Estado.
Foto: Divulgação/ Fazenda Laguna

Do rebanho atual, que inclui animais recém-nascidos e os mais velhos, aproximadamente 200 são matrizes. A quantidade de cabeças em relação às matrizes se deve aos trabalhos de seleção e genética.

“Seguramos nossos machos até a idade adequada para definir se serão reprodutores. Como temos mercado para reprodutores e matrizes, mantemos o plantel até o momento ideal para venda”, explica.

A Fazenda Laguna produz quase uma dezena de derivados de leite de búfala, incluindo queijo tipo burrata, mussarela, requeijão e ricota. Atualmente, 100% do leite produzido é destinado à queijaria.

“São produtos de valor agregado que conseguimos diferenciar em sabor e qualidade”, destaca Prado.

Características e vantagens da bubalinocultura

O empresário acredita que a ausência de outros produtores se deve à pouca divulgação da atividade. “A própria Laguna foi bastante discreta nesses 33 anos de criação. Poderíamos ter feito mais para divulgar o búfalo", relata. 

Ele ressalta que a bubalinocultura é uma opção interessante para o Ceará. “No litoral, temos vantagem por causa do índice pluviométrico, mas também é viável no sertão central”, observa.

Sobre a previsão de aumento do rebanho, Prado explica que segue planejamento estratégico definido pela queijaria. “Temos o objetivo de dobrar a produção de leite nos próximos cinco anos. A fazenda precisa crescer junto, cerca de 20% ao ano, para atingir entre quatro e cinco mil litros de leite de búfalo por dia até 2030”, projeta. 

Fertilização in vitro é opção para aumento de rebanho no Ceará

Pesquisadores do Laboratório de Fisiologia e Controle da Reprodução da Faculdade de Veterinária (FAVET) da Uece, em parceria com a Fazenda Laguna, desenvolvem um projeto de fertilização in vitro (FIV).

O Ceará se tornou recentemente o quarto estado brasileiro a registrar nascimento de búfalos por FIV, após Pará, Minas Gerais e São Paulo, regiões com tradição na bubalinocultura.

Imagem mostra rosto de búfalo molhado de perto.
Legenda: Búfalos são os animais domésticos mais dóceis, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Foto: Arquivo pessoal

Segundo o professor Vicente Freitas, do laboratório, foram dois filhotes nascidos este ano pelo processo. O objetivo é aprimorar geneticamente o rebanho, coletando óvulos de búfalas superiores, fecundando-os em laboratório com sêmen de machos geneticamente selecionados e implantando os embriões em fêmeas receptoras.

O projeto de FIV começou na Uece em 2020 com a chegada do médico veterinário indiano Satish Kumar, especialista em reprodução de búfalos. O laboratório já havia obtido anteriormente os primeiros caprinos transgênicos da América Latina, tornando-se referência na técnica.

Por que a criação de búfalos pode ganhar mais espaço no Ceará?

A engenheira agrônoma Patrícia Guimarães Pimentel, professora associada do Departamento de Isotecnia da Universidade Federal de Ceará (UFC), explica que os búfalos domésticos são considerados pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) os animais domésticos mais dóceis, o que facilita o manejo quando tratados adequadamente.

Mulher com a cabeça encostada na cabeça de um bezerro bubalino.
Legenda: Engenheira Agrônoma Patrícia Pimentel defende a produção de bubalinos como rentável e de alto valor agregado.
Foto: Arquivo Pessoal

Ela aponta como vantagens da criação o leite de alta qualidade, com mais proteína, lipídios saudáveis, cálcio e fósforo do que o leite bovino, garantindo maior rendimento na produção de derivados. 

A carne também apresenta melhor valor nutricional em comparação à bovina. Além disso, aponta, os búfalos têm menor incidência de doenças comuns aos bovinos e podem ser usados para transporte e trabalho, sendo chamados de “Trator Vivo do Oriente”.

Ainda sobre as vantagens de criação, a engenheira agrônoma reforça a capacidade do animal de digerir fibras, principalmente de volumosos, como a pastagem, os capins cultivados, silagens e fenos, entre outros. O bubalino também tem uma digestão desse alimento de forma mais eficiente. 

"E por que eu estou falando isso? Porque a alimentação compõe mais da metade dos custos de produção na atividade. Então, o que você conseguir baratear nesse aspecto faz com que a produção se torne mais rentável", explica a especialista.

Sobre o consumo, Patrícia explica que a população não consome mais por falta de conhecimento. "Atribuo esse pequeno rebanho que nós constatamos aqui no Ceará à falta de conhecimento sobre a espécie e os benefícios que ela oferece", avalia.

"No Brasil todo e até mesmo no mundo, nunca ouvi falar de alguém que tenha trocado a atividade da bovinocultura pela bubalinocultura e tenha se arrependido. Pelo contrário, investe-se mais nesses animais, porque são mais rentáveis, inclusive para pequenas propriedades", enfatiza. 

Caracterísitcas e vantagens da bubalinocultura

A engenheira agrônoma observa que uma das principais dúvidas dos produtores refere-se à suposta necessidade de disponibilizar água para a imersão dos animais. No entanto, ela esclarece que essa prática pode ser totalmente dispensada, desde que sejam asseguradas condições adequadas de criação.

"Ele é um animal de hábito semiaquático, ou seja, tem a capacidade de mergulhar a cabeça na água para pegar a forragem submersa, coisa que o bovino não faz. Então, em lugares que têm, em determinadas épocas do ano, forragem submersa, o búfalo consegue aproveitar", esclarece.

"Mas não necessariamente ele necessita de água para imersão. Ele gosta, até nós gostamos, mas não é necessário. O que ele precisa é de conforto térmico", completa.

Imagem mostra um búfalo adulto com o focinho sujo de lama.
Legenda: Búfalos não precisam ter local de imersão, podendo ser alternativa para a produção pecuária no sertão
Foto: Arquivo pessoal

Patrícia acredita que, se houvesse mais pequenos produtores, inclusive a fazenda que tem no estado receberia o leite, aumentando a cadeia produtiva. E, sobre os preços para consumo, ela diz que, atualmente, são bem competitivos e facilitam o consumo.

"Se vocês visitarem mais as geladeiras nos supermercados, irão verificar que o preço, às vezes, empata ou é até inferior ao dos produtos de bovinos, sendo que é mais saudável", afirma. 

Para tentar desmistificar ainda mais a criação dos animais, em novembro, Fortaleza recebe pela primeira vez um encontro brasileiro de bubalinocultores, o que possibilita ampliar ainda mais o conhecimento e disseminar as informações corretas sobre os búfalos no país.

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