O que muda com a administração da Infraero nos dez aeroportos regionais do Ceará?

Empresa pública nacional ficará responsável, pelos próximos cinco anos, pela gestão das praças aeroportuárias no Estado

Escrito por Luciano Rodrigues , luciano.rodrigues@svm.com.br
Foto que contém o Aeroporto Regional de Jericoacoara
Legenda: Aeroportos Regionais do Ceará serão geridos pela Infraero
Foto: Ingrid Coelho/Diário do Nordeste

Começou a valer no último dia 28 de agosto a administração e a operação da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) nos dez aeroportos públicos do Ceará homologados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). 

Os dez aeroportos ficam em diferentes cidades pelo interior do Estado. Neles, ficará a cargo da Infraero atividades como “fiscalização operacional, vistorias e inspeções, segurança aeroportuária, meio-ambiente, comercialização de áreas externas, manutenções preventivas”.

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As tratativas entre Governo do Ceará e a empresa federal começaram há dois meses, sendo formalizado o contrato entre ambas as partes há duas semanas no Palácio da Abolição.

A Infraero “será remunerada a partir das arrecadações tarifárias e comerciais dos aeroportos”, conforme o Governo do Estado. O tempo de contrato é de 60 meses, durando até agosto de 2028, e representa aos cofres do Ceará economia de R$ 22 milhões.

Aeroportos públicos do Ceará sob a administração da Infraero:

  • Aeroporto Regional de Canoa Quebrada Dragão do Mar (Aracati);
  • Aeroporto de Camocim (Camocim);
  • Aeroporto de Campos Sales (Campos Sales);
  • Aeroporto de Crateús (Crateús);
  • Aeroporto Comandante Ariston Pessoa (Cruz-Jericoacoara);
  • Aeroporto de Iguatu (Iguatu);
  • Aeroporto de Quixadá (Quixadá);
  • Aeroporto Walfrido Salmito de Almeida (São Benedito);
  • Aeroporto Dr. Luciano de Arruda Coelho (Sobral);
  • Aeroporto Pedro Teixeira Castelo Regional Tauá (Tauá).

Dos dez aeroportos, seis recebem voos comerciais. Apenas em Cruz-Jericoacoara aterrissam aviões de outras cidades de fora do Ceará, sendo o equipamento público com o maior número de pousos e decolagens no Estado.

Anteriormente, Aracati recebia voos de fora do Ceará, mas as frequências foram encerradas. O aeroporto da cidade, assim como os de Crateús, Iguatu, São Benedito e Sobral, têm operações regulares para a capital cearense.

Camocim, Campos Sales, Quixadá e Tauá apresentam frequências atualmente exclusivas da aviação geral, isto é, voos particulares de pequenas aeronaves e táxi-aéreo.

A gestão da empresa pública nacional não inclui os serviços prestados nos aeroportos de Juazeiro do Norte e o internacional de Fortaleza. Atualmente, os dois equipamentos estão concedidos para a iniciativa privada.

Melhorias e expertise

As atuações conjuntas entre Governo do Estado e Infraero foram bem recebidas por especialistas em aviação ouvidos pelo Diário do Nordeste.

Para Alessandro Oliveira, professor do Instituto Tecnológica da Aeronáutica (ITA), a experiência da empresa pública nacional na administração dos aeroportos deve ser positiva para os equipamentos.

"A Infraero administrar aeroportos regionais não é nenhum problema, ainda mais nesse setup atual que temos de privatizações, que vão acontecendo à medida que se definem os parâmetros de lucratividade dos aeroportos. Não é uma solução de mercado, mas a gente sabe que pelo interior do Brasil nem sempre a demanda se viabiliza. Depende muito da avaliação dos ativos e de crescimento econômico", explica.

Já para Heber Oliveira, professor do departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), o poder público dos dez municípios também precisa estar envolvido nas operações do aeroporto com objetivo de o equipamento atingir o êxito esperado.

É uma empresa pública que já tem uma expertise de administrar aeroportos muito grandes no País e agora vai administrar aeroportos regionais. Em contrapartida, precisa existir um apoio dos municípios para fazer valer essa gestão. Um aeroporto não é só um aeroporto, é um equipamento que precisa ter toda uma infraestrutura de acessos, para cargas. Tem toda uma questão em torno do aeroporto em si para fazê-lo realmente funcionar"
Heber Oliveira
Professor do departamento de Engenharia de Transportes da UFC

A conservação e o padrão dos aeroportos é outro ponto salientado por Heber Oliveira, que elogia o bom estado da maioria dos equipamentos estaduais e prevê aprendizado com a situação de espaços como Aracati, Cruz-Jericoacoara e Sobral.

Foto que contém o Aeroporto Regional de Sobral
Legenda: Aeroportos regionais devem passar por melhorias
Foto: Fabiane de Paula

"Já temos aeroportos de bom porte como Jericoacoara, Aracati, Sobral mais recentemente, com terminais de passageiros e pistas para aeronaves de pequeno e médio porte. Se algum aeroporto quiser trabalhar com a aviação um pouco maior, precisa fazer alguma melhoria e também fazer o atendimento daquilo que está regulamentado pela Anac”, expõe.

SITUAÇÃO DOS AEROPORTOS

Um dos pontos que levaram à privatização são as melhorias que devem ser feitas na operação aeroportuária e na infraestrutura.

Com exceção de três aeroportos, inaugurados nos últimos anos (Aracati em 2012, Cruz-Jericoacoara em 2017 e Sobral em 2022) e habilitados para pousos e decolagens de aeronaves, a maioria dos equipamentos foi entregue para operações de aviões de pequeno porte.

Esse é um dos gargalos que devem ser resolvidos pela Infraero na visão de Alessandro Oliveira. O professor do ITA infere que a expertise da empresa federal pode contribuir para aumentar a aeronavegabilidade dos aeroportos e a infraestrutura de acessos e envio e recebimento de cargas.

"Pelo fato de não ter necessariamente fins lucrativos, a Infraero pode administrar com a visão de longo prazo o aeroporto. A primeira questão é manter os aeroportos em condições de operações, se ela mantiver fazendo obras, reparos e manutenções que forem necessárias, e a gestão já resolver o problema de mantê-los aptos à operação. Então, em algum momento, alguma companhia aérea pode se interessar", argumenta.

Alessandro conclui usando como exemplo o Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas que, no início dos anos 2010, era um equipamento subutilizado. Em 2023, o local já é um dos cinco aeroportos mais movimentados do Brasil.

“O aeroporto ficou muitos anos ocioso. Quando a Azul entrou lá, tinha pouco mais de 800 mil passageiros. Em poucos anos, chegou a 10 milhões de passageiros. Quando você tem o ativo disponível, a companhia aérea pode de alguma forma querer usar aquilo e descobrir demanda. Pode ser também uma manutenção de ativo estratégico no interior, que é uma questão política também”.

INFRAESTRUTURA 

Segundo a Anac, os aeroportos estão divididos de acordo com as operações de pousos e decolagens. Há os equipamentos que operam em VFR (traduzido para regras para pouso visual) e IFR (traduzido para regras para pouso por instrumentos), seja em dia claro (diurno) ou escuro (noturno).

No Ceará, dos dez equipamentos administrados pela Infraero, apenas dois podem operar em VFR e IFR diurno e noturno: Aracati e Cruz-Jericoacoara. 

Foto que contém a pista do aeroporto de Sobral
Legenda: Aeroporto Regional de Sobral foi inaugurado há pouco mais de um ano
Foto: Fabiane de Paula

Outros sete aeroportos operam apenas em VFR diurno e noturno. Em Quixadá, os pousos e as decolagens podem ser feitos somente durante o dia seguindo regras de voo visuais.

No que diz respeito às pistas dos aeroportos, todos, incluindo os dois privatizados, têm pista única. Os equipamentos com frequências comerciais têm as maiores áreas de pista. 

Confira a lista dos aeroportos do Ceará por tamanho da pista:

  1. Fortaleza: 2.755 m;
  2. Cruz-Jericoacoara: 2.200 m;
  3. Juazeiro do Norte: 1.940 m;
  4. Aracati e Sobral: 1.800 m;
  5. Crateús e São Benedito: 1.500 m;
  6. Iguatu: 1.422 m;
  7. Camocim, Campos Sales, Quixadá e Tauá: 1.200 m.

A pista do aeroporto de Quixadá teve obras autorizadas de expansão. Segundo o secretário de Obras Públicas do Ceará, Quintino Vieira, o local será ampliado em 500 metros, contando com 1.700 metros para pousos e decolagens. O investimento será de R$ 18 milhões.

Heber Oliveira rechaça a possibilidade de uma possível privatização desses aeroportos com a gestão pela Infraero, e acredita que toda a cadeia econômica produtiva do Estado e do município deve ter melhorias com a administração federal.

“Administrar um aeroporto não é tarefa fácil, existe um esforço grande, e o que se percebe é isso. Quando o aeroporto começar a operar efetivamente, tem toda uma cadeia que se beneficia disso, de empregos, desenvolvimento regional, do turismo, comércio, além do que sendo a administração pública, o prejuízo, se o aeroporto não for operado adequadamente, é do ente público”, explica o professor da UFC.

Por outro lado, Alessandro Oliveira alerta para a necessidade da manutenção do bom estado dos aeroportos. Segundo ele, os interesses das companhias aéreas são de “curto prazo”, com retornos rápidos, e uma administração resoluta pode contribuir para atrair empresas interessadas na aviação regional.

“O que é mais importante para o Ceará é que os aeroportos se mantenham operantes de forma que se garanta que uma empresa aérea consiga colocar um voo ali. É assim que funciona o livre mercado nesse setor. Do ponto de vista da manutenção do ativo para garantir que ele seja bem utilizado quando as condições ficarem propícias, é indiferente, mas se tratando do know-how da Infraero, acredito que o estado tende a ganhar”, destaca.

POLOS REGIONAIS COMO PRIORIDADE

A entrada da Infraero no mercado da aviação regional acontece em um momento em que os grandes aeroportos do País, antes sob o guarda-chuva da empresa, passaram para a iniciativa privada.

Atualmente, dos principais equipamentos aeroportuários, apenas o Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, está sob gestão da empresa federal.

Em nota, a Infraero informou que entrou na administração dos aeroportos regionais para cumprir as diretrizes estabelecidas pelo Governo Federal, e revelou estar em conversas com demais estados brasileiros para assumir a gestão dos equipamentos.

Além dos dez aeroportos do Ceará, a Infraero mantém sob contrato outros 12 equipamentos espalhados por cidades do interior do Brasil. 

No Estado, o foco da companhia será em fornecer apoio técnico e expertise na infraestrutura para auxiliar na adequação dos aeroportos.

"A presença da Infraero permitirá imediatamente apoiar tecnicamente o Governo do Estado na identificação das adequações e ampliações da infraestrutura necessárias para aumentar as operações aéreas e posterior planejamento dos investimentos necessários nos horizontes de curto, médio e longo prazos", informa a companhia em nota.

Foto que contém Aeroporto de Jericoacoara
Legenda: Toda a gestão e administração dos aeroportos ficará a cargo da Infraero
Foto: Ingrid Coelho/Diário do Nordeste

A empresa federal destaca ainda três equipamentos regionais: Aracati, Cruz-Jericoacoara e Sobral. Atividades pesqueiras, turismo e escoamento de produção industrial são prioridades nos locais.

"No caso dos aeroportos do Ceará, é possível identificar vocação específica para cada um dos ativos, como o turismo em Jericoacoara, o apelo logístico de Aracati para escoamento de pescados, atendimento e interface com as indústrias de Sobral, além de serviços de manutenção e hangaragem de aeronaves em diversos aeroportos", declara a Infraero.

Segundo a Secretaria de Obras Públicas do Ceará (SOP), a parceria com a companhia pública nacional "visa dar eficiência aos terminais, melhorando as condições e ampliando a oferta tanto para o turismo quanto para os negócios".

"À SOP, caberá a fiscalização dos serviços prestados pela contratada, além do trabalho junto a Infraero na captação de novos investimentos para modernização dos terminais, ampliação da oferta de voos e fortalecimento do relacionamento com as empresas que já atuam em território cearense", explicita a secretaria.

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