‘Magos das apostas’: consultores se profissionalizam e faturam até R$ 300 mil por mês; veja dicas
Conheça a profissão que vem se popularizando nos últimos anos. Mercado de apostas movimenta R$ 7 bilhões no Brasil
"Quer apostar?” A frase é comumente ouvida especialmente entre os amantes de esporte, quem nunca chegou a apostar dinheiro no próprio time acreditando numa vitória? A prática antiga se tornou hoje fonte de renda para muitos. Com sites e plataformas ganhando forças na internet, é cada vez mais comum ver quem faça parte do mercado de apostas.
Há também quem se profissionalizou com o objetivo de ensinar as melhores estratégias para faturar alto. Os chamados consultores de aposta chegam a faturar cerca de R$ 300 mil por mês vendendo métodos específicos.
O mercado tem crescido tanto nos últimos anos que, de 2018 para 2020, o setor deu um salto de 250%, atingindo R$ 7 bilhões movimentados somente no ano passado, mesmo com a pandemia, de acordo com dados do portal MKT Esportivo.
Quem vê o estilo de vida ostentador de Paulo Rubens, 31 anos, não imagina que ele foi de vendedor de confecção de roupas para apostador profissional, faturando, em média, R$ 200 mil por mês com apostas. Hoje, se tornou um dos mais lucrativos do Brasil, com uma banca – montante disponível para os jogos – de R$ 2 milhões.
“Comecei apostando com 16 anos de forma mais recreativa. Nada foi da noite pro dia, comecei apostando R$ 10, 20. Perdi muito dinheiro durante oito anos, gastava todo meu dinheiro com as apostas e acabou se tornando um vício. Por isso, hoje falo muito que é preciso ter muito conhecimento e que não é fácil”, relata.
Império das apostas
Após o baque do prejuízo, PR Tipster, como é conhecido no meio, se debruçou a entender melhor sobre esse universo, criando os próprios métodos. “Quando comecei a me tornar lucrativo, criei um grupo com uns amigos pra ficar compartilhando dicas e acertava bastante. Eles começaram a compartilhar com outras pessoas e pensei porque não monetizar isso?”.
No início, PR cobrava a mensalidade de R$ 200 para enviar as dicas e, com seis meses, atingiu um pico de 1803 clientes. A partir daí a procura e os valores faturados vêm só aumentando. Atualmente, ele administra uma equipe de 35 funcionários responsáveis por três tipos de assessorias que atendem tanto iniciantes quanto experientes.
“Começamos a faturar pesado e a bater vários recordes, até hoje sou invicto, nunca finalizei um mês no prejuízo, então isso me trouxe muita credibilidade, juntamente com o trabalho sério. Passamos muito pros nossos clientes que isso é muito a longo prazo”, ressalta.
Para ter acesso às dicas, os interessados podem optar por um dos três tipos de 'assinatura', com preços que vão de R$ 100 a R$ 3 mil por mês. Nesta sexta-feira (8), ele lança ainda um curso que vai destrinchar a parte teórica e prática para quem quer se tornar um apostador lucrativo.
“Quem olha de fora pode pensar que é fácil, mas não é. Isso não foi da noite pro dia, foquei no longo prazo e atingi um alto nível. Por isso, falo que pra um apostador alcançar êxito, ele precisa focar na saúde física, mental e financeira. É preciso ter uma mentalidade forte pra conseguir ter sucesso e sempre se ater a sua banca pra que não fique no prejuízo”.
Características de um apostador lucrativo, segundo PR
- Ter mentalidade de vencedor
- Nunca fugir da gestão de banca
- Construir uma rede de contatos
- Acumular conhecimento e experiência
- Entender como o site funciona e seus mercados
- Não agir por impulso, apostar de acordo com o valor de entrada
- Estudar e procurar evoluir todos os dias
Grupos recebem as informações
O estudante de Engenharia Civil, Egídio Cordeiro, 24 anos, conheceu o universo das apostas com 14 anos, mas levava a prática como hobby. Ele, que é jogador de futsal, só começou a atuar de forma mais profissional em 2018, quando fez uma consultoria com outro “tipster” (em tradução livre, informante), como são conhecidos os mentores no meio.
“Eu e um amigo participamos da assessoria do Paulo Rubens e aprendemos muito com ele. Vimos que estava dando um bom retorno e começamos também a dar essa consultoria, passamos dois meses trabalhando com ele e acabamos criando a nossa própria empresa”, conta.
Atualmente, Egídio e o sócio Guilherme Kadu atuam com dois tipos de consultoria: uma para apostadores mais experientes e outra para iniciantes. No primeiro tipo, o participante deve pagar uma mensalidade de R$ 800 para receber as ‘tips’, já no segundo, o valor é de R$ 400.
“Nós mandamos as apostas pra eles fazerem. São dois grupos e os participantes precisam ter uma quantia pra apostar. Nós recomendamos um valor mínimo de R$ 6 mil para os mais experientes, mas cada cliente entra com uma banca diferente, tem quem entre com R$ 10 mil, 15 mil ou 20 mil, quanto mais, maior a probabilidade de faturar mais”.
Já para o grupo de apostadores iniciantes, a recomendação é de uma banca, ou seja, o valor disponível para fazer as apostas, de R$ 3 mil. “Isso porque é uma gestão menos agressiva”, explica Egídio.
Faturamento variável
Por ser um mercado incerto, o estudante detalha que o faturamento mensal depende muito da quantidade de clientes que renovam as assinaturas, mas que, em média, ele e o sócio lucram R$ 20 mil.
Além disso, Egídio ressalta que ainda consegue uma renda por meio das apostas que faz para si. “Tem mês que, com um investimento de R$ 10 mil, temos um retorno de R$ 4 a 5 mil em média, varia muito também”.
Apesar disso, mesmo cursando Engenharia Civil, o jovem aposta nisso como a profissão de que deve seguir. “O núcleo das apostas esportivas é a longo prazo, não dá pra enricar em dias. A gente aconselha que eles sigam essa gestão de bancas, e ter paciência. Nunca ficamos no prejuízo”, relata.
E é isto que atrai tantos apostadores. Segundo uma pesquisa realizada pelo Grupo Globo e divulgada em agosto deste ano, 52% das pessoas entrevistadas dizem que utilizam a prática para aumentar a renda e 12% tem como principal fonte de renda.
‘Me tornei lucrativo’
Com menos de um ano nas apostas, o estudante de Direito Wesley Lira, de 24 anos, percebeu que o que era hobby poderia se tornar uma profissão e, em janeiro deste ano, se juntou a um amigo para prestar assessoria a outros apostadores. “Eu entendi que daria certo quando me tornei lucrativo. Com as análises próprias conseguíamos ser muito rentáveis”.
Atuando de forma semelhante à assessoria de Egídio, o jovem explica que esse é o método padrão do mercado. “Os clientes pagam mensalmente uma assinatura, no nosso caso de R$ 250, e nós enviamos as apostas a eles para serem replicadas”, diz.
Além disso, com as próprias apostas, Wesley diz que já conseguiu lucrar R$ 34 mil em um mês. “Em nenhum dos meses que eu atuei fiquei no prejuízo. No meu pior mês lucrei pouco menos de R$ 1 mil”. Para alcançar resultados como este, o estudante revela que é preciso ter paciência, além de muita disciplina.
“Pra mim, é um trabalho. Faço Direito porque gosto de estudar, mas não me vejo ativamente sendo advogado. A minha meta é pegar todo o dinheiro que eu tenho pra não depender de um trabalho formal pra ter uma vida confortável”.
Prática é legal?
Por muitos anos os jogos de azar foram tipificados como crime no Brasil, pela Lei das Contravenções Penais (3.688/41). O advogado Renan Rebouças explica que, de acordo com o normativo, é crime explorar ou estabelecer jogos de azar em território brasileiro, em local público ou acessível ao público.
“Contudo, existe uma brecha no que diz respeito às apostas esportivas realizadas de forma online, as quais necessitam ser analisada por um outro viés, dada a particularidade deste meio de aposta. E é justamente nessa ótica que vai residir a possibilidade de se apostar sem que tal prática seja considerada como ilícito penal”.
Ou seja, se o site eletrônico for oficial e formalmente hospedado em um servidor no exterior, o apostador não estará cometendo nenhum tipo de crime.
Em 2018, o então presidente Michel Temer promulgou a Lei nº 13.756/2018, que instituiu a possibilidade de serem operadas, em território nacional, apostas esportivas, desde que atendam a alguns requisitos legais.
“Há permissão legal a prática de apostas que possuam cotas fixas, isto é, aquelas em que o apostador, no momento da aposta, já tem conhecimento do valor exato que auferirá caso acerte seu palpite. Sabe-se também que tal modalidade de aposta será atrelada às loterias e de serviço público exclusivo da União”, aponta o advogado.
Apesar da promulgação da lei, Rebouças explica que a regulamentação ainda está pendente no Ministério da Economia, o qual tem um prazo de dois anos, ou seja, até dezembro de 2022, para o fazê-lo.
“Diante do limbo jurídico existente em virtude da atual ausência de regulamentação legal do mercado de apostas esportivas, recomenda-se bastante zelo e prudência, a fim de que, se efetivadas, as referidas apostas somente sejam realizadas em sites oficiais”, acrescenta.
Operando no limbo
Enquanto essa regulamentação não sai, no entanto, Rebouças, que é membro da Comissão de Direito Desportivo da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), comentou que a profissão do consultor de apostas também não é regulamentada. Atualmente, as pessoas que trabalham nesse ramo, segundo ele, estão operando em um "limbo jurídico", quando há uma lacuna no ordenamento jurídico.
Renan explicou que ainda não é possível dizer se seria crime ou não operar no Braisl como consultor de apostas, e que a classificação dependeria de quem estivesse interpretando a lei em caso de aplicação de um processo jurídico.
Caso as autoridades entendam que os consultores estão se beneficiando de um mercado ilegal no Brasil, como é o mercado de apostas, pode haver a caracterização de um crime. No entanto, ele explicou que alguns juristas também entendem que o serviço pode ser enquadrado apenas como uma consultoria especializada qualquer, já que o mercado de apostas funciona a partir de servidores fora do País.
"É preciso saber se ele (consultor) está explorando o mercado de apostas ou não. Para quem acedita que sim, ele estaria ilegal, mas não há regulamentação e fica uma dúvida porque há outras interpretações. Quando for regulamentado, será visto quem poderá trabalhar com isso, qual a legislação, e capacitação necessária, mas já há, hoje, quem defende e fala que a pessoa não está explorando o mercado de apostas mas prestando uma consultoria comum", disse.
"Não há como cravar que é legal, porque pode-se entender que se está explorando um mercado ilegal, mas também não dá pra dizer com certeza que é crime", completou Rebouças.
Hábito requer cautela
Embora a prática possa trazer diversos benefícios econômicos, é importante salientar que há riscos de se desenvolver um transtorno por vício. De acordo com a mestre em Psicologia e doutoranda em Saúde Pública, Maria Camila Moura, o transtorno do jogo consta no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.
“Ele está incluso na categoria de transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos. No mesmo capítulo que estudamos casos de alcoolismo também estudamos casos de jogos e a aposta, seja ela esportiva ou não”, pontua.
Esse transtorno, segunda a psicóloga, envolve uma série de fatores e critérios, mas, de forma geral, é quando apresenta quatro ou mais sintomas ao longo de 12 meses, desde irritabilidade a prejuízos da vida social, funcional e laboral.
“Quando a gente pensa nesse quadro de transtorno, vemos uma série de consequências, tanto sociais, quanto laborais, um forte prejuízo na saúde da pessoa de maneira global, podendo desenvolver uma ansiedade ou depressão. O primeiro passo é buscar tratamento, mas é muito difícil identificar que tem esse problema".
Para Moura, é possível encontrar um limite entre o saudável e o transtorno, porém, para isso, a pessoa precisa se conhecer, saber seus limites, e ficar muito atento para os ganhos e as perdas para muito além do dinheiro. “Se existem outras esferas da sua vida que estão sendo prejudicadas, liga o alerta pois tá na hora de procurar ajuda”, destaca.
Veja os principais sintomas de um possível transtorno:
- Apostas de quantias cada vez maiores;
- Irritação quando tenta reduzir ou interromper o hábito;
- Faz esforços repetidos e mal sucedidos para tentar controlar e parar o hábito;
- Tem frequentemente uma preocupação em relação ao jogo, ou seja, gasta um tempo se preocupando com isso;
- Joga muitas vezes quando se sente angustiado;
- Perde dinheiro e volta no dia seguinte como para recuperar o prejuízo, buscando uma sensação de compensação;
- Mente ou esconde a extensão do envolvimento com o jogo para familiares e amigos;
- Perdeu um relacionamento significativo, seja uma amizade, ou teve prejuízo em relações com pais, parceria, ou com o vínculo empregatício;
- Em casos mais graves, depende de outros meios para seguir no jogo, com empréstimo por exemplo.