Ceará exportou R$ 3 bilhões aos EUA em 2025; veja impactos de tarifa anunciada por Trump no Estado

Aço, ligas metálicas, produção de peixes e crustáceos e calçados serão os produtos mais impactados no Estado

Escrito por
Mariana Lemos mariana.lemos@svm.com.br
(Atualizado às 16:03, em 22 de Julho de 2025)
Imagem de cargas movimentadas no Porto do Pecém, principal terminal de cargas do Ceará
Legenda: Estados Unidos é o principal destino de produtos exportados pelo Ceará
Foto: Ismael Soares

Os efeitos da imposição da tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros enviados aos Estados Unidos devem ser sentidos em diversos setores produtivos do Ceará, especialmente na fabricação de aço e ligas metálicas. Isso porque há uma forte dependência do comércio externo cearense com o mercado norte-americano. 

Caso não haja recuo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a nova tarifa deve entrar em vigor em 1º de agosto. O Brasil, que havia sido poupado nas primeiras tarifas anunciadas, teve a taxa mais alta entre as anunciadas nessa terça-feira (9).

Além de motivações políticas, o mandatário dos Estados Unidos justificou que a medida deve diminuir a disparidade da balança comercial entre os dois países. Os dados mostram, entretanto, que os Estados Unidos exportaram mais para o Brasil do que o inverso.

No caso específico do Ceará, de fato há uma exportação maior do que importação de produtos norte-americanos. Os Estados Unidos são o principal destino das mercadorias cearenses exportadas.

No primeiro semestre de 2025, foram exportados US$ 556 milhões em produtos aos Estados Unidos, o equivalente a R$ 3 bilhões. O valor é cerca de 51% do montante exportado pelo Ceará de janeiro a junho - cerca de US$ 1 bilhão. 
 
Com a tarifa de 50% imposta a compradores dos Estados Unidos para importação de produtos brasileiros, o envio da mercadoria deve diminuir. Consequentemente, a produção local deve ser reduzida, com risco de perda de empregos, avaliam especialistas.  

“Há grande preocupação por parte dos produtores locais, pois a nova política comercial americana afeta todo o comércio internacional e modifica as bases sobre as quais a economia global se desenvolveu nos últimos 30 anos”, aponta o economista Alex Araujo. 

O produto mais afetado deve ser o aço e seus semimanufaturados, que representaram 66% do montante exportado aos EUA em 2024, cerca de US$ 441 milhões.

“O caso do aço é mais delicado, pois temos muitos concorrentes globais, principalmente na Ásia”, aponta o economista. Em fevereiro, Donald Trump já havia decretado uma taxa de 25% sobre aço e alumínio importados, aplicada a todos os países. 

PRODUÇÃO DE PEIXES E CRUSTÁCEOS ESTÃO ENTRE SETORES AFETADOS

Outros setores afetados, com exportação significativa aos Estados Unidos, são a produção de peixes e crustáceos, frutas, calçados e óleos animais e vegetais

Wandenberg Almeida, economista e presidente do Corecon-CE, reitera que o mercado consumidor desses produtos deve migrar para outros países, que não estão sob efeito de taxas tão grandes. 

“Há possibilidade de retração da produção local, vai mexer com a indústria e o agronegócio. A economia cearense evoluiu em 2025 e isso pode ter um impacto negativo, também olhando para a parte do agronegócio”, aponta. 

Na indústria cearense, o baque da redução dos envios aos Estados Unidos pode até 'anular' efeitos de marcos significativos, como a interiorização da produção e a criação de novos polos, como o automobilístico. 

“Só no ano passado, os Estados Unidos representaram 20% das exportações de calçados e couro e derivados. O impacto pode ultrapassar US$ 15 milhões ao ano para calçados e US$ 5 milhões para couro. Isso pode levar queda de um quarto da produção desses setores e mexer no mercado de trabalho”, aponta. 

A Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) afirmou que ainda está avaliando os possíveis impactos da medida. 

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) projeta impactos graves para o setor, que é interligado ao sistema produtivo americano. Em nota, o presidente Ricardo Alban defendeu negociação para reverter a taxação e disse 'não existe qualquer fato econômico que justique uma medida desse tamanho'. 

BUSCA DE NOVOS MERCADOS CONSUMIDORES

As vendas externas do Ceará aos Estados Unidos não haviam sido afetadas pela primeira tarifa anunciada, de 10%, aponta Ana Cristina Lima, analista do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece). 

Agora, o cenário é mais preocupante. Para amenizar os efeitos da taxação em 50%, uma das saídas é a procura de novos mercados externos, avalia a analista.

“Os países asiáticos, da América Central e da própria América Latina podem aparecer com novos negócios, visto que países como México, Coreia do Sul, Peru já foram grandes compradores de ferro e aço do Ceará”, aponta.

Já o setor de fruta pode escalar os envios ao mercado europeu. “Tudo isso irá depender da aproximação e negociações com empresários desses países para vender o excedente dos produtos que venham a sofrer com a taxação americana”, complementa.

Wandenberg Almeida compartilha da visão de que o momento exige negociações e acordos com novos mercados consumidores. 

O economista destaca a importância da América Latina e da Europa, principalmente pelo acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia

Argentina, Chile e Colômbia são mercados onde tem potencial para o calçado e o couro, além do México. Posso olhar também para o Sudeste Asiático, onde tem nichos interessantes. As frutas podem se redirecionadas para Europa e Canadá. 
Wandenberg Almeida
Presidente do Corecon-CE

TARIFA DE 50% PARA PRODUTOS BRASILEIROS 

A alta repentina no imposto de entrada nos Estados Unidos deve diminuir a competitividade do mercado brasileiro, destaca o economista Eldair Melo.

Em 2024, o Brasil exportou US$ 38 bilhões para os EUA. Entre os itens de maior valor enviado, estão petróleo, semiacabados de ferro e aço, café, carne e aeronaves.

Há uma projeção de queda imediata de 40 a 60% no volume de vendas desses itens, segundo o especialista. 

Além disso, a cotação do dólar deve subir e, com redução da moeda no mercado brasileiro, o País deve passar por alta de inflação. 

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“Em termos de projeção macroeconômica, estima-se uma redução estimada de US$ 8 a US$ 12 bilhões em exportações em 12 meses. Tem uma tendência de aumento do desemprego setorial e pressão inflacionária, por fuga de divisas e aumento do dólar”, afirma. 

O governo brasileiro ainda não divulgou medidas em resposta ao 'tarifaço', mas o presidente Lula se manifestou afirmando que qualquer ação será respondida com a lei brasileira

O Congresso Nacional aprovou, em abril, um projeto de lei que permite que o governo retalie tarifaços como os promovidos por Trump desde o início de seu mandato. Lula ressaltou que o Brasil é um país soberano que não aceitará 'ser tutelado por ninguém'. 

Em uma carta endereçada ao presidente Lula, Trump condenou o tratamento dado ao ex-presidente Jair Bolsonaro como uma “vergonha internacional”, acrescentando que o julgamento “não deveria estar acontecendo”, disse.

ENTIDADES PRODUTIVAS MANIFESTARAM PREOCUPAÇÃO

A taxação anunciada por Donald Trump foi recebida com preocupação por diferentes entidades produtivas do Brasil. 

A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) projeta que a medida pode causar “impactos severos” sobre empregos, investimentos e cadeias produtivas integradas.

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) pediu cautela ao governo brasileiro mediante a decisão norte-americana e diz que ela representa “um alerta ao equilíbrio das relações comerciais e políticas entre os dois países”.

Para a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) a informação do aumento das tarifas de importação não se trata de uma medida econômica, mas política com impacto econômico de grande lastro. 

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