Tubarões no Ceará: saiba onde estão as espécies no Estado e se há riscos de ataques como em Recife

Ao todo, 38 espécies do animal foram mapeadas por pesquisadores na costa cearense

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Tubarão-lixa é uma das espécies mais comuns encontradas no Ceará
Foto: Pexels

Três ataques de tubarões em 15 dias deixaram em alerta Recife, capital de Pernambuco, desde o fim de fevereiro. As vítimas - um surfista e dois adolescentes - chegaram a ter membros amputados após as mordidas. Com praias tão frequentadas, existem riscos de ataques também no Ceará?

Para explicar a questão, o Diário do Nordeste conversou com dois professores do Instituto de Ciências do Mar, da Universidade Federal do Ceará (Labomar/UFC). Segundo eles, o relevo do fundo do mar cearense é diferente do de Recife, e por aqui as chances de ataque são bastante remotas.

38
espécies de tubarões foram identificadas no ambiente marinho do Ceará, de acordo com o  inventário da fauna de peixes marinhos da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema).

A professora Caroline Feitosa, que morou em Recife durante a pós-graduação, diz ser incomum que tubarões fiquem em águas tão rasas. Porém, em praias como Boa Viagem, Piedade e Candeias, há uma porção mais funda bem próxima da costa.

Parte dos estudiosos atribui o desequilíbrio ambiental nessa área à construção do Porto de Suape, na década de 1980, mas há registros de ataques a seminaristas da Igreja da Piedade desde os anos 1970.

“No caso da exploração do pargo (peixe), já começou a ser reduzida na década de 1960, depois a lagosta. A gente já tinha impacto ambiental, só não na mesma magnitude. Provavelmente, a falta de alimento e a poluição já poderiam estar contribuindo para esse frenesi alimentar dos tubarões que culmina nos ataques”, detalha Caroline.

Assim, em períodos de maré cheia, “tubarões de maior porte conseguem passar por barreiras de recifes próximas à praia e encontram, bem próximo à zona de arrebentação, uma região de profundidade propícia para eles”, como complementa o professor Vicente Faria, doutor em ecologia e biologia evolutiva.

Segundo Caroline, o soterramento de mangues para a expansão de Recife também afetou habitats fundamentais para os tubarões.

“O cabeça-chata, por exemplo, tem o hábito de entrar no rio. Mas em qual, se o que ele ia foi soterrado? Aí vai entrar no estuário do rio Jaboatão, onde uma época um matadouro ficava jogando sangue e vísceras diretamente na água”, alerta.

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Situação no Ceará

Contudo, na costa cearense, os banhistas “não precisam desse alarme”, confirma a professora, embora “aqui no Ceará a gente tenha tubarões-tigre e tubarões cabeça-chata, os mesmos que atacam em Pernambuco”.

A nossa plataforma continental é relativamente extensa e a profundidade vai aumentando de forma muito gradativa. Dessa forma, a costa cearense não favorece a presença de tubarões de grande porte tão próximos de banhistas.
Vicente Faria
Professor da UFC

Além disso, a fauna cearense também oferece menos riscos. Segundo o pesquisador, uma das espécies mais comuns é o tubarão-lixa, que prefere se alimentar de crustáceos e pequenos peixes. 

“Ele passa boa parte do seu tempo repousando no fundo e não tem dentição que possa gerar nenhum incidente com o grau de dano visto nos incidentes ocorridos na região metropolitana de Recife”, reforça.

Animal não é agressivo

Vicente Faria também destaca: humanos não são presas naturais de nenhuma espécie de tubarão. O problema ocorre quando uma combinação de fatores favorece os ataques, incluindo:

  • momento do dia de maior atividade alimentar do animal
  • salinidade, turbidez e profundidade da água
  • degradação ambiental levando a escassez de presas naturais
  • algum tipo de estímulo vindo de um banhista

Em determinadas situações, o animal pode fazer o que o pesquisador chama de “mordida exploratória” que, dependendo do porte do tubarão, causa muito dano.

“O tubarão  pode perceber que não é uma presa comum e se afastar, até porque um humano pode lutar e se revelar pro tubarão como muito maior do que o tubarão havia antecipado. Mas aí, infelizmente, os ferimentos já foram gerados e podem ser extremamente graves”, comenta.

Desde 1992, foram registrados 77 ataques de tubarão contra humanos em Pernambuco, sendo 67 no continente e mais 10 na ilha de Fernando de Noronha, de acordo com o Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit). Destes, 26 resultaram em mortes.

Legenda: Relevo da costa cearense minimiza risco de aproximação dos tubarões até áreas de banho
Foto: Eliane Dipp/Pexels

Espécies ameaçadas

Apesar da fama de agressivo, o tubarão também é alvo de estigmas gerados inclusive pela cultura pop, através de filmes como “Tubarão”, “Sharknado” e “Megatubarão”.

Porém, segundo Vicente, “a vasta maioria dessas espécies” não traz risco algum de incidentes com humanos. Na verdade, ao lado das raias, ajudam a regular o tamanho da população de suas presas e, com isso, manter um bom funcionamento de todo o ecossistema marinho. 

“Uma pena que muitas espécies de tubarões e raias estão ameaçados de extinção atualmente. As principais causas disso são a pesca excessiva e a degradação do meio ambiente marinho”, lamenta. 

A professora Caroline enfatiza que não há mais pesquisas a serem feitas para minimizar o risco de ataques a humanos. Ainda assim, o Governo de Pernambuco e o Porto de Suape anunciaram, na quinta (9), R$ 2 milhões em novos levantamentos sobre os tubarões.

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O ideal, para ela, seria trabalhar a educação ambiental com a sociedade para entender o comportamento dos animais e evitar banhos em áreas onde eles circulam.

“Vão tirar o animal do ambiente natural? Ele tá no lugar dele, sem alimento, e tudo isso é culpa nossa. Tubarão é uma espécie necessária, mas alguns têm crescimento lento, se reproduzem lentamente, ou a prole é reduzida. A pesca impacta muito esses animais e tem muitas espécies ameaçadas. Não podemos contribuir com isso”, finaliza.

No Ceará, segundo a Sema, 21 das 38 espécies de tubarões estão sujeitas à extinção.

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