Estudantes prejudicados por erro no Sisu podem recorrer para conseguir a 'vaga perdida'?

O Ministério da Educação informou que o sistema é seguro e os resultados oficiais não são modificados, mas candidatos buscam recorrer após erro no sistema

Escrito por Lucas Falconery , lucas.falconery@svm.com.br
Legenda: Estudantes tiveram dificuldade para acessar o resultado final do Sisu
Foto: Kid Júnior

Parte dos candidatos que disputavam uma vaga no ensino superior por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), em 2024, entraram na lista dos aprovados e, após uma falha na plataforma, saíram dos classificados, na última terça-feira (30). Sem entender a situação atípica, os estudantes buscam formas de recorrer junto aos órgãos oficiais ou de forma judicial.

Conforme o Ministério da Educação (MEC), o que aconteceu foi uma divulgação indevida de resultados provisórios, ainda não homologados, durante 25 minutos da manhã do dia 30 de janeiro. “A ocorrência está sendo rigorosamente apurada”, segundo o Ministério.

O MEC informou também que o “sistema é seguro e os resultados oficiais não são modificados”. Nesta edição, mais de 2 milhões de estudantes disputam 264 mil vagas em 6.827 cursos de graduação nas instituições públicas participantes do Sisu.

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O advogado e professor Francisco Silva, membro da Comissão Estadual de Educação Jurídica da Ordem dos Advogados do Ceará (OAB/CE) e presidente da ESA Sertão Central, aponta que o próprio MEC pode ser acionado pelo canal oficial de reclamações.

“Eu acredito que o Ministério da Educação não vai mudar e resta esses mecanismos de luta coletiva, que são o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, tendo em vista que o MEC é um órgão federal”, aponta sobre as outras possibilidades de reparação.

Mas, afinal, é possível conseguir de volta a vaga “perdida”? O especialista contextualiza que é preciso avaliar caso a caso e o resultado depende do entendimento judicial.

“Dentro dessa dimensão de demonstração do dano, uma vez a Justiça entendendo que realmente houve um prejuízo causado ao candidato, quer seja num mandado de segurança ou numa ação ordinária, pode levar o candidato ter restabelecida a vaga inicial vista no sistema”, aponta.

No entanto, ele pondera que esse “não é um direito certo, porque a Justiça tem que analisar se foi um erro pontual ou não e tudo vai depender da individualidade de cada candidato”, reforma sobre o cenário.

Já para Salomão Ximenes, professor de Direito e Políticas Educacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC), não é possível obter a vaga já que o resultado divulgado anteriormente estava equivocado.

“Apesar de lamentável, não há dúvida de que cabia corrigir a informação e isso não gera sofrimento aos estudantes que sofreram com essa expectativa”, analisa. Os candidatos, no entanto, podem solicitar explicações e revisão dos dados.

“Esses estudantes que sofreram esse tipo de constrangimento têm direito de pedir informações ou recorrer de uma decisão administrativa, como qualquer cidadão, e pedir revisão das informações”, acrescenta Salomão.

Além de buscar judicialmente o direito à vaga, os candidatos podem entrar com ação por danos morais, caso tenham sido prejudicados pela situação.

“O meu entendido é que esse tipo de equívoco pode gerar grave situação de sofrimento e constrangimento e esse tipo de coisa, ainda que sem direito a vaga, cabe em ações de danos morais, individuais ou coletivo, pedindo providências no Ministério da Educação”, frisa o professor.

Essa situação é reforçada por Francisco, como uma possibilidade para os candidatos que sofreram com o transtorno da falha no sistema.

“Dentro dessa problemática causada pela informação errada do MEC e isso ter gerado uma expectativa pode ter causada alguma crise de ansiedade, por exemplo, como vi candidatos dizendo que precisaram tomar algum tipo de medicação ‘era o curso do meu sonho, vi que tinha sido aprovado, mas depois eu já não estava mais’”, exemplifica sobre situações que observou.

Para isso, é preciso diferenciar o dano de um “mero aborrecimento”, como avalia Francisco. “A gente entende que dentro do próprio Ministério da Educação eles identificaram o erro, mas isso não exime a responsabilidade por causa das expectativas que surgiram nos candidatos”, acrescenta o advogado.

UNE planeja ação coletiva para apoiar estudantes após falha no Sisu

Por meio das redes sociais, estudantes compartilharam relatos de frustração pelo ocorrido. Por causa dessa situação, a União Nacional dos Estudantes (UNE) articula uma ação judicial coletiva para apoiar os candidatos prejudicados, como explicou a presidenta da UNE Manuella Mirella.

“Nós começamos a receber denúncias de estudantes desesperados e ansiosos, porque se preparam um ano ou mais para conseguir alcançar o sonho de entrar na Universidade. A gente já via uma série de estudantes comemorando”, acrescenta.

A gente já tinha notificado o MEC pedindo esclarecimento sobre o que aconteceu com a informação dos estudantes. Estamos indo para Brasília para exigir explicações sobre o que aconteceu e o que ocasionou o erro e muito mais do que isso: que o Ministério preste todo o suporte a esses estudantes
Manuella Mirella
Presidenta UNE

As comemorações tradicionais, de raspar a cabeça e pintar o corpo, deram espaço à frustração e até vergonha de quem comemorou a vaga que não terá acesso. Para reunir os relatos dessas pessoas, a UNE lançou uma plataforma onde quem se sente prejudicado pode enviar imagens e informações sobre as falhas no sistema.

Ansiedade e frustração 

O estudante Anthony Gabriel Vasconcelos, de 18 anos, já tinha comemorado a aprovação no curso de Letras - Português, na Universidade Federal do Ceará (UFC), logo pela manhã do dia 30 de janeiro ao verificar o sistema.

“Pouco tempo depois o site saiu do ar e no fim do outro dia nós tivemos o resultado, de fato, e foi bem frustrante. A gente não tinha notícia, não sabia se tinha passado ou não, e tivemos a ansiedade porque demorou”, explica Anthony.

O Sisu oferece a possibilidade de tentar vaga em duas opções de curso, mas no dia 31 de janeiro Anthony descobriu que havia ficado de fora da lista de aprovados de ambas. “Eu me frustrei bastante, eu tinha comemorado com a família e com professoras que eu tenho contato, mas como não tinha muito o que fazer e me inscrevi na lista de espera”, reflete.

Legenda: Anthony fez o registro da aprovação e, na sequência, do nome fora da lista
Foto: Reprodução

Anthony mantém a esperança de conseguir entrar ainda nesta edição do Sisu por meio da lista de espera, mas classifica a situação como “uma grande irresponsabilidade com todos os estudantes que fizeram o Enem”. “Não sei se dá para resolver judicialmente porque as universidade tem limite de vagas e tem as pessoas que realmente passaram”, observa o estudante.

O que aconteceu com o Sisu

O resultado do Sisu, com as listas dos aprovados nas primeiras chamadas do processo seletivo de 2024, foi adiado da terça-feira (30) para a quarta (31), por causa de “problemas técnicos no sistema” que impediram a divulgação.

“A Subsecretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação do Ministério da Educação (MEC), área responsável pela operacionalização do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), identificou problemas técnicos no sistema e reiniciou os protocolos de homologação, adiando a divulgação dos resultados definitivos do Sisu 2024”, como explicou em nota.

O Sisu é um sistema eletrônico administrado pelo Ministério da Educação para distribuir as vagas das instituições públicas de ensino superior do País. O Sisu faz a seleção dos candidatos com base na média da nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) até o limite da oferta das vagas.

Para isso, são avaliadas as opções de curso e modalidade de concorrência, conforme as escolhas dos candidatos inscritos e o perfil socioeconômico para a Lei de Cotas.

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