Duna do Pôr do Sol em Jericoacoara perdeu área 12 vezes maior que a do gramado do Castelão
Erosão deve pôr fim ao ponto turístico nos próximos anos e evidencia a relevância do planejamento ambiental
A Duna do Pôr do Sol, em Jericoacoara, visivelmente não é a mesma de antes, e uma pesquisadora cearense descobriu que a montanha de areia branca perdeu 86,5 mil m² de sedimentos entre 2005 e 2017. É como se fosse retirada uma área 12 vezes maior que o gramado da Arena Castelão, que tem 7.140 m² (105 m x 68 m).
Além de perder tamanho, a Duna encolheu de 60 metros de altura, como na década de 1970, para 9,8 metros em 2023. Um trabalho publicado pela Universidade Federal do Ceará (UFC) aponta que a estrutura também se deslocou 350 metros nas últimas décadas rumo ao mar.
Por isso, quem vive na região percebe a Duna menor e mais distante da Vila de Jericoacoara. Essa construção, inclusive, está ligada à maior velocidade com que a imensidão de areia branca passou a sumir porque as edificações se tornaram uma barreira para a entrada de sedimentos.
Adely Silveira, doutoranda em Geografia pela Universidade Estadual do Ceará (Uece), realizou uma análise por meio de imagens de satélite das últimas décadas e fez medições locais a cada dois meses durante o ano de 2017.
“Ela vai caminhando em direção ao mar porque é uma duna barcana, que tem isso que a gente chama de braços. Isso vai se perdendo isso porque as extremidades vão de encontro ao mar”, comenta sobre o aspecto natural da erosão da Duna.
Redução da área
- 2005: 207.472,00 m²
- 2010: cerca de 190 mil m²
- 2018: área de 120.924,00 m²
Contudo, fatores não naturais intensificaram muito esse processo. Além das edificações, o fluxo intenso de pessoas na Duna, trilhas de quadriciclos e até passeios de cavalo contribuíram para a redução.
Isso porque a movimentação facilita a dispersão da areia e com o passar dos anos, a Duna do Pôr do Sol passou a perder muito mais do que ganhar novas recargas de areia. A velocidade disso passou a ser maior nos anos 2000 e se intensificou nos últimos anos.
“Vimos 6,81% de perda da Duna por ano e a gente concluiu que a expansão da Vila, que bloqueia onde realmente acontece o transporte de alimentação com sedimentos estava sendo bloqueada, além do intenso movimento turístico”, explica Adely.
Com as informações coletadas, a pesquisadora que integra o Laboratório de Gestão Integrada da Zona Costeira (Lagizc), estimou o fim daquele espaço, mas foi surpreendida negativamente.
“Na nossa análise, a gente considerou a área e o volume e vimos que ela ia durar entre 10 e 20 anos. Essa última se fosse usado as guias de corrente”, pondera. Isso porque se fossem realizadas intervenções ambientais, a Duna teria mais tempo de existência.
“O nosso litoral de um modo geral é uma área muito sensível e o que aconteceu com a Duna do Pôr do Sol mostra isso. Alguns projetos poderiam ter sido implementados para evitar essa situação”, frisa a especialista.
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Intervenção ambiental
Um desses projetos estabeleceu a instalação de 1.180 guias de corrente eólica, que são condutores do vento construídos com madeira e palha de coqueiro. As estruturas seriam de 10 metros de comprimento e distribuídas desde a Praia do Preá.
No entanto, essa intervenção não foi autorizada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Na análise, não foram comprovadas evidências suficientes para demonstração da efetividade.
“Algumas instalações, como as estruturas guias de corrente eólica, apresentam potenciais de causar impactos negativos sob a visitação e o ICMBio avaliou que estas não alcançariam resultados perceptíveis aos usuários em termos de restauração”, informou o ICMBio.
A Secretaria do Turismo do Ceará (Setur), responsável pelo projeto, foi procurada para detalhar a situação no dia 3 de março, mas até a publicação deste material não respondeu à reportagem.
Existem exemplos fora do Estado de gestão dos espaços naturais, como contextualiza Adely. A proteção pode ser decisiva em alguns casos.
“Temos como exemplo clássico o Morro do Careca, no Rio Grande do Norte, que há 20 anos foi tomada uma decisão política de proibir a subida e percebeu-se que a duna resistiu. Conseguiram manter a altura e resgatar um pouco da flora”, completa.
Eu entendo que o litoral tem esse atrativo, essa beleza cênica, mas associar ao turismo precisa ser planejado e entender a capacidade daquele ambiente