De despoluição do rio a ocupações: quais medidas serão prioridade na nova gestão do Parque do Cocó

Em entrevista ao Diário do Nordeste, Narciso Mota, gestor da unidade de conservação há 1 mês, destaca medidas urgentes e a longo prazo a serem implementadas

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Parque Estadual do Cocó, em Fortaleza, é o maior parque natural em área urbana do Norte/Nordeste e o 4º da América Latina
Legenda: Parque Estadual do Cocó, em Fortaleza, é o maior parque natural em área urbana do Norte/Nordeste e o 4º da América Latina
Foto: Nilton Alves

Um dos espaços de maior riqueza ambiental da América Latina, o Parque Estadual do Cocó possui, desde novembro deste ano, um novo gestor: o agrônomo Narciso Ferreira Mota. No cargo há 1 mês, ele afirma que um “raio-x” das necessidades da unidade de conservação está em andamento, mas adianta quais as urgências e prioridades.

Entre elas, está a despoluição do Rio Cocó, corpo hídrico importante que cruza três municípios cearenses – mas que amarga os efeitos de uma contaminação que vai de lixo a microplásticos

O Diário do Nordeste conversou com Narciso, que foi nomeado ao cargo no dia 10 de novembro, após o Parque do Cocó permanecer por 11 meses sem administrador. Confira a entrevista completa.

DN - Quais as prioridades da gestão para o Parque do Cocó nos próximos anos? O que é mais urgente?

Narciso Mota - Estamos juntando as informações, fazendo esse diagnóstico, que ainda não está pronto, mas já temos algumas coisas colocadas como de urgência, tanto menores quanto maiores, mais estruturais.

Temos o desafio principal da despoluição do rio, esse é um eixo já iniciado nas negociações e conversas com o Pacto pelo Rio Cocó. O rio vem sofrendo muito com vários tipos de poluição, então despoluir e reflorestar as áreas necessárias são dois pontos prioritários da gestão. 

Junto a eles, uma prioridade são as questões ligadas às ocupações irregulares. São três pontos bem sensíveis.

Um dos problemas mais preocupantes relacionados ao Cocó são os incêndios. Como combatê-los? Há previsão de ampliar a fiscalização?

Estamos colocando nas discussões a ideia de melhorar e aumentar a parceria com os Bombeiros, para fiscalização. 

Já temos uma constância de vistorias feitas segunda, quarta e sexta-feira, controlando a poligonal do Parque do Cocó em vários locais de tensões ou possibilidade de ocorrências, como a deposição irregular de resíduos sólidos ou outras formas de poluição.

Nesses monitoramentos, são feitas observações para um combate mais constante (aos incêndios). Outra coisa é a educação ambiental: temos educadores que conversam com as comunidades em volta, falam sobre a importância de a cidade manter o mangue, o parque e os rios sadios.

Despoluir o Rio Cocó é o maior desafio da atual gestão
Legenda: Despoluir o Rio Cocó é o maior desafio da atual gestão
Foto: Natinho Rodrigues

O Pacto pelo Cocó, articulação da sociedade civil, tem como pauta central a despoluição do rio. O que a gestão pretende fazer para que essa ação crucial saia do papel?

Como estamos com 1 mês de gestão, ainda chegando, estamos tomando o pé da situação do perímetro do parque, já tem áreas com queimadas anteriores ainda em recuperação, áreas possíveis de acontecer queimadas onde estamos fiscalizando com mais ênfase. Essa questão é uma das pautas principais.

O Parque do Cocó, como Unidade de Conservação, tem proteção legal, mas é uma área cobiçada da cidade, principalmente no aspecto imobiliário. Como isso é encarado pela nova gestão? O que é mais preocupante no sentido de assegurar proteção?

A equipe técnica que trabalha na gestão do parque tem um trabalho de monitoramento sistemático de como está o espaço, para evitar ocupações irregulares, incluindo empreendimentos comerciais. 

Temos processos em andamento para proteger o Parque do Cocó da voracidade dos empreendimentos imobiliários que o estão sempre cercando.

Muitas das edificações que existem são de data anterior à regulamentação do parque, em 2017, por isso estão lá, e houve esse novo ordenamento.

Em todo canto se reclama de calor, né? O Cocó tem a capacidade de resfriar o microclima de Fortaleza. Todos esses biomas são os maiores sequestradores de carbono. Temos que aprender a respeitar áreas tão importantes pra gente: de novo, é questão de educação ambiental.

Os empreendimentos estão sendo estudados, questionados e avaliados para que não haja uma visão e não reclamem de que o parque está sendo exigente ou permissivo demais. 

Veja também

O Conselho Consultivo Gestor do Parque Estadual do Cocó, criado há mais de 4 anos com expectativa de participação social, não se reúne há muito tempo. O que está sendo pensado quanto a isso?

Estamos ouvindo as comunidades tradicionais e em volta do parque. Fizemos a primeira reunião com o conselho, no dia 11 de dezembro, para, a partir das necessidades e ideias, e juntamente com gestores anteriores, tentarmos reconstruir o Parque do Cocó. 

Dentro dessa primeira conversa – que reuniu as comunidades tradicionais, órgãos estaduais e municipais e universidades – já se evidenciaram várias demandas. A partir do próximo ano estaremos com definições de projetos e ações.

Agora, neste tempo de final de ano, já há atividades no parque, para sanar problemas mais simples, como implantar placas de sinalização ao redor do parque e nas trilhas, o recercamento de parte do parque, onde o gradil foi vandalizado. 

Esses pontos são tão necessários quanto esse mega empreendimento da despoluição do rio, que leva muito mais tempo. O Rio Sena, em Paris, levou 12 anos para ser limpo. Espero que no Cocó façamos isso no tempo adequado.

Mas, de fato, um dos pontos que queremos enfatizar na nova gestão é a educação ambiental: não adianta fazer a despoluição e o reflorestamento se a comunidade não tem aquilo como pertencimento dela e não faz com que isso se mantenha, que o parque se mantenha ativo e útil para os seres vivos que utilizam.

O Cocó é um pulmão para Fortaleza e para o nosso Estado. De que maneiras cuidar desse Parque pode ajudar a cidade, sobretudo num cenário de mudanças climáticas?

‘Mudanças climáticas’ é um nome bonito, mas, na verdade, vivemos uma emergência climática. O planeta está passando para um ponto sem retorno.

Aqui em Fortaleza, todo mundo já reclama do calor. A pauta de começo de conversa é essa. Mais do que ser o pulmão de Fortaleza, o Cocó é um termostato, um regulador do microclima. 

Além de ser pulmão, ele refresca a cidade, através dos processos naturais, como sequestro de carbono pelos mangues, e das sombras. Isso sem falar no benefício instantâneo que todos os visitantes aproveitam, do serviço ambiental que o parque proporciona pra gente. E a função diária de conservação integral.

**

O que faz um gestor de uma unidade de conservação?

No Ceará, há 39 Unidades de Conservação estaduais, sendo 35 geridas pelo Governo do Estado. São parques, áreas de proteção de estuários de rios, dunas, estações ecológicas e monumentos naturais, por exemplo.

Os gestores das UCs estaduais ocupam cargos comissionados e são nomeados pelo Governo. No dia a dia, dentre outras atividades, eles: 

  • Fazem a estruturação e o acompanhamento das reuniões dos conselhos gestores da Unidades de Conservação;
  • Realizam a administração e o monitoramento das UCs;
  • Fazem a análise dos processos de solicitação ambiental, 
  • Coordenam campanhas de educação ambiental;
  • São representantes institucionais da SEMA e; 
  • Representam a secretaria em reuniões técnicas e articulação interinstitucional. 

Cada UC precisa ter um administrador, mas, na gestão estadual, como não há cargos criados na estrutura para todas essas unidades, algumas unidades que são próximas geograficamente têm o mesmo gestor. 

Newsletter

Escolha suas newsletters favoritas e mantenha-se informado
Este conteúdo é útil para você?