Crianças e jovens cearenses com doença rara esperam meses por entrega de remédio importado

Sem medicação, pacientes precisam ficar internados e ligados a bomba de glicose

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Caixa de medicamento custa cerca de R$1.500
Foto: Arquivo pessoal

Tem sido inconstante a entrega de medicamentos importados, conquistados após decisões judiciais, para jovens cearenses com uma doença rara que acomete o pâncreas e pode levar à morte. A espera pelos remédios tem durado entre três e oito meses e gera preocupação entre os responsáveis pelos cuidados com as crianças.

Sem o suporte do Estado, cada caixa do diazóxido (Proglicem) beira os R$1.500 e compromete o orçamento das famílias. O medicamento, que é de uso diário e controla a secreção anormal de insulina no organismo, é utilizado contra o hiperinsulinismo congênito. Entre os sintomas mais comuns, estão sudorese, tremores, convulsões e hipotermia. Em casos graves, porém, o paciente pode vir a óbito. 

Por ser um medicamento de alto custo, famílias cearenses em vulnerabilidade social recorrem à Justiça para ter direito a recebê-lo via Secretaria Estadual da Saúde (Sesa). Contudo, há quatro anos, elas alegam atrasos recorrentes na entrega. A situação já foi denunciada pelo Diário do Nordeste em duas ocasiões, em 2022 e 2023.   

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Eliana Martins, mãe de Mariana Martins, de 18 anos, batalha pela medicação há 11 e diz encarar o problema de fornecimento com frequência. Atualmente, por ser uma das pacientes mais velhas no Estado, Mariana precisa tomar duas concentrações do Proglicem. Uma delas está em falta há 8 meses.

“A gente já está no limite, já está sem condições, não tem mais de onde tirar, sabe? Ela não pode ficar nem um dia sem a medicação porque pode ter danos neurológicos irreversíveis, entrar em coma e pode vir a óbito”, teme a mãe.

Rotina alterada

Ao entrar em contato com a Secretaria, há sempre uma resposta padrão: o remédio está em fase de aquisição. “Parece mensagem copiada”, alega Josilene Freitas, mãe de Enzo Kauê, de 7 anos, diagnosticado com hiperinsulinismo congênito aos dois meses de vida.

Ela afirma que, quando o Proglicem falta por um mês, a família consegue repor; porém, neste ano, a última remessa foi entregue no início de fevereiro. De lá para cá, já são três meses em que Josilene precisa custear mais de R$4 mil só em comprimidos. Enzo também só consome um tipo de leite especial, cuja lata custa R$90 e dura apenas um dia.

Devido à complexidade da situação, a mãe optou por diminuir as doses administradas - em dias comuns, Enzo toma nove comprimidos por dia - e passar a alimentá-lo com mais frequência, até de madrugada, para evitar alterações na glicemia do menino.

“Além do hiperinsulinismo, ele ficou epilético e tem atraso mental. Hoje, se ficar sem essa medicação, precisa urgentemente ficar ligado a uma bomba de glicose, sendo que muitas vezes não resolve, porque ele ainda pode ter convulsões”, lamenta.

Eles têm o laudo de todas as crianças. Se sabem que as crianças não podem ficar sem a medicação, por que não compram? A gente tem que fazer rifa, campanha de doação, vai para a TV para denunciar, faz empréstimo, parcela no cartão, porque a medicação é muito cara.
Eliane Martins

O que diz a Sesa

Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Sesa informou que a chegada do medicamento Proglicem ao Ceará está prevista para ocorrer até a segunda quinzena de junho. 

“Atualmente, o medicamento em questão aguarda permissão para importação, onde é submetida a documentação à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão responsável pela revisão e aprovação dos medicamentos importados no Brasil”, ressalta. 

Sobre a demora na entrega do remédio denunciada pelas famílias, a Pasta reforça que a compra de medicamentos importados de alto custo “tem complexidades específicas, dependendo da oferta do produto no mercado e dos prazos processuais da judicialização, o que pode ocasionar eventuais atrasos nos fluxos”.

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