Cearense vence concurso nacional e vai aos EUA para conhecer Harvard: ‘parece um sonho’

Estudante do Ensino Médio quer cursar Medicina e enxerga possibilidade de estudar fora do País durante graduação

Escrito por Lucas Falconery , lucas.falconery@svm.com.br
Legenda: Ana Laura sonha em cursar Medicina e se especializar fora do País
Foto: Acervo pessoal

Ana Laura vestiu a farda da escola pública onde cursa o Ensino Médio no Bom Jardim, em Fortaleza, mas para dar uma volta pelos corredores de Harvard – uma das universidades mais prestigiadas nos Estados Unidos –, na última semana. Após vencer um concurso nacional de redação, a adolescente tem novos sonhos nos estudos.

O percurso começou com o convite para escrever sobre os principais desafios do Brasil para a iniciativa Harvard Book Prize Brazil, que recebeu 103 redações de 34 escolas brasileiras, entre públicas e privadas. O projeto é organizado por estudantes brasileiros da Universidade e teve 10 participantes do Ceará.

No final do último ano o resultado: o primeiro lugar foi para Ana Laura Freire de Souza, de 17 anos, que cursa o 3º ano do ensino médio na Escola de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI) Caic Maria Alves Carioca. Por lá, a festa é de todos e, especialmente, de uma funcionária. Dona Jacinta, avó da jovem, trabalha na escola de Laura.

Legenda: A estudante tem orgulho de poder representar a escola em uma iniciativa internacional
Foto: Acervo pessoal

“Eu fiz a redação e enviei sem expectativa, porque não acreditava que poderia tirar o primeiro lugar e ser destaque. A minha foi a escolhida da escola e quando eu recebi a mensagem nem consegui acreditar”, lembra Ana Laura.

É muito gratificante ir para fora representar um colégio público de um bairro que é conhecido como o lugar da violência. Sim, uma estudante de colégio público é capaz de chegar onde quer
Ana Laura
Estudante

Foram semanas de escrita, pesquisa, correção e novas reflexões sobre os efeitos do desemprego no País. Esse foi o tema escolhido pela adolescente desafiada a colocar em palavras o olhar para o mundo.

“Eu refleti muito sobre o desemprego, fome e desilusão de jovens que não conseguem emprego e acabam para drogas e prostituição. Tem pessoas que passam por isso porque não veem outra saída”, observa. Daí, partiu em busca de dados para retratar o assunto.

“Todo sábado, eu sentava e começava a escrever o que tinha pensado durante a semana. Toda segunda eu levava para o meu professor de redação, que me ajudava”, descreve Ana Laura.

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Bastou os professores descobrirem o edital do concurso para alguns estudantes demonstrarem interesse em participar. Ana Laura, por exemplo, admite que não entendeu a proposta de cara, mas isso não a impediu de agarrar a oportunidade que envolve Harvard.

“O esforço da Ana Laura foi muito importante porque desde o primeiro momento ela sentiu vontade de participar e de fazer o trajeto com qualidade. Isso se refletiu na escrita, na pesquisa e na correção até o último momento”, observa o professor de redação Francisco Roque.

Eu recebi a notícia e fiquei muito feliz pelo resultado dela, é um esforço coletivo, mas também muito particular dela. Nós corrigimos, indiquei elementos e ela foi construindo a redação com um método muito dela, uma vontade de melhorar
Francisco Roque
Professor de redação

Como foi a viagem 

O resultado publicado no último ano se concretizou no dia 18 de abril, quando Ana Laura arrumou a mochila com destino aos Estados Unidos. A chegada, com uma bagagem imensurável, aconteceu nesta quarta (6), mas ainda “parece que é tudo um sonho”.

“Recebi uma ligação perguntando se eu aceitaria uma viagem para conhecer Harvard, eu entrei nessa aventura e foi a melhor experiência que eu já vivi”, frisa a estudante.

Legenda: Ana Laura projeta novos sonhos a partir da viagem
Foto: Acervo pessoal

Lá, ela conseguiu visitar os cursos de Relações Internacionais, Ciências Políticas, Economia e Educação. Também pôde participar de uma aula com um professor da Universidade.

“O que mais me marcou na viagem foi na primeira noite, quando a gente teve um jantar com uma comunidade de brasileiros que estudam em Harvard e vê que existem pessoas como a gente com a capacidade de ir fora”, destaca Ana Laura.

Escutar a trajetória desses estudantes inspirou a jovem a pensar sobre as próprias possibilidades na futura carreira.

“O conhecimento que eu não tinha sobre estudar fora, eu não sabia que isso era possível, pensava que nunca ia conseguir porque é muito difícil. Indo para lá, abriu uma perspectiva muito grande na minha mente de enxergar a educação, a leitura e a escrita de outra forma”, conclui.

Legenda: Estudante foi destaque entre escolas públicas e privadas
Foto: Acervo pessoal

Confira um trecho da redação:

O maior desafio atual do Brasil é o desemprego. Segundo o IBGE, “O Brasil registrou a 16° pior taxa do mundo em 2021, sendo a região com maior concentração de desempregados no Nordeste, com taxa acima da nacional: 16,1%”. Esse dado corrobora: somos sim um dos países mais afetados no mercado de trabalho. [...] Esse fato ocorre por falta de oportunidades e má educação. Muitos cidadãos não têm o ensino superior e ainda alguns não tiveram sequer a oportunidade de serem alfabetizados. Tal problema abrange mais as comunidades marginalizadas e ocasiona famílias sem terem o que comer, pais com crianças em casa e sem ter condições de alimentar seus filhos.

Potencial da escrita

Estimular os estudantes para escrever é um desafio para os professores comprometidos a despertar uma boa capacidade de análise nos adolescentes. Em meio a tantos estímulos visuais e o fortalecimento da linguagem criada na internet, essa missão se amplia.

“Hoje os alunos escrevem muito, mas não com qualidade, ficam nas redes sociais o tempo todo e reproduzem determinados deslizes da norma e acabam não pensando o que estão escrevendo”, avalia Francisco Roque.

Por outro lado, as letras são valorizadas e criam oportunidades entre estudantes, como Ana Laura. “Ver esse esforço nos alunos é muito gratificante, porque na escola nós tentamos ter o laboratório como um lugar de dar feedback para o aluno”, pontua o professor.

Legenda: Mãe, Laura e avó, que inclusive trabalha na mesma escola, comemoram conquista da estudante
Foto: Acervo pessoal

A experiência internacional ampliou as possibilidades da estudante, mas um sonho antigo permanece como objetivo. Laura deve entrar em Medicina e agora projeta sair novamente do País para se especializar em cardiologia.

“Eu sempre falei e senti que queria cursar Medicina e indo para essa viagem refleti muito e pensei muito que é isso que eu quero. Vi as relações internacionais e me apaixonei, mas quero realmente cursar Medicina”. 

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