Violento, pop e político, "Bacurau" é entretenimento de primeira

Longa de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles foi o destaque na primeira noite do Festival de Cinema de Gramado. Antes da estreia em circuito nacional, filme terá pré-estreia especial em Fortaleza neste sábado (17) e também será exibido no Cine Ceará

Escrito por Antonio Laudenir* ,
Legenda: "Bacurau", dos pernambucanos Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles finalmente fez sua estreia pública em solo brasileiro.
Foto: Divulgação

A mensagem da placa é direta e sem muito chamego: “Bacurau: 17km - Se For, vá na paz”. Só mais adiante na trama sabemos que o nome daquele vilarejo esquecido no meio do sertão alui a um pássaro de hábitos noturnos. Porém tudo ainda é muito pouco para desvendar os acontecimentos violentos e inusitados que estão por vir.

"Bacurau", dos pernambucanos Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, finalmente fez sua estreia pública em solo brasileiro. O longa foi o destaque da primeira noite de exibição do 47° Festival de Cinema de Gramado. A exibição realizada na noite de sexta-feira (16) reuniu diretores, parte da equipe técnica e do elenco, incluindo a estrela Sônia Braga. Antes da estreia em circuito nacional, o filme terá  pré-estreia especial em Fortaleza neste sábado (17) em três salas e também será exibido durante o Cine Ceará, no dia 27 de agosto, às 19h, no Cine São Luiz.   

O mistério quanto às motivações dos personagens é um dos trunfos da dupla de diretores. Os primeiros minutos mostram o espaço estrelado para daí sermos jogados numa estrada detonada. Acompanhamos um nervoso caminhão pipa passando por cima de caixões. O cheiro da morte exala a cada minuto da projeção. Somos apresentados a uma importante figura daquele lugar,  dona Carmelita, já sem vida, diante do desterro. Seria o anúncio do agouro? 

Naquele lugar isolado, sem água, um drone espiona do céu. Cadáveres criados de bala começam a aparecer. Forasteiros armados até os dentes estão na região. Pouco a pouco, Teresa (Bárbara Colen), Domingas (Sônia Braga), Acácio (Thomas Aquino), Plínio (Wilson Rabelo), Lunga (Silvero Pereira) e outros habitantes chegam à conclusão de que estão sendo atacados. Resta identificar o inimigo e buscar coletivamente um meio de defesa.

Legenda: A exibição realizada na noite de sexta-feira (16) reuniu diretores, parte da equipe técnica e do elenco, incluindo a estrela Sônia Braga
Foto: FOTO: ANTONIO LAUDENIR

Munidos dessa trama, Kleber e Juliano devassam gêneros cinematográficos como faroeste, horror, ficção científica e ação.  É naquele povoado do sertão de Pernambuco (filmado no Rio Grande do Norte) que uma série de criaturas bizarras encontrarão um rumo. Mundos se chocam. Tecnologia, cangaço, pop arte, paranoia armamentista e invasão espacial.

"Bacurau", por si só, já é um personagem vital do enredo. O povoado resiste. Lida com a ganância política, a violência, o abandono. É um território de dor e violência. Por mais estranho que pareça. Ali também existe esperança. É a coletividade da pequena população quem nos dá esse fio de expectativa.

Os violentos invasores liderados por Michael (vivido pela lenda Udo Kier) descarregam suas vivências lunáticas por meio de armas. Caçam sem piedade e pouco explicam aquele desejo desenfreado de matar. Porém, vão lidar cara a cara com uma gente violentada por todo tipo de escrotidtão ao longo dos anos. Pessoas acometidas do abuso do corpo, da alma e do esquecimento.

Amor ao cinema

Por meio de "Bacurau", os diretores também alimentam o espectador com uma explosão de referências ao cinema fantástico. Da trilogia Mad Max ao universo seco de "Meu Ódio Será tua Herança" (1969) e "Amargo Pesadelo" (1972). Tem o sangue de "A Morte do Demônio" (1981), "Encurralado" (1971) e o DNA da criatura de "O Enigma de Outro Mundo" (1982). Banditismo, pistolagem, grilagem. É também o Brasil de 2019. Do culto à ignorância, censura, tortura e morte. 

Nada escapa ao desejo da dupla de construir um universo tão cínico e poético. "Bacurau" é resistência e explica que revoltas e insurgências são necessidade diante das injustiças. Elas foram muitas no País. Inclusive no Nordeste. Mesmo confuso em alguns momentos, quanto ao desenvolvimento e ligação dos temas e personagens que pretende explorar, o filme é uma explosão violenta de um cinema periférico e entrega um ótimo entretenimento.

É uma viagem lisérgica com cores de Glauber Rocha e John Carpenter. Juliano e Kleber desenvolveram uma peça violenta, bela e irônica. Projetam o conhecimento e controle de uma sétima arte feita nas bordas, periférica. Nada sai ileso de "Bacurau" nem os espectadores.

*O repórter viajou a convite do Festival de Cinema de Gramado

Serviço:

Pré-estreia "Bacurau" em Fortaleza neste sábado (17)
No UCI Kinoplex Iguatemi, às 21h
No Cinema do Dragão, às 22h
No Cinépolis Rio Mar Fortaleza, às 22h 

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