Trapper cearense Arthurzim se destaca e faz parcerias com grandes nomes do trap e Whindersson Nunes

Autor de "Sessão de Cria", o cearense acumula milhões de visualizações no YouTube e topo entre as músicas "Virais De Fortaleza" no Spotify

Escrito por Ideídes Guedes , ideides.guedes@svm.com.br
Arthurzim
Legenda: Arthurzim, 21, é trapper cearense
Foto: Thiago Gadelha

Arthurzim, 21, está sendo apresentado a um mundo que até pouco tempo desconhecia. Aprendeu como funciona uma apresentação de um show, se aproximou de artistas que são ídolos, descobriu a sensação de ser parado por um fã. O jovem morador do Conjunto Esperança, que começou a fazer música com auxilio de tutoriais do Youtube, já estabeleceu parcerias com Matuê, cantou com o carioca L7nnon e até com o comediante Whindersson Nunes, em projeto que ainda será lançado.

"Calabouço", a música de trabalho mais recente, é número um na playlist ‘Virais de Fortaleza’, no Spotify, pela terceira semana seguida. Animado pelo sucesso, ele tenta convencer os amigos da ‘quebrada’ a seguirem seu exemplo. Para o trapper, a música é uma forma de fugir do crime. 

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O músico recebeu a reportagem do Diário do Nordeste nas suas áreas. Após subir as escadas da casa onde vive, se destaca a vista privilegiada do Conjunto Esperança, na região do Grande Mondubim, periferia de Fortaleza. Para ele, ali era o lugar certo para começar a nossa conversa naquele meio de tarde de terça-feira, 26. 

A laje ainda está em construção, assim como a carreira de trapper. Arthurzim projeta ali um futuro estúdio. O local ainda está sem reboco e sem cobertura. A obra vai sendo construída de acordo com o dinheiro que recebe. Quando finalizada, o espaço vai ser ponto de encontro para novos artistas da região. Pensa no coletivo. “Vai ser meu projeto de vida”.

Arthurzim chama o repórter de ‘irmão’, tem o hábito de chamar assim a todos que chegam para falar com ele. Faz isso com o amigo Daniel, 18, que chega ao ambiente para gravar os bastidores da conversa. O pai, Seu Francisco, 50, também sobe para observar o movimento, e pede para Arthurzim não esquecer de oferecer bolo e café, que a mãe, Dona Márcia, 42, preparou, ao fim da entrevista. 

O trapper gesticula toda vez que fala. Fala como se estivesse rimando. Demonstra força no que diz, algo que virou postura de vida. Aos cinco anos, pensava em ser o novo Klaus Meine, da banda alemã Scorpions. Pegava uma guitarra de brinquedo e imitava o vocalista pelos cômodos da casa. Com 17, tentou a carreira de jogador de futebol. Fez teste no Floresta, time da Capital, mas não conseguiu conciliar com o trabalho em um supermercado do bairro. 

Tomou a frente o papel de provedor, quando resolveu sair de casa meses antes da pandemia. Morou em um barraco com a namorada. Tinha medo toda vez que voltava tarde do trabalho. Foram seis meses assim, até retornar para a casa dos pais. Precisava dessa liberdade para amadurecer. 

Do computador emprestado às milhões de visualizações no YouTube

Arthurzim
Legenda: Quando estava no ensino médio, Arthurzim começou a fazer as primeiras rimas.
Foto: Thiago Gadelha

Quando estava no ensino médio, Arthurzim começou a fazer as primeiras rimas. No intervalo das aulas, ele e os colegas faziam uma roda para mostrar quem era o mais criativo. Embora a maioria soubesse apenas conectar algumas palavras e falar frases feitas, alguns buscavam destaque para além da brincadeira. Uma amiga, que observava o grupo, perguntou se ele não teria vontade de se arriscar na música. 

De início, relutou por vergonha. Achava que o que produzia não era bom. Após convite da amiga, conheceu Doze, um rapper cearense. A conversa rendeu e foi determinante para o início da carreira de Arthurzim. Passou a ele um pouco da experiência de quem já havia vivenciado a dificuldade de viver de música.  “Ele me deu conselhos. Ele me fez começar. É por isso que eu sempre vou lembrar dele. Vai ser algo que vou contar por toda a vida, porque é real, porque é importante”, rememora.

Os conselhos daquela conversa que tiveram não chegaram a ser necessários naquele dia. Mas seriam bem aplicados por Arthurzim no futuro. O jovem resolveu tentar. Tirou um tempo para aprender como produzir um beat de rap. No YouTube, pesquisou vídeos de criação e edição. Pegou um celular antigo para captar o áudio, retirou o que tinha no interior do guarda-roupa e, em meio ao calor e ao desconforto, gravou o que saía na hora. Na sequência, ajustou o som e converteu para MP3 no computador que pegou emprestado da tia. 

Arthurzim
Legenda: Arthurzim pegou o computador da tia emprestado para gravar as primeiras músicas
Foto: Thiago Gadelha

As primeiras criações, Arthurzim quer esquecer, ou, como ele faz questão de dizer, arquivar. Entretanto, tem um apego sentimental por cada som que produz. “É a minha história”, conta. O primeiro hit bateu mil visualizações em um dia, o dobro do que imaginava para um ano. O número era significativo e veio após muito suor, literalmente. Arthurzim era obrigado a ajudar o pai na construção da casa para conseguir dinheiro para continuar na música, quando não estivesse em horário de aula. 

Amante das vivências, canta a própria realidade. Ele só descobriu que era bom trapper quando a canção ‘Sessão de cria’ chegou a 1 milhão de acessos no YouTube. Ela havia viralizado após jogadores de Free Fire fazerem vídeos usando trechos da música. “Lancei uma prévia na brincadeira. Pouco tempo depois, muita gente estava compartilhando. Fui bombardeado de mensagens, uma coisa que não acontecia há muito tempo”, lembra.

Atualmente, com 6,5 milhões, é a mais escutada no canal do artista na plataforma de vídeo. Ao todo, o espaço conta com mais de 10 milhões de acessos. 

Tropa da Lalá e a cura da depressão

Arthurzim
Legenda: Os meses vividos longe dos pais deixaram cicatrizes na alma de Arthurzim
Foto: Thiago Gadelha

Os meses vividos longe dos pais deixaram cicatrizes na alma de Arthurzim. Muitas madrugadas acordou lembrando das vezes que fez a mãe chorar por conta das drogas. Os conflitos com os pais nunca eram explícitos. Arthurzim nunca reclamou. Os pais queriam que ele estudasse, por medo do filho não realizar o sonho de ser cantor. Hoje, os dois são seus maiores fãs. São os primeiros a aplaudir, sendo, muitas vezes, de maneira indiscreta.

O rapper realmente não gosta de estar só. Na vez que ficou, quando estava com depressão, pensou em tentar suicídio na mesma laje que virou território de comemoração de amigos e família. À época, desistiu de tirar a vida após receber uma mensagem de um fã anônimo nas redes sociais. No texto, um agradecimento pelas músicas que haviam melhorado a saúde mental daquele autor. “Foi Deus, tenho certeza”. Após ler aquelas palavras, chorou copiosamente.

O jovem valoriza cada um dos amigos. Quando estava desempregado, eram eles que ajudavam na alimentação de Arthurzim. Para ele, é importante compartilhar a vida com os cúmplices. Uma união que ganhou nome de tropa, a Lalá, em alusão às vestimentas da grife francesa Lacoste. “Quando eu estava apertado, eles se juntavam e o que tinha em casa levavam pra mim. Eu sempre digo que, no meu aniversário, tem minha mãe, meu pai, minha mulher e meus amigos”, expõe. 

Na região, todos os conhecem assim. Cada amigo tem um jacaré tatuado no corpo. São diferentes um do outro, mas têm afinidade e conexão profundas. Não à toa, todos participam dos clipes e de todas as conquistas do cantor. No primeiro show, estavam na primeira fila cantando as letras das músicas. “Só eles sabiam”, gargalha.

Arthurzim
Legenda: Arthurzim não pensa em ser rico ou ser famoso
Foto: Thiago Gadelha

O comprometimento é percebido quando ele fala do futuro. Arthurzim tem metas e métodos. Não pensa em ser rico ou ser famoso, quer apenas chegar ao fim do mês com as contas pagas, ter uma geladeira cheia de comida, dar conforto aos pais e, principalmente, viver de música. 

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