Parada pela Diversidade Sexual chega à 20ª edição cobrando visibilidade para pautas dos LGBTI+

Marcada para o próximo domingo (30), a marcha defende o fim da discriminação contra orientação sexual e identidade de gênero mais uma vez na Avenida Beira Mar. O local é palco do protesto desde 1999

Escrito por Rômulo Costa , romulo.costa@verdesmares.com.br
Legenda: A primeira edição da parada reuniu pouco mais de 300 manifestantes, mas com o tempo ganhou novos apoiadores
Foto: FOTO: FERNANDA SIEBRA

Não é de agora. Era 29 de junho de 1999 quando a Parada pela Diversidade Sexual atravessou pela primeira vez a Avenida Beira Mar, em uma tarde de segunda-feira. Fortaleza sediava um encontro nacional que discutia os direitos de travestis e transexuais, e os organizadores, que já alimentavam a vontade de ter uma marcha que desse projeção à agenda da comunidade, animaram-se em realizar o protesto no encerramento do evento. Foi a semente para uma celebração política que se refaz a cada ano na mesma avenida, como acontecerá no próximo domingo (30), quando a atividade alcança a 20ª edição no Estado.

"Até aquele momento a gente só tinha vontade, mas não havia nenhuma iniciativa para realizar a parada. Achávamos que as pessoas não iam participar, principalmente, em um Estado extremamente machista e preconceituoso como o nosso", reconstitui Orlaneudo Lima, que era o presidente do Grupo de Resistência Asa Branca (Grab) na oportunidade.

À época, ele se empolgou com a ação que percorreu pouco mais de um quilômetro entre o antigo Hotel Esplanada e a Barraca do Joca, na Beira Mar. "Não senti preconceito, mas percebia a curiosidade das pessoas nas calçadas, mesmo sem ninguém querer acompanhar", refaz o ex-organizador.

Para quem imagina o tamanho do evento agora - com seus trios-elétricos, o brilho das fantasias e a multidão que acompanha o trajeto entre músicas e discursos - talvez não alcance a modéstia daquela primeira ousadia da militância.

Era apenas um carro de som, emprestado de um sindicato, que guiava os manifestantes pelo percurso e amplificava as falas dos manifestantes. Eles se revezavam ao microfone cobrando direitos básicos. Algumas reivindicações, ainda repetidas até hoje, como o combate aos crimes contra LGBTI+, o direito à saúde e à visibilidade da comunidade.

"Já naquela época, a gente discutia a violência contra os homossexuais e os transexuais. A pauta era o combate à discriminação e a busca pela liberdade", demarca Orlaneudo Lima.

Foi um momento de "libertação", na memória de Chico Pedrosa, atual presidente do Grab, entidade que integra a organização da parada desde o primeiro evento.

"A parada cresceu, mas essa voz política ainda permanece. A gente dá esse tom ainda, porque é um manifesto. As pessoas falam: 'Ah, mas a parada é uma festa', mas a festa também é uma forma de fazer política", diz.

A fotógrafa Alice Oliveira, militante do movimento das lésbicas do Ceará, concorda com Pedrosa. Ela estava na primeira manifestação e acompanhou a evolução da parada ao longo dos anos. "Apesar de parte da sociedade pensar que é só 'oba-oba', as paradas sempre foram um marco político e reivindicatório. Na minha avaliação, nos últimos tempos essa força política tem ficado ainda mais forte nessas marchas", entende.

Família

Até o ano passado, a jornalista Mara Beatriz reconhecia a importância do evento, mas não tinha atinado a ir à parada. O interesse surgiu quando a filha, Lara, 14 anos, reconheceu-se como transexual. Com isso, o tema da diversidade se ampliou dentro da própria casa.

Mara integra o coletivo Mães pela Diversidade, entidade nacional que reúne familiares de LGBTI+ que se organizam politicamente para lutar contra a discriminação.

No Ceará, o grupo é formado por 50 mães que se juntam a outros familiares para formar a ala inicial da parada desde o ano passado. "É uma demonstração de que todas aquelas pessoas que vêm atrás têm o nosso amparo. São nossos filhos, não nasceram de chocadeira, como se diz. Mães, pais e irmãos estão juntos para dizer: 'não mexam com os nossos'", afirma.

Para ela, estar na Parada pela Diversidade Sexual é uma atitude cheia de simbolismo. "Tem uma militância por trás daquilo e também uma grande comemoração. Estamos ali celebrando a vida dos nossos filhos, celebrando o fato de eles estarem vivos por mais um ano em um Estado tão violento contra os LGBTs, principalmente no caso dos transexuais".

União

Acolhimento é uma atitude que o estudante João Praxedes sentiu quando foi pela primeira vez ao evento, há dois anos. Quando ele soube da existência da Parada, aos 16, ainda não se reconhecia como homem trans. Com o tempo, sentiu necessidade de se inserir na luta pelos próprios direitos e foi para a atividade.

Ver várias pessoas da comunidade LGBTI+ juntas dá a sensação de união para o jovem. Frequentar esse espaço é fortalecer as próprias pautas e um exercício de existência, ele diz. Por isso, João e um grupo de amigos se organizam para estar novamente na Parada pela Diversidade Sexual no próximo domingo.

"Vou, porque a gente precisa ter voz. A gente precisa enfrentar esse momento em que tentam tirar nossos direitos", explica.

Aos 24 anos, a fala de João indica que, apesar dos avanços ao longo dos anos, os motivos que levam o jovem a estar na rua no próximo domingo são semelhantes aos que impulsionaram as pouco mais de 300 pessoas a se manifestarem naquela tarde de 1999. Ele, assim como tantos, ainda espera ter reconhecimento. Ou como o próprio resume: "Estamos ali reivindicando direitos, existindo e resistindo".

Serviço
20ª Parada pela Diversidade Sexual do Ceará
Concentração neste domingo (30), às 15 horas, em frente à Barraca do Joca (Avenida Beira Mar, 3101), próximo ao Jardim Japonês. Contato: (85) 99615.3010.

Confira os temas da parada ao longo dos anos
1999
- Sem tema
2000 - Não teve parada
2001 - Sem tema
2002 - Venha saciar sua sede de liberdade
2003 - Solidariedade, paz e amor de todas as formas
2004 - Igual a você não existe ninguém
2005 - Direitos Iguais: Nem mais, nem menos
2006 - Homofobia é crime! Direitos sexuais são direitos humanos
2007 - Por um mundo sem racismo, machismo e homofobia!
2008 - Homofobia mata! Por um estado laico de fato!
2009 - 1969... 79... 89... 99... 2009... A Luta pelos direitos LGBTT continua
2010 - Vote contra homofobia defenda a cidadania
2011 - Unidos/as somos mais fortes! Pela aprovação do PLC 122/2006 já!
2012 - Homofobia tem cura: Educação e criminalização
2013 - LGBT para o armário nunca mais, união e conscientização na luta contra o fundamentalismo
2014 - Chega de impunidade! É hora de tornar crime a homofobia, a transfobia e a lesbofobia
2015 - Retroceder jamais, #SomosFamílias! Exigimos estado laico e direitos iguais!
2016 - Basta de close errado. Por cidadania plena! Nenhum passo atrás!
2017 - A parada é nas ruas! 18 anos construindo, resistências e lutas por democracia e contra o LGBTcídio
2018 - O genocídio continua! A luta é todo dia por Dandara, Marielle e por todas
2019 - Topo qualquer Parada! O medo não nos cabe

 

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