Bandas Fossil e O Jardim das Horas retornam ao cenário com discos inéditos

Reconhecidos nacionalmente, grupos cearenses reúnem músicos de destaque na cena musical independente dos últimos 20 anos

Escrito por Antonio Laudenir , laudenir.oliveira@svm.com.br
O jardim das Horas e Fossil
Legenda: O jardim das Horas e Fossil
Foto: Márcio Távora/Divulgação

No intervalo de uma semana, Fossil e O Jardim das Horas lançam discos inéditos. Além da proximidade das datas, outra semelhança é o fato dos grupos retornarem após um período de pausa nas atividades. Reconhecidas nacionalmente, as bandas cearenses são donas de estradas que se cruzam. 

Os dois grupos possuem integrantes em comum. Contemporâneos, são músicos atuantes na cena independente de Fortaleza dos últimos 20 anos. As coincidências vão só até aqui. Em 2021, os momentos individuais dos grupos é diferente. 

Após hiato de cinco anos, a Fossil voltou aos estúdios. “4” foi gravado à distância. cozilos Vitor e rodrigo éh @rudriquix fizeram suas contribuições aqui de Fortaleza. Já Klaus Sena e Victor Bluhm criaram direto de São Paulo. As seis faixas do material trazem ainda participações de Negro Leo, Thomas Harres, Clau Aniz, Clarisse Aires e Gabriel de Sousa.

Raphael Haluli,  Cozilos Vitor, Carlos Gadelha, Victor Bluhm e Laya: disco ao seu tempo
Legenda: Raphael Haluli, Cozilos Vitor, Carlos Gadelha, Victor Bluhm e Laya: disco ao seu tempo
Foto: Márcio Távora

Fossil surgiu em 2004. Nesse intervalo, projetou em Fortaleza o experimentalismo por meio de crias instrumentais. “4” completa uma discografia  de fôlego, formada ainda por "Desconforto" (2004), "Insônia" (2008) e "Mocumentário" (2012).

Poesia etérea 

O Jardim das Horas iniciou a jornada no ano de 2003. Contudo, o primeiro nome do projeto era “O Quarto das Cinzas”. Laya Lopes (voz), Carlos Eduardo Gadelha (guitarra/programação) e Raphael Haluli (baixo) constituíam o trio base. O começo ainda contou com nomes como David Brasileiro e Leco Jucá (Montage).

Bases eletrônicas, trip hop, raízes poéticas nordestinas, música do mundo. O Jardim das Horas desbravou importantes festivais e palcos pelo Brasil. Abril pro Rock, Feira da Música, Sesc Pompeia e Itaú Cultural são alguns dos pontos cravados no mapa. Produziram os discos “O Quarto das Cinzas” (lançado em 2010 pelo Projeto Pixinguinha da Funarte) e o EP “Cidadela” (2013). 

Em 2015, Cozilos Vitor e Victor Bluhm (integrantes da Fossil) entraram no Jardim. Agora quinteto, a banda preparava as faixas do segundo e futuro disco. O EP “Cidadela” trouxe quatro músicas gravadas com esta formação. A banda interrompeu as atividades no momento em que “Carbono” estava no estágio de finalização. 

Carvão e diamante

Seis anos se passaram e finalmente o disco chega ao mercado. Respeitou o tempo de escolha dos integrantes. A turma do selo Mercúrio Música colou no apoio e assina o lançamento. Outra frente envolvida na parceria é a mixagem de Klaus Sena (Estúdio Índigo Azul). Sena integra o Fossil e também atuou na captação dos arranjos.

Duas composições de “Carbono” constam no EP de 2013. São elas, as espertas “Maculada” e “Já Descobri Como Fazer”.  A obra conta ainda com "O Lugar", "Vermelho Azulzim / Cidadão Instigado" e "Palavra Silêncio". O conjunto de canções soa consistente. 

Nascer, renascer, a morte e a continuidade: mistérios além da razão... O Jardim das Horas busca essas reflexões em sua obra
Legenda: Nascer, renascer, a morte e a continuidade: mistérios além da razão... O Jardim das Horas busca essas reflexões em sua obra
Foto: Márcio Távora

“Vermelho Azulzim” é de uma delicadeza rara e constitui o primeiro ato que adentra Cidadão Instigado. “Palavra Silêncio” soa garageiro  e pop. “O Lugar”, que abre o disco, também se serve dessa mesma energia. 

Ampliando experimentações e ideias, “Carbono” aparenta ser menos solar que “O Quarto das Cinzas” (2010). Doses de melancolia pairam no ar. Com a mesma intensidade, revela artistas preocupados, à época, em devassar outras fronteiras.

É sal

A criação de um disco resulta de inúmeros fatores. Nem sempre segue o planejamento idealizado pelos artistas. Além de imprimir a individualidade de cada músico, o processo de gravação é suscetível a imprevistos. A turma do Fossil correu na navalha e permitiu-se uma construção coletiva. Uma peça que espelha os atuais tempos pandêmicos.  

cozilos Vitor e rodrigo éh @rudriquix
Legenda: cozilos Vitor e rodrigo éh @rudriquix
Foto: Melina Aragão

O espectro urbano escandecia as ideias do quarteto. Um trabalho de reencontro no meio do caos, como gosta de situar a banda. Como bem descreve Cozilos no material de divulgação do disco, existe felicidade no fato das engrenagens da Fossil retornarem a girar. Mas, é preciso estar ligado. 

"É a alegria de estar produzindo algo novo depois de cinco anos, mas, ao mesmo tempo, temos muitas dúvidas sobre o futuro. O álbum tem ritmos que podem ser dançados, despertando um sentimento obscuro ou até uma possibilidade de luz no fim de túnel.

Seis composições integram "4". "Escopo 26" denota uma colagem de áudios de "zap" (uma ideia do ambiente e das interações humanas a partir dos dispositivos móveis). "Lombra 8 y 9"  e "Sta Quitéria Nuclear Plant" emanam a estranheza de um oceano turvo.

Victor Bluhm e Klaus Sena direto de SP
Legenda: Victor Bluhm e Klaus Sena: cearenses produzindo em SP
Foto: Ana Carol Azevedo

"Lombra 14 cHIp-párarãn" é dub dançante e essencialmente irônica. "Sala 18, 42 bilionários" ecoa quase uma trilha de horror. Tema propício à cruel realidade de uma minoria fazer fortuna diante da desgraça. "Petróleo da Sabi no Pé" conclui a sinfonia torta pretendida pelo Fossil.

Legenda: Capa por Diego Maia

Fossil

"4" (2021)

(arte de capa por Simon Fernandes / diagramação por Diego Maia)
Legenda: Arte de capa por Simon Fernandes / diagramação por Diego Maia

O Jardim das Horas

"Carbono" (2021)

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