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Piso da Enfermagem: o que a categoria diz sobre as dificuldades de pagamento

A inconsistência sobre o número de profissionais e o entendimento de que os repasses federais são complementação foram citados por representantes da enfermagem

Escrito por Luana Barros , luana.barros@svm.com.br
Piso da Enfermagem
Legenda: SindSaúde realizou reunião com parlamentares estaduais e federais para tratar do piso da enfermagem
Foto: Divulgação/SindSaúde

A imprecisão no cálculo de quantos profissionais pertencem à categoria da enfermagem tem sido um dos principais entraves para a aplicação da regra federal em estados e municípios. Por conta disso, gestores municipais e federais têm apontado a insuficiência de recursos para conseguir aplicar o piso da enfermagem — aprovado ainda em 2022 pelo Congresso Nacional.

Contudo, para representantes da categoria, é importante relembrar que os recursos enviados pelo governo federal são apenas para a complementação sobre os salários pagos por prefeituras e governos estaduais. Além disso, eles criticam a "precarização" da categoria, com poucos quadros concursados na administração pública e uma maioria contratados ou cooperados — apesar de todos serem pagos pelos cofres públicos.

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Os assuntos foram abordados durante café da manhã promovido pelo SindSaúde com parlamentares cearenses nesta segunda-feira (12). Toda a bancada do estado no Congresso, deputados federais e senadores, foram convidados para o momento, mas estiveram presentes apenas Idilvan Alencar (PDT) e Enfermeira Ana Paula (PDT). Também esteve presente o deputado estadual Felipe Mota (União).

Presidente do SindSaúde, Marta Brandão explica que os recursos disponibilizados pela União são para a complementação dos salários da categoria, ou seja, devem pagar apenas o montante necessário para que os pagamentos alcancem o valor do piso. 

"O problema é que, no Ceará e no Brasil, os prefeitos pagam uma miséria aos técnicos de enfermagem. A maioria ganha um salário mínimo. Então, para chegar R$ 3.325 é um impacto financeiro alto. Então, eles estão com esse problema, mas esse problema não é da enfermagem. Esse problema é do gestor municipal, que não valoriza essa categoria", considera.

Segundo a legislação federal, ficou fixado o salário de R$ 4.750 para enfermeiros; R$ 3.325 para técnicos de enfermagem; e R$ 2.375 para auxiliares de enfermagem e parteiras.

Enfermeira Ana Paula lembra, inclusive, que, do ponto de vista jurídico, não é possível que os repasses federais cumbram 100% dos valores pagos a enfermeiros, técnicos e auxiliares. "Todo município já tem o quantitativo de profissionais trabalhando hoje, consequentemente já pagam (os salários). Então, o cálculo desse repasse foi feito como complementação e não 100%", ressalta. 

Imprecisão de dados  

A deputada federal também cita a falta de consistência de dados quanto ao número de profissionais da enfermagem que atuam em cada município. Ao definir a divisão dos R$ 7,3 bilhões para o pagamento do piso pelos entes federados, o Ministério da Saúde usou como base a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS).

Contudo, este instrumento não contabiliza, por exemplo, os profissionais contratados por meio de cooperativas de Saúde. Segundo a assessoria do SindSaúde, são mais de 5 mil profissionais da enfermagem (técnicos, auxiliares e atendentes) contratados neste modelo.

"O Ministério escolheu na perspectiva de que, na enfermagem, não existia essa precarização da contratação direta. (...) Na enfermagem, (os concursados) são minoria. Aqui no estado do Ceará, apenas em todos de 25% a 30%", explica. 

Marta Brandão afirma que é possível "contar nos dedos" servidores efetivos, ou seja, concursados, nos municípios. E, como os profissionais cooperados não são contabilizados no RAIS, eles ficaram de fora do cálculo para o envio de recursos."Isso não é culpa do cooperado, que não pediu para ter um vínculo precário. E o piso da enfermagem não estabeleceu (a forma de) vínculo, portanto, é para todos, independente de ser efetivo ou cooperado", completa a presidente do SindSaúde. 

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A "correção desses números", aponta a Enfermeira Ana Paula, é agora uma das prioridades para, se for preciso, haver "uma outra complementação, com outra abertura de crédito adicional no Orçamento federal". 

O Ministério da Saúde abriu prazo, que segue até a próxima sexta-feira (16), para que Estados e municípios possam retificar o número de profissionais da categoria pagos pela administração pública. Contudo, isso não garante um aumento do repasse, ressalta Idilvan, que acrescenta que o momento "é grave". 

"É preciso entender o momento grave que essa discussão passa. 'Ah, (o valor necessário) é 3 vezes maior do que o que está na conta dos municípios, vamos abrir um canal que isso simplesmente vai ser resolvido'. Não é assim, é preciso ter senso de realidade", afirma o deputado.  

Pressão de parlamentares

O encontro reuniu, em Fortaleza, além dos parlamentares federais e estaduais, vereadores de municípios cearenses, como Canindé, Maranguape e Fortaleza. Um dos pedidos feitos foi para que estes parlamentares intensifiquem as pressões sobre as prefeituras para aplicação do piso da enfermagem. 

"Eles têm um papel importantíssimo nessa discussão. É exatamente com os vereadores que essa arena política vai acontecer. (...) Essa discussão está agora na esfera do Executivo e o vereador é quem fiscaliza o Executivo", ressaltou Idilvan Alencar. 

O deputado estadual Felipe Mota pediu ao SindSaúde a disponibilização de um modelo de projeto de lei referente a implementação do piso da enfermagem, como forma de padronizar as legislações apresentadas nos parlamentos cearenses — tanto estaduais como municipais. 

"O que eu sugeri é que o SindSaúde fizesse uma minuta e repassasse para todas as assessorias jurídicas das 183 câmaras para que fosse aprovado um projeto único. O (projeto de piso da enfermagem) nacional não é único e não serve para o Brasil? Então eu acho que o que vai ser entregue aos municípios cearenses devem ser unificados", disse o parlamentar. 

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Apesar de não ser prerrogativa dos vereadores apresentarem propostas que, de alguma forma, interfiram no orçamento municipal, é possível a eles apresentar projetos de indicação — ou seja, sugestões ao Executivo e que podem voltar à Câmara a partir da apresentação pela prefeitura. 

E, completa Mota, "é uma forma de pressionar". "Não podemos lembrar só dos enfermeiros, auxiliares, técnicos e parteiras no tempo da pandemia, quando nós batíamos palma pra ele. Nós precisamos lembrá-los agora, quando tem uma lei, tem um piso e eles estão buscando mais nada do que o seu direito", disse.

Idilvan Alencar ressalta a necessidade de criar uma "rede" para contribuir com a aplicação do piso, inclusive fornecendo informações aos vereadores cearenses. Uma das iniciativas será a realização, ainda neste mês, de encontros da categoria em outras duas regiões do estado, a Norte e o Cariri. 

Uma delas será na próxima sexta-feira (16), em Sobral, enquanto a outra será na próxima segunda-feira (19), em Juazeiro do Norte. Deputados federais e senadores da bancada cearense também devem ser convidados a participar dos encontros. 

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