Legislativo Judiciário Executivo

Longe de cargos eletivos, Tasso mantém papel de fiador da oposição no Ceará

Tucano recebeu lideranças da oposição do próprio partido, do União Brasil e até do PL em seu escritório para aconselhar sobre estratégias eleitorais

Escrito por
Igor Cavalcante igor.cavalcante@svm.com.br
Tasso em reunião com lideranças da oposição
Legenda: Tasso em reunião com lideranças da oposição na noite da última terça-feira (15)
Foto: Kid Júnior

Prestes a completar 40 anos de vida pública, há três anos longe de cargos eletivos e sem pretensão de voltar a disputar eleições, o ex-senador Tasso Jereissati (PSDB) recebeu, na noite de terça-feira (15), lideranças de vários espectros da oposição no Ceará. Integrantes do PSDB, do União Brasil e até do PL foram até o escritório do tucano para ouvir conselhos e receber a benção para montar estratégias para as eleições do próximo ano. Desde que deixou o Governo do Ceará e elegeu o sucessor Lúcio Alcântara, Tasso acumula 15 anos como oposicionista no Estado. Agora, ele assume um papel de referência para o rearranjo da oposição no Estado.

Um dos porta-vozes do encontro entre os parlamentares e dirigentes partidários, o ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, comenta sobre o papel desempenhado por Tasso na conversa.

Veja também

“Ele é um ponto de inflexão na história do Ceará. Ele construiu, junto com outras lideranças, uma ruptura com uma política tradicional anterior que levou o Ceará a uma situação fiscal, social e econômica muito atrasada. Ele desempenha ali uma liderança corajosa e administrativa que muda os rumos do Ceará, inclusive da própria política”, diz.

Quase quarenta anos depois dessa primeira eleição de Tasso, Roberto Cláudio avalia que o tucano segue “muito ativo na militância partidária e se mantém como uma referência para as gerações posteriores”.

“São pessoas que fazem das suas palavras uma referência de sabedoria. Pelo próprio espírito público muito arraigado, é importante para jovens políticos e também para quem têm experiência receber os conselhos e sugestões do (ex-)senador. O Tasso tem uma fina capacidade de articulação política que está sendo muito importante nesse momento do Estado que a gente vive para articular forças de oposição de diferentes gerações e partidos”
Roberto Cláudio
Ex-prefeito de Fortaleza

Articulador de mudanças políticas

Os primeiros passos de Tasso na política ocorreram em meio a uma articulação para promover mudanças políticas abruptas no Ceará. O político iniciou um movimento liberal em defesa da modernização do Estado. Em 1976, ele ingressou no Centro Industrial do Ceará (CIC), junto com outros jovens empresários cearenses.

O grupo fazia uma defesa da redemocratização e da reestruturação da economia nordestina, marcada por grave desequilíbrio fiscal, pelos piores índices sociais do país, com recorde de mortalidade infantil e violência, por exemplo. Os empresários se colocavam contra os coronéis apoiados pelos governos militares – César Cals, Adauto Bezerra e Virgílio Távora –, como contou reportagem do Diário do Nordeste

Tasso discursa em sua posse
Legenda: Tasso governa o Ceará durante três mandatos, sendo o primeiro deles em 1986
Foto: Paulo Rocha

Em 1986, Tasso foi eleito governador do Ceará e começou a liderar o chamado "Governo das Mudanças", adotando uma postura de ruptura com o clientelismo e o assistencialismo. Em 1995, ele retornou ao cargo e ficou até 2002, quando foi eleito senador pela primeira vez. A partir do primeiro Governo Tasso, o PSDB atinge seu ápice no Ceará. Em 1990, a sigla conseguiu eleger sete deputados federais e 18 estaduais. Em 1998 – foram 12 deputados federais e 21 estaduais. 

A imagem que ficou

Para o cientista político e professor universitário Cleyton Monte, pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem/UFC), o currículo construído nessa época pelo tucano é a explicação para ele ser tão cobiçado pelos oposicionistas.

“Essa influência dele está muito ligada ao simbolismo das gestões, ele conseguiu imprimir esse imaginário forte do ‘mudancismo’ e isso ainda mobiliza, do ponto de vista eleitoral, quem tem mais de 40 ou 50 anos, ficou essa ideia de mudança e ousadia”, comenta.

Cleyton Monte reforça que o tucano também teve mandatos de destaque no Senado Federal e sempre exerceu um papel de forte liderança dentro do PSDB.

“Por isso ele é tão buscado nas eleições para emprestar o nome e a força política para as candidaturas, a imagem dele é muito positiva, não é associada diretamente a escândalos (...) Ele é visto como alguém que iniciou políticas públicas importantes, obras importantes e ficou um bom tempo, praticamente três mandatos, além da ligação com a gestão do Lúcio Alcântara e do Ciro Gomes, ele foi muito influente por muito tempo”
Cleyton Monte
Cientista político, professor e pesquisador

A cientista política Monalisa Torres, professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), reforça essa análise e aponta que o tucano é visto como “um articulador, uma pessoa de diálogo e de montagem de arranjos”. 

“O Ceará era um modelo de gestão tucana para o resto para o restante do País, isso não é pouca coisa. E ele, em função desse lugar que ocupou na história política, acabou tendo também o papel de fiador de outros nomes da oposição, a exemplo do Capitão Wagner”, aponta.

“Então esse respaldo e respeito que ele tem dentro do próprio campo ideológico, ele construiu com essa imagem de um político de bom senso, democrata, que sabe transitar, articular, montar arranjos e dialogar. É importante que os diferentes campos políticos tenham nomes assim para costurar essas alianças (...) Essa tem sido a grande contribuição recente dele, isso não tem necessariamente a ver com ocupação de cargos políticos”
Monalisa Torres
Cientista política, professora e pesquisadora

Aliado de primeira ordem do ex-senador e uma das figuras mais tradicionais do PSDB Ceará, o ex-secretário de Saúde do Ceará, o médico Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho, o Dr. Cabeto, revela como os tucanos enxergam internamente o papel do ex-senador. 

Para ele, além de “um espírito público incomparável, da coragem da grande capacidade de diálogo”, Tasso tem uma “trajetória de disrupção que talvez não exista na história do Ceará”. 

“Isso o transforma em referência para pessoas de todas as idades, inclusive os mais jovens, que o procuram para que ele colabore nessa transição que os cearenses e brasileiros estão sentindo e percebendo que necessitam”, afirma. 

“Ele é fundamental, seja na orientação desse processo, na liderança, no exemplo, na responsabilidade, na experiência, no arrojo ou na capacidade de unir pensamentos e pessoas”, conclui.

Tasso em um PSDB desidratado

Apesar do legado do “mudancismo”, as transformações promovidas entre a segunda metade dos anos 1980 e o início dos anos 2000 não foram suficientes para sustentar a força do PSDB no Ceará. A sigla passa a decair de desempenho a partir da saída de Tasso do comando do Executivo estadual.

Veja também

Em 2006, o tucano apoiou, informalmente, a candidatura de Cid Gomes ao Governo do Ceará contra a candidatura à reeleição de Lúcio Alcântara, de seu próprio partido. Já em 2010, os irmãos Ferreira Gomes não apoiaram a candidatura à reeleição de Tasso ao Senado. O pleito daquele ano marcou definitivamente o rompimento entre Tasso e o grupo liderado pelos irmãos Cid e Ciro Gomes. À época, o tucano não conseguiu se reeleger.

Campanha de 2018, quando Tasso estava na oposição
Legenda: Campanha de 2018, quando Tasso estava na oposição
Foto: JL Rosa

Assim, a desidratação do PSDB Ceará ocorre simultaneamente ao afastamento dos integrantes da sigla do grupo governista. Em 2016, Tasso embarcou na oposição também em Fortaleza, apoiando Capitão Wagner contra o ex-prefeito Roberto Cláudio (à época, PDT). Já em 2018, ele foi o principal fiador da candidatura do General Theophilo ao Governo do Ceará, em uma disputa contra Camilo Santana. 

Tasso ao lado de Ciro Gomes. Ambos sentados
Legenda: Tasso e Ciro começaram a se reaproximar em 2019
Foto: José Leomar

A partir de 2019, no entanto, Tasso e Ciro começaram a dar sinais de uma reaproximação, o que levou o PSDB a apoiar, no segundo turno da eleição para a Prefeitura de Fortaleza em 2020, a candidatura de José Sarto (PDT). Em 2022, em meio ao racha entre PT e PDT, Tasso ganha novo impulso como oposicionista, consolidando a aliança com a ala do PDT mais distante dos petistas. No pleito daquele ano, o tucano ainda apoiou, no segundo turno, a eleição do presidente Lula (PT), contudo, a nível local, ele seguiu em polo oposto ao PT — postura que se repetiu em 2024.

O legado de Tasso para a oposição

Em pouco mais de uma década, Tasso acumula aliança com diversos oposicionistas que não conseguiram romper o ciclo do atual grupo governista que comanda o Estado, por outro lado, o tucano é uma figura constante na oposição ao PT ao longo de todos esses anos.

“Restou, portanto, essa imagem do passado da gestão Tasso, mas eleição não é só presente, é você apresentar uma história, fazer o diagnóstico do presente e vender o futuro, ou seja, é o encontro do passado, do presente e do futuro, e o Tasso representa esse passado, tanto que ele mobiliza muito em torno disso, até mesmo defendendo o nome do Ciro Gomes como candidato ao Governo, é uma tentativa de remontar esse passado de mudanças”
Cleyton Monte
Cientista político, professor e pesquisador

Mesmo sem mandato e sem planos de retornar à disputa eleitoral, Tasso Jereissati mantém influência sobre os rumos da oposição no Ceará. O capital político construído ao longo de quase quatro décadas, somado à habilidade de articulação e ao simbolismo de suas gestões, fazem dele uma das referências mais tradicionais do Estado e dos quadros tucanos do País. Em meio a um PSDB enfraquecido e a uma oposição em processo de reconstrução, o ex-senador segue sendo procurado por quem busca não apenas conselhos estratégicos, mas também pelos que querem capitalizar sobre seu legado.

Este conteúdo é útil para você?
Assuntos Relacionados