Em ano eleitoral, quase 30% das sessões da Alece foram suspensas por ausência de deputados
O número de sessões levantadas neste ano é quase o dobro do registrado no mesmo período de 2023
Em ano de eleições municipais, quase 30% das sessões da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) foram suspensas ou não realizadas por ausência de deputados em plenário. Ao todo, foram 12 (26%) de 46 sessões ordinárias levantadas por falta de quórum em apenas quatro meses de trabalho neste ano, tendo em vista que em janeiro os parlamentares estavam de recesso.
Das 12, quatro sequer foram abertas porque não havia legisladores suficientes na Casa para realização da sessão. As demais chegaram a ser iniciadas, mas foram interrompidas após solicitação de verificação de presença — recurso regimental que pode ser utilizado pelos deputados a qualquer momento da sessão. A maioria das verificações, inclusive, partiu de parlamentares da base governista, sendo alvo de questionamentos pela oposição.
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A reportagem analisou o período de quatro meses de trabalho neste ano, desde a primeira sessão de 2024, realizada no dia 6 de fevereiro, até a 46ª, ocorrida no último dia 4 deste mês. Não foram consideradas sessões ordinárias levantadas em razão de pesar de falecimento.
Os dados foram retirados das atas da Assembleia e verificados nas transmissões das sessões no Youtube e Facebook da Casa.
Quase o dobro de 2023
O número de sessões levantadas neste ano, inclusive, é quase o dobro do registrado no mesmo período do ano passado. Em 2023, apenas 7 de 46 foram suspensas.
Apesar do recurso de verificação de presença estar previsto no regimento interno da Casa, a utilização vem causando embates entre base e oposição. O artigo 21 do Código da Assembleia estabelece que o presidente é o responsável por "ordenar, em qualquer fase dos trabalhos, quando julgar necessário ou em face de requerimento formulado por deputado, a verificação de presença".
O artigo 21, no entanto, não estipula um tempo mínimo para tal. Porém, o prazo para início da verificação é determinado pelo inciso oitavo do artigo 218, que coloca a "verificação de presença" como um dos requerimentos que devem ser despachados imediatamente pelo presidente do Casa.
Já o intervalo entre zerar o painel e esperar que os deputados marquem suas presenças, seja na plataforma virtual ou no plenário, não está tipificado no regimento para os casos de "verificação de presença". O documento prevê apenas o prazo de verificação de quórum para a realização da Ordem do Dia e para a abertura da sessão, ambos de 20 minutos.
Em acordo interno, os parlamentares estabeleceram um tempo de 10 minutos de espera para que as presenças sejam registradas após a solicitação do recurso regimental. Se nesse intervalo o quórum não for alcançado, a sessão é suspensa.
Motivo de bate-boca
Apesar das regras no Código do Parlamento e dos acertos informais, a "verificação de presença" vem motivando debates acalorados na Casa, com ápice para um bate-boca entre parlamentares de base e oposição na sessão do último dia 22 de maio.
Naquele dia, o embate começou após o deputado Pastor Alcides (PL) solicitar a verificação diante da pouca quantidade de legisladores no plenário naquele momento do Primeiro Expediente. Primeiro-vice-presidente da Casa e presidente daquela sessão, o deputado Fernando Santana (PT) afirmou que faria a contagem ao final do discurso do deputado De Assis Diniz (PT), devido a problemas técnicos no painel que mostra os comparecimentos.
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Ao final do discurso do petista, a deputada Dra. Silvana (PL) pediu questão de ordem pela demora na realização da verificação de presenças. Naquele momento, caso não fosse atingido quórum mínimo, a sessão seria suspensa, e as votações previstas na Ordem do Dia não seriam realizadas.
Logo em seguida, Fernando Santana fez a verificação, mas justificou o atraso por problemas técnicos no painel que exibe as presenças virtuais e presenciais. O resultado foi um quórum suficiente de deputados no plenário e na plataforma virtual para a sessão prosseguir. O número mínimo exigido é de 16 parlamentares presentes.
Desgastes
Diante do saldo positivo para a base — que desejava votar matérias do Executivo Estadual que chegaram à Casa —, Silvana acusou os parlamentares governistas de utilizar de manobra para não derrubar a sessão, acrescentando que o recurso só era aplicado de forma imediata quando conveniente. Em meio a isso, o líder do Governo na Casa, Romeu Aldigueri (PDT), tentava discursar na tribuna, mas era interrompido por críticas proferidas por ela ao fundo.
"Ele me faltou com o respeito", dizia a parlamentar.
"Mas não me falte com respeito, eu estou utilizando o meu tempo. Dra. Silvana, deixa eu falar. Muito obrigado. A senhora vai me calar?", respondia Aldigueri da tribuna por não conseguir continuar o discurso.
Depois do discurso do líder, a troca de farpas se intensificou entre a parlamentar e Fernando Santana por conta das acusações sobre a conduta adotada pela Mesa Diretora para seguir com a sessão.
"Eu sou uma mulher, eu fiz uma questão de ordem, o deputado Pastor Alcides podia ter solicitado verificação de presença e era uma questão de ordem pela condução desta sessão, o que coloca em risco toda a sessão. Quero muito bem ao presidente Fernando Santana, tenho por vossa excelência todo o respeito necessário para a sua função, mas quero dizer que o que vossa excelência fez hoje... e outras vezes nessa Casa, eu sofri violência de gênero, não com o deputado Evandro Leitão, mas sofri violência de gênero de ser silenciada", alegou Dra. Silvana à época, acrescentando que o petista estava tirando selfie enquanto ela argumentava.
Ao fim da fala, Santana respondeu. Ele reafirmou o defeito no painel para não ter feito a verificação de quórum de forma imediata e rebateu as acusações.
"Eu vou pedir ao Departamento Legislativo que pegue todas as imagens da sessão e apresente à senhora. Muitas vezes, a gente interpreta da nossa maneira, do nosso campo de visão. Quando o pastor Alcides, nosso colega deputado, solicitou a verificação de presença, a senhora não estava no plenário, estava em uma reunião aqui fora. Então, a senhora não viu como se deu o contexto", justificou, acrescentando que "não estava fazendo selfie".
"E eu não estava fazendo selfie. O deputado chegou, nosso colega Agenor (Neto, do MDB), e tirou uma foto, a qual me convidou para sair, o que é um direito meu também. Da mesma forma que a senhora, tenho maior carinho pela senhora... Entendo que a senhora tenha interpretado errado porque não estava aqui presente no momento, mas também não lhe dá o direito de fazer acusações sem antes entender", frisou.
Depois do bate-boca entre os parlamentares, Alcides disse que não concordou que a verificação de presença fosse feita depois do discurso de De Assis Diniz. Santana, então, rebateu, alegando que ele não esboçou nenhuma reação diante do pedido da presidência. Em meio às discussões, houve acusação de "deboche" e "silenciamento". Posteriormente, houve pedido de desculpas.
Ainda que com desgastes, a sessão do dia 22 de maio ocorreu normalmente, não entrando na estatística do levantamento desta reportagem.