Transição energética no setor rodoviário só deve ocorrer a partir de 2030

Especialistas acreditam que modificação de fonte deve ocorrer a médio prazo e só será possível com investimento pesado em infraestrutura

Escrito por
Paloma Vargas paloma.vargas@svm.com.br
Para troca de combustíveis fósseis, infraestrutura de abastecimento precisa ser feita
Legenda: Para troca de combustíveis fósseis, infraestrutura de abastecimento precisa ser feita
Foto: Reinaldo Jorge

Todos os setores da economia têm se debruçado em um dos temas de maior importância atualmente no mundo que é a transição energética. Neste contexto, a logística de cargas não é diferente, porém o setor acredita que este se dará em um segundo momento já que muito antes de se pensar em motores limpos é preciso pensar na infraestrutura que torna o abastecimento possível.

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Marcelo Maranhão, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga e Logística do Ceará (Setcarce) e vice-presidente da Federação das Empresas de Transporte de Carga e Logística do Nordeste (Fetranslog), acredita que o primeiro passo na transição energética será dado pela indústria.

"Para o transporte rodoviário de carga a gente vê isso a médio e longo prazo, que seria nos anos de 2030, 2040. É preciso que a gente veja funcionar essa matriz energética. Porque é preciso lembrar que é diferente utilizá-la em um ecossistema fixo, como é o caso da indústria e em um ecossistema móvel como é o da logística."

Ele lembra que para dar certo, tem toda uma questão de distribuição desse novo modal energético que precisa ser estruturada para a carga, já que veículos de passeio elétricos já são uma realidade, mas com autonomias muito pequenas, se comparadas com aquilo que o transporte de carga precisa.

"Um país de extensão territorial como o Brasil, com a rede viária que temos, para se montar essa estrutura de abastecimento vai levar algum tempo."

Maranhão comenta que o uso de combustíveis de baixo carbono pode ser uma solução melhor do que a eletricidade, por exemplo, no transporte de carga.

"Temos um projeto que estamos desenvolvendo junto com a Cegás que chamamos de Linha Azul. É uma rede de postos para abastecimento de gás natural para os veículos de médio e longo trajeto." 

O presidente explica que neste caso é necessário um ponto de abastecimento pelo menos a cada 300 quilômetros e que hoje essa rede não existe ainda no Estado. 

"Não existe rede porque não existe demanda, mas não existe demanda porque não existe rede. Então, alguém tem que dar o primeiro passo e no nosso entender tem que ser o fornecedor. Porque veja, o caminhão na estrada não pode esperar pelo fornecedor de combustível se instalar lá, mas o contrário é viável e aguardaria pouco tempo até ter demanda no local."

Porém, Maranhão revela que ter a Linha Azul não será uma solução definitiva do problema de oferta de infraestrutura. "Um caminhão não tem exclusividade de roteiro. Assim, se a rede de suprimentos é feita no nosso principal corredor logístico, que é a BR-116, quando o veículo precisar ir para a BR-222 ou na CE-040, na CE-060, como é que vai abastecer?", questiona.

A busca neste momento é pelo melhor modelo de “virada de chave”

Bruno Vieira Bertoncini, professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), afirma que a transição energética é algo que vai ocorrer e o desafio está em chegar ao melhor modelo, especialmente do ponto de vista da infraestrutura.

“Dificilmente teríamos como, em curto espaço de tempo, suprir toda a demanda energética do setor de transportes fazendo conversão para energia elétrica, por exemplo. É algo que requer investimento em geração, transmissão, distribuição e na implantação dos postos de recarga, sem contar na mudança dos veículos.” 

Ele pondera que uma discussão importante que precisará ser feita é com relação aos veículos que não estariam enquadrados na nova tecnologia, além da vida útil e requalificação das baterias, por exemplo.

“O transporte de mercadorias é algo imprescindível para manutenção do nosso estilo de vida e da própria qualidade de vida, uma operação desbalanceada implica custos que, consequentemente, serão transferidos para a sociedade como um todo. Assim, deve-se buscar um modelo que assegure à população que mudanças na tecnologia não acarretem maiores custos, os quais tenderão a ser menores com a consolidação do sistema, porém elevados em termos de implantação.”

O professor reforça que a questão mais importante é que, independente do energético, é necessário que se discuta e invista massivamente na melhoria do modelo posto, o qual é, segundo ele, extremamente dependente por transportes e, no caso do Brasil, com o predomínio do meio rodoviário. 

“Esse modelo precisa ser revisto, especialmente buscando aproximar os centros produtores dos consumidores, melhorar a integração entre modos e fazer um uso mais consciente dos sistemas. Planejar e construir políticas públicas efetivas pautadas em um processo de compreensão pleno de problemas é imprescindível, evitando que o problema apenas mude de configuração.”

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