Redução do IPI vai baratear os preços dos produtos para os consumidores? Entenda
Medida é analisada pelo Governo Federal como forma de reduzir o preço dos produtos industrializados para o consumidor final
Em meio à polêmica PEC dos Combustíveis, que quer mudar a forma de cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre os combustíveis, o Governo Federal agora avalia a possibilidade de reduzir as alíquotas do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) em até 50%.
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Impacto na ponta
Como o tributo não incide sobre os combustíveis, o objetivo da medida é reduzir os preços dos demais produtos para o consumidor final como forma de compensar a escalada no valor da gasolina, diesel, e outros.
O IPI incide sobre todos os produtos industrializados nacionais e importados, com exceção de:
- Livros, jornais e papel destinado à impressão
- Produtos industrializados destinados à exportação
- Ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial
- Energia elétrica, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País
Conforme a proposta, apenas cigarros e bebidas devem ficar fora do benefício e permanecem com os atuais pesos.
Embora os cortes das alíquotas diminuam diretamente o custo de produção, não é possível prever se as reduções irão chegar de forma integral na ponta, ou seja, para o consumidor final.
Isso porque, além dos diferentes patamares de cortes, que devem variar de 10% a 50%, o IPI possui diversas alíquotas para os mais diferentes segmentos da indústria e de produtos.
Doutor em economia, o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Jaime de Jesus Filho, explica que a concorrência do mercado é o que vai ditar a proporção desses repasses para o preço final.
"O quanto dessa redução vai de fato ser passada para o preço final ao consumidor depende do mercado de cada produto, da concorrência. Quanto maior a concorrência num mercado, maior o repasse para o preço final. Então, a princípio, não dá pra ter uma ideia de quanto será a redução no preço final de cada produto", afirma.
Questionado se a medida compensaria a não aprovação da PEC dos combustíveis, ele pontua que depende do alcance que a pauta em tramitação terá. Caso a PEC inclua os três principais combustíveis (gasolina, etanol e diesel), o custo estimado para os cofres públicos será o dobro da redução do IPI, alcançando R$ 80 bilhões.
"Depende do alcance da PEC. É difícil fazer essa comparação, porque como falei o impacto no preço final depende de cada produto e de cada mercado. Não tenho essa estimativa", acrescenta.
Além disso, ainda há o risco do setor produtivo absorver a redução de custos para elevar o faturamento e não repassar os cortes para a ponta, mantendo os preços no atual patamar.
O presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Ceará, Hamilton Sobreira, é quem alerta. Ele explica que, como o IPI é um imposto indireto, ou seja, o consumidor final não é o contribuinte propriamente dito, esse risco é existente.
"O consumidor arca não com o IPI em si, mas com o ônus dele, que é repassado. Então, assim como quando há aumento, é importante que indústria e comércio repassem a redução para o consumidor final", ressalta.
De modo geral, Sobreira avalia que os cortes no tributo é uma eficiente forma de incentivar o mercado e o consumo.
O assessor econômico da Federação das Indústrias do Ceará (Fiec), Lauro Chaves Neto, reforça a imprevisibilidade de como os cortes serão repassados ao longo da cadeia.
"Quando se tem redução da carga tributária, tem impacto na política de preços. Mas esse impacto não é uniforme, depende de cada cadeia produtiva. São tantas cargas diferentes nos diversos setores da indústria, e até na mesma indústria tem produtos com carga diferente, além do nível de concorrência diferente", reitera.
Fortalecimento da indústria
Chaves ainda ressalta o benefício da medida para a indústria caso realmente implementada. Ele indica que qualquer redução de carga tributária traz impactos positivos e tornam as empresas mais competitivas.
Apesar disso, ele defende que os cortes nos tributos sejam ampliados, a fim de propiciar um processo de reindustrialização brasileira.
O que a indústria e o setor produtivo precisam é de uma reforma profunda, que desonere a produção e deixe a indústria brasileira em condições tributárias semelhantes aos países desenvolvidos. Só assim teremos condições de ter desenvolvimento industrial mais inclusivo, justo e com maior inserção nas cadeias globais de valor"
Solidez fiscal
Apesar de ser um imposto federal, o menor peso afetaria os cofres estaduais e municipais. Isso porque parte da arrecadação do tributo é direcionada ao Fundo de Participação dos Estados (FPE) e ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), posteriormente sendo repassada a esses entes federados.
O impacto total estimado alcança a cifra de R$ 4 bilhões por ano, sendo R$ 2 bilhões referentes aos cofres federais e R$ 2 bilhões aos demais entes. O Ceará perderia cerca de R$ 540 milhões, enquanto Fortaleza deixaria de receber R$ 90 milhões em repasses.
Os benefícios previstos com a medida serão conquistados à base de uma forte renúncia fiscal, que pode gerar problemas para alguns entes federados com contas em desajuste.
Reconhecido pela solidez fiscal, o Ceará não deve ter a saúde fiscal abalada pela perda dos R$ 540 milhões, segundo Jaime de Jesus Filho. Ele pontua que o valor representa apenas 1,5% da receita total do Estado.
"Mas é claro que nenhum governo quer perder receita", afirma.
Por outro lado, como a proposta impacta todos os entes, o conselheiro do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon), Ricardo Eleutério, lembra que estados que já estão em desequilíbrio podem ficar em uma situação ainda mais delicada.
Seria o caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, por exemplo. Além disso, o próprio Governo Federal registrou superávit primário nas contas públicas provado pela melhora das contas dos estados e não pelo maior equilíbrio entra arrecadação e despesas no âmbito federal.
"Temos uma situação desigual nas contas públicas. Alguns estados teriam condições de arcar com redução de receitas e outros não. É um problema não ter uniformidade entre todos esses entes. E mesmo dentro dos Estados, você tem situações bem distintas", afirma.
Em todo caso, Eleutério pontua que é importante buscar diminuir e evitar a inflação nos combustíveis, uma vez que é um componente inflacionário de peso e que produz um efeito dominó de transmissão na alta dos valores em toda a economia.
Uma das formas de reduzir esse impacto seria um mecanismo que reduz o peso dos impostos sobre os combustíveis quando as variáveis levadas em consideração na política de preços puxam os valores pra cima.
Segundo ele, a estratégia já é utilizada no Chile e, quando o preço do barril de petróleo ou o dólar sobem, automaticamente os impostos que incidem são reduzidos e vice-versa, criando um estabilizador.
"Você diminui a flutuação excessiva com um mecanismo automático de variação de tributos. É como uma regra de ouro para evitar pressão inflacionária", esclarece.