Por que, mesmo com a deflação, o preço dos alimentos nos supermercados não cai?
O País registrou deflação nos últimos dois meses, mas a variação negativa não chegou para o segmento de alimentação
Apesar dos últimos dois meses de deflação na economia brasileira, a sensação do consumidor quando vai aos supermercados não é de que os preços tenham baixado. Principal gasto para as famílias de menor renda, a parcela da alimentação ainda está pesando no orçamento.
Enquanto em agosto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou variação negativa de 0,74% em Fortaleza, o setor de alimentação e bebidas teve alta de 1,08% na capital cearense.
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É certo que alguns segmentos dentro da alimentação tiveram queda, como é o caso de tubérculos, raízes e legumes (-5,18%), açúcares e derivados (-1,18%) e óleos e gorduras (-1,06%). Contudo, leites e derivados tiveram aumento de 6,59% apenas no último mês, sendo um dos produtos que puxaram a inflação dos alimentos.
A variação dos preços de alimentação em Fortaleza já acumula aumento de 12,26% nos últimos 12 meses, ao mesmo tempo que no mesmo período a inflação geral é de 8,89%.
A deflação registrada nos últimos meses foi puxada sobretudo pelos combustíveis e energia, que registraram quedas em razão da unificação do ICMS e do preço do petróleo no mercado internacional.
Por mais que haja uma influência indireta sobre os preços dos alimentos por conta do custo de frete e armazenamento, esses produtos não tiveram uma razão específica para queda.
Alta modesta
O economista da FGV Mauro Rochlin explica que, por mais que não tenha havido deflação nos alimentos, as quedas dos combustíveis e energia influenciaram de alguma forma os preços. Segundo ele, a alta registrada foi bastante modesta comparada ao que normalmente ocorre neste período do ano.
O que aconteceu é que o grupo transportes, por conta de combustíveis, e habitação, por conta de energia elétrica, puxaram muito fortemente para baixo a retração de preços. O que tá acontecendo é um movimento natural dos preços”
Ele também chama atenção que, apesar de o grupo alimentos como um todo ter tido alta, alguns itens tiveram quedas e outros tiveram alta. O economista aponta é que a tendência de uma menor alta deve se manter nos próximos meses por questões sazonais da produção de alimentos.
Para o especialista, a sensação de preços ainda altos também é explicada por uma questão psicológica.
“O consumidor talvez vá perceber com o tempo que os preços estão mais estáveis. É muito uma questão psicológica, porque se você vê que um produto aumentou tem a impressão que tudo aumentou, não vejo as pessoas se surpreendendo que caiu preço. Como a gente vai ter ou deve ter uma inflação menor, isso com o tempo vai oferecer uma sensação de melhora para o consumidor”, coloca.
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Custo de vida ainda alto
Por mais que leves altas sejam normais para o crescimento da economia, o supervisor do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos no Ceará (Dieese), Reginaldo Aguiar, destaca que o problema é que o custo de vida já está alto demais.
A inflação deu uma disparada com a pandemia e estabilizou em um patamar extremamente elevado. Uma coisa é a variação do preço do custo de vida, outra coisa é o custo de vida. Temos dois meses com a inflação baixa, mas o custo de vida está alto demais porque os preços já se elevaram muito, a minha renda não é o suficiente para comprar o que eu comprava"
Quem mais sofre com essa situação é a parcela da população de renda mais baixa, na qual a alimentação tem um peso relevante nos rendimentos mensais. Conforme o Dieese, a cesta básica teve custo de R$ 626,98 em Fortaleza em agosto, a metade de um salário mínimo.
Dos 10 itens com maior alta em agosto em Fortaleza, 8 eram alimentos.
Produto | Variação mensal (%) |
Mamão | 15,51 |
Cebola | 11,23 |
Leite em pó | 8,77 |
Seguro voluntário de veículo | 7,76 |
Artigos de maquiagem | 7,75 |
Manga | 7,48 |
Leites e derivados | 6,59 |
Leite longa vida | 6,48 |
Queijo | 6,12 |
Maçã | 5,54 |
“Mesmo que você tenha essas deflações que foram dadas por conta de queda internacional no petróleo e reduções de ICMS, o item que pesa mais na renda dos mais vulneráveis continua se elevando. Nós precisaríamos de um período de queda de preços, principalmente de alimentos, durante um longo período para aliviar o bolso do cidadão”, diz.
Ele acrescenta que alguns alimentos como carne bovina, suína e de aves, milho e soja são commodities e que, por isso, os preços podem ser afetados por razões internacionais. Esses produtos e derivados são os que acabam se tornando mais inacessíveis para as classes mais pobres.