Paralisação dos caminhoneiros: o que se sabe até agora
Sem apoio formal de entidades da categoria, os motoristas são alinhados politicamente ao governo Bolsonaro
Caminhoneiros bolsonaristas realizaram paralisações em trechos de rodovias em ao menos 14 estados nesta quarta-feira (8), um dia após os atos de raiz golpista convocados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Nesta quinta (9), também há registros de bloqueios.
Sem apoio formal de entidades da categoria, os motoristas são alinhados politicamente ao governo ou ligados a algumas alas do agronegócio.
Veja o que se sabe sobre os protestos de caminhoneiros nos estados brasileiros.
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Quais as demandas dos caminhoneiros do protesto?
Os manifestantes seguem a pauta dos protestos liderados por Bolsonaro na última terça-feira (7), com ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e pressões pela destituição de ministros da corte.
Toda a categoria aderiu?
Não. O Ministério da Infraestrutura afirma ainda que "não há coordenação de qualquer entidade setorial do transporte rodoviário de cargas". Entidades de caminhoneiros corroboram essa posição.
Pauta é a mesma da greve de 2018?
Não. No movimento de 2018, a pauta prioritária dos caminhoneiros era o alto preço dos combustíveis e a tabela do frete. Já este de 2021 tem cunho político.
Em quantos estados já houve registros?
O Ministério da Infraestrutura, em boletim divulgado às 20h30, desta quarta-feira (8), ampliou para 14 o número de estados com bloqueios, mas não citou em quais deles houve paradas.
No fim da tarde, haviam sido registrados pontos de concentração na Bahia, no Espírito Santo, Paraná, Maranhão, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina, de acordo com o ministério.
Também houve bloqueios no Rio de Janeiro e em Roraima, onde um grupo de caminhoneiros autônomos interrompeu o tráfego na BR-174, estrada que é a única ligação do estado com o resto do país.
Quem é Zé Trovão, articulador do movimento?
Na véspera dos atos bolsonaristas, o caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, que está foragido, publicou um vídeo nas redes sociais convocando manifestantes ao protesto em Brasília. Segundo motoristas ouvidos pela reportagem, ele tem alto poder de mobilização na categoria.
Trovão defendeu o impeachment de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e desafiou o ministro Alexandre de Moraes a prendê-lo.
Moraes decretou a prisão do caminhoneiro na sexta-feira (3). Ele é acusado de promover a incitação de atos violentos contra o Congresso Nacional e o STF.
Zé Trovão publicou um novo vídeo em suas redes sociais em que pede fechamento total de vias no país a partir desta quinta (9).
"A partir de 6h da manhã do 9 de setembro, todas as bases brasileiras, fechem tudo, não passa mais nada, somente ambulância, oxigênio e remédio. Acabou. Não passa carro pequeno, não passa mais nada. Estão brincando com a democracia", diz Zé Trovão no vídeo.
Ele pede o impeachment de ministros do STF. "Precisamos resolver o problema do Brasil agora, nesta semana. Chegou a hora de mudarmos tudo de uma vez", continua. O caminhoneiro ainda pede que seus seguidores "tranquem tudo".
Já há falta de fornecimento?
Empresas de diversos setores começam a monitorar o cenário dos protestos de caminhoneiros que se espalham pelo país nesta quarta (8).
Fernando Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil) diz que transportadores saindo de São Paulo que atendem uma empresa do setor começaram a se recusar a levar a carga para Santa Catarina nesta quarta-feira (8). Por enquanto, a mercadoria vai ficar em um depósito.
José Ricardo Roriz, presidente da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria do Plástico) registrou gargalos de fornecimento em Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo e Mato Grosso. Roriz prevê atraso no suprimento de embalagens para produtos perecíveis, como alimentos, e materiais para a construção civil.
Na indústria farmacêutica, a distribuição e o transporte indicam alguns pontos de bloqueio em estados como Bahia, Maranhão, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso e Paraná, segundo o Sindusfarma (associação que reúne fabricantes), mas, por ora, não há previsão de falta de medicamentos.
Um dos setores mais impactados pela greve dos caminhoneiros em 2018, a indústria de frangos e suínos diz ter sentido alguns impactos no trajeto de volta dos portos, depois de despachar as cargas, segundo a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal).
Por enquanto, os veículos que levam carnes congeladas, ração e animais vivos estão conseguindo trafegar porque os caminhoneiros estão permitindo a passagem de mercadorias do setor, afirma Ricardo Santin, presidente da ABPA. Em média, 25 milhões de animais vivos são transportados por dia, segundo ele.
Até as 17h, cerca de 30 postos da região norte de Santa Catarina, onde fica Joinville, a cidade mais populosa do estado, relataram falta de gasolina e diesel nas bombas, segundo levantamento do Sindipetro-SC (Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Santa Catarina).
Pontos da BR-163, principal rodovia para escoamento de grãos do Centro-Oeste, também concentravam caminhoneiros no fim do dia, o que deixou em alerta empresas ligadas à exportação.
A Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) disse à Reuters que os protestos não afetaram o escoamento. A administração portuária de Paranaguá (PR) afirmou que não havia sinais de caminhoneiros atrapalhando o fluxo de cargas para o porto durante a tarde. O IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás) disse que acompanha os "bloqueios pontuais".
Em áudio, Bolsonaro pede a interrupção dos protestos
O presidente Jair Bolsonaro pediu a aliados que façam contato com caminhoneiros alinhados ao governo para liberar as rodovias bloqueadas depois dos protestos de raiz golpista do dia 7 de setembro.
Em uma mensagem de áudio, o presidente diz que a interrupção do trânsito prejudica a economia.
"Fala para os caminhoneiros aí que [eles] são nossos aliados, mas esses bloqueios aí atrapalham a nossa economia. Isso provoca desabastecimento, inflação, prejudica todo mundo, em especial os mais pobres. Então, dá um toque nos caras aí, se for possível, para liberar, tá ok? Para a gente seguir a normalidade", diz Bolsonaro.
Ainda na gravação, o presidente pede que as discussões políticas sejam feitas pelas autoridades em Brasília.
"Deixa com a gente em Brasília aqui agora. Não é fácil negociar, conversar por aqui com outras autoridades, não é fácil. Mas a gente vai fazer a nossa parte aqui, vamos fazer a nossa parte aqui, tá ok?", diz Bolsonaro.